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Tesouros da Igreja


Os peregrinos de outrora: homens de Fé e de amor
 
AUTOR: JUAN CARLOS CASTÉ
 
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Em nossa época de transportes rápidos e hotéis confortáveis, é simples fazer uma peregrinação. Outrora, isso importava em duros sofrimentos e graves riscos.

Hoje em dia, aumenta cada vez mais o número de peregrinações. Na Europa, incontáveis pessoas percorrem o “Caminho de Santiago”, para chegar aos pés do Apóstolo das Espanhas. E de todos os recantos do mundo, anualmente milhões deperegrinos acorrem a Fátima, Lourdes, Jerusalém, Guadalupe e mil outros lugares onde, desde há séculos, derramam-se graças em abundância.

As peregrinações se desenvolveram com a Igreja

Desde as origens da Igreja se realizam peregrinações. Segundo piedosa tradição, a primeira peregrina da História foi a própria Santíssima Virgem, a qual, durante o tempo em que seu Divino Filho permaneceu no sepulcro, visitou devotamente os lugares onde Ele padeceu as dores da Paixão.

Ao mesmo tempo que a Igreja nascente desenvolvia-se ao sopro do Espírito Santo, era cada vez maior o número de cristãos desejosos de conhecer e venerar os locais mais relevantes de nossa Fé.

Segundo relatos das primeiras crônicas, já no século II numerosos fiéis partiam de lugares muito distantes para visitar a Terra Santa ou o túmulo dos Apóstolos São Pedro e São Paulo. Essas manifestações do fervor cristão mantiveram-se constantes ao longo dos primeiros séculos do Cristianismo, mas foi na Idade Média que elas atingiram seu auge.

Conta-se que no primeiro Ano Santo celebrado em Roma, no ano de 1300, houve constantemente duzentos mil peregrinos na Cidade Eterna. Realmente, algo colossal, pois aquelas longas viagens se faziam através de regiões desabitadas e sem estradas, enfrentando as adversidades do clima e mil perigos.

Relatam os incansáveis cronistas que no ano de 1064 o Bispo de Bamberg levou nada menos de sete mil peregrinos a Jerusalém.

Uma caminhada de Fé, entusiasmo e amor

O que levava o medieval a sair de sua cidade e lançar-se nessa perigosa aventura? A resposta é simples, como simples era a Fé naqueles tempos: “Por Deus!”

As intenções pessoais eram as mais diversas. Assim, alguns caminhavam para pedir a Deus a saúde para si ou algum parente com grave enfermidade. Já outros visavam o perdão de algum pecado terrível (e estes não eram poucos, pois o medieval não tinha respeito humano nem dificuldade em reconhecer que havia pecado e precisava buscar o perdão de Deus e da Igreja). Podia também o objetivo ser cumprir uma penitência imposta pelo confessor.

Muitos partiam para, durante o tempo da peregrinação, ser mais de Jesus Cristo e colocar-se a seu serviço, como orantes e penitentes. Como fazem falta, hoje em dia, almas que rezem e se sacrifiquem por seus irmãos!

E não era pequeno o número dos que peregrinavam simplesmente para manifestar sua Fé, expressar seu amor a Deus. Alguns literatos, talvez influenciados pela propaganda moderna, costumam afirmar que as peregrinações eram o início de um turismo rudimentar. Outros lhes atribuem um valor meramente cultural ou esportivo.

Nada mais equivocado. Os peregrinos caminhavam por Deus e para Deus. Seu objetivo era absolutamente religioso: eles anelavam obter uma graça, um perdão, um favor; eles queriam ser mais de Deus; era um caminho de fé, entusiasmo e amor.Santuario de Lourdes.jpg Não entrava nessas peregrinações nenhuma consideração humana.

União fraterna nos perigos e na alegria

No decorrer do tempo, foram denominados de “romeros” os peregrinos cujo destino era Roma; “migueletes”, os que se dirigiam ao santuário do Monte São Miguel; “palmeros”, os que iam a Jerusalém; e “jacobitas” os que caminhavam rumo a Santiago de Compostela.

Nas peregrinações participavam as três Igrejas: a Militante arcava com os sacrifícios da caminhada; a Padecente, ou seja, os mortos que percorreram outrora o mesmo caminho e agora recebiam de seus sucessores uma ajuda para sair do Purgatório; e a Triunfante, representada pelos Santos em cujo louvor elas eram feitas.

Assim, de alguma maneira os peregrinos catequizavam seus contemporâneos, fazendo-os compreender, por seu exemplo, que o cristão não pode apegar-se aos bens terrenos, pois esta vida é uma longa peregrinação, cujo objetivo último é, pela graça de Maria Santíssima, chegar à Jerusalém celestial.

Nas peregrinações refletia-se a sociedade medieval e a união na caridade que existia entre todos: prelados, nobres, burgueses, artesãos, lavradores, cavaleiros, pecadores, homens e mulheres, anciãos e meninos, se confundiam fraternalmente sob o hábito de peregrino. Juntos rezavam, juntos enfrentavam os perigos e juntos compartilhavam a alegria de chegar ao fim de seu caminho. Isso porque pelas artérias da sociedade medieval circulava o Sangue infinitamente precioso de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Quem, mesmo em nossos dias, tenha assistido à Missa do Peregrino na catedral de Santiago de Compostela, pode ter uma pálida idéia da alegria que contagiava aqueles caminhantes da Fé ao chegarem ao fim de sua longa e penosa viagem. Além de enfrentar todas as dificuldades da caminhada, os peregrinos estavam sujeitos a inúmeros perigos. Muitos não chegavam ao término: morriam por alguma enfermidade, ou nas mãos de bandidos, ou – pior ainda – eram aprisionados pelos islamitas.

Como eram rudes aquelas penitências, o longo percurso e as intempéries! Por certo, alguns cristãos generosos franqueavam sua casa e sua mesa ao “jacobita” ou ao “romero”. Sem dúvida, existiam também as abadias de generosa hospitalidade e os abrigos construídos por entidades caritativas. Mas nem por isso a prova deixava de ser dura e de ter muito mérito aos olhos de Deus.

Acompanhados pelo afeto e carinho da Igreja

Habitualmente pela Páscoa – quando haviam já passado os rigores do inverno europeu e a natureza se revestia da alegria primaveril – reuniam-se no lugar de concentração centenas de peregrinos. Assistiam a uma Missa na qual o celebrante pronunciava sobre eles as orações apropriadas à ocasião, aspergia todos com água benta e entregava a cada um o bordão e o bornal. O restante do dia era tomado pelas despedidas e, ao cair da noite, aquela multidão começava a mover-se. De todos os peitos brotava um imenso brado de “Aleluia!” e aos poucos ia-se ouvindo cada vez mais distante o cântico do alentador estribilho: “Avante, peregrino, sempre avante!”

Assim começavam, animosos e alegres, as longas e incertas jornadas de uma viagem que nenhum deles sabia com certeza como e quando terminaria.

Em Paris, o ponto de concentração era a belíssima Torre de Santiago. Não poucas vezes, o Arcebispo e parte do clero os Santuário de Fatima em Portugal..jpgacompanhavam no primeiro dia de caminho, para demonstrar-lhes o afeto e o carinho da Igreja. Aquela caravana ia atravessar assim países inteiros, seguindo um roteiro fixado por tradição. Homens, mulheres e meninos andavam misturados e a pé. Raros eram os que dispunham do modesto luxo de cavalgar um cavalo ou um jumento.

É significativa a duração dessas viagens: de Paris a Santiago, nove meses; a Roma, um pouco menos; e a Jerusalém, às vezes três anos.

Só os penitentes públicos – reconhecíveis por sua cogula negra marcada com cruzes vermelhas – caminhavam em silêncio, meditando e chorando. Assim se desenvolvia a grande aventura do povo cristão em marcha. As etapas iam de um santuário a outro, pois a rota seguida estava balizada por esses marcos da Fé.

Abundantes frutos de graça e santidade

A peregrinação a Santiago tinha algo de peculiar. A Espanha estava em uma Cruzada contínua para expulsar o invasor muçulmano. Não era raro que o cristão proveniente da Alemanha, Polônia, Inglaterra, França, Países Baixos ou Hungria terminasse alistando-se nessa luta pela reconquista.

Ao longo dos séculos, as peregrinações produziram excelentes frutos de graça e santidade. Obviamente, sobretudo para os que as faziam. Mas não só para eles, pois muitas almas se santificavam servindo os peregrinos ao longo dos caminhos.
Havia monges que construíam abadias, mosteiros e hospedarias para os acolher, alimentar, dar-lhes fraternal assistência.

Outro resultado apreciável: nas rotas de peregrinação ergueram-se magníficos monumentos que até hoje perduram para glória da Cristandade, como a maravilhosa Catedral de Leon, no coração de Castela. (Revista Arautos do Evangelho, Julho/2004, n. 31, p. 48 à 51)

 
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