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Palavra dos Pastores


Viver em Cristo e em Maria
 
AUTOR: CÉSAR ANÍBAL GALARZA SILVA
 
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Basílica Catedral da Santíssima Trindade, Onitsha (Nigéria).jpg
Basílica Catedral da Santíssima Trindade, Onitsha (Nigéria)

Entrevista com o Núncio Apostólico na República Dominicana

Desejava dedicar-se às atividades pastorais, mas agradava-lhe, sobretudo, obedecer. E por obediência ingressou no serviço diplomático da Santa Sé.

César Aníbal Galarza Silva

A Nigéria é um país com uma vida eclesial muito rica e borbulhante, mas da qual muito pouco se fala. Poderia contar algo a respeito do trabalho evangelizador ali realizado pela Igreja?

A Nigéria é um país com quase um milhão de quilômetros quadrados habitados por etnias bastante diversas e, em consequência, o trabalho evangelizador varia muito de acordo com as regiões geográficas. Vou falar principalmente da região leste, de onde venho.

Como em qualquer outra nação, o trabalho pastoral é feito ali por sacerdotes e leigos, mas o papel destes últimos é especialmente importante. Em muitos lugares, sobretudo em áreas de missão, os primeiros passos para a criação de uma comunidade costumam ser dados pelos leigos. Alguns deles chegam a um povoado, por exemplo, para estabelecer um comércio e aos domingos se reúnem para cantar e rezar. Depois de algum tempo, chamam um sacerdote para dar continuidade ao trabalho pastoral já começado. São também os leigos que escolhem o terreno e coletam os recursos para construir a capela. Então, no trabalho pastoral concreto há uma colaboração muito especial dos leigos no meu país.

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“Fui ordenado em 1983. No ano seguinte, meu
Arcebispo, o Cardeal Francis Arinze,
enviou-me a Roma”

Convém notar que na Nigéria não há o que chamamos aqui de Plano Pastoral conjunto, para todas as dioceses. Devido à diversidade do país, traçam-se planos de atuação mais em nível regional do que nacional. Numa população de 160 milhões, há mais de 25 milhões de católicos e isso torna conveniente descentralizar muitas decisões.

Vale a pena acrescentar também que se trata de uma igreja muito dinâmica, pois em cem anos o número de católicos aumentou de 600 mil para mais de 25 milhões. Sem dúvida, um imenso progresso…

Como nasceu e se desenvolveu em Vossa Excelência a vocação sacerdotal?

Comecei a sentir esta sublime vocação no ano de 1968, sendo coroinha na minha paróquia. Éramos muitos, mais de 50. Fomos formados e orientados pelo padre Godrain Keobi, no qual víamos o modelo de um sacerdote santo, cujo exemplo nos inspirava. Para dizer a verdade, era um homem exigentíssimo! Mas nos causava grande admiração. Tínhamos maior admiração por sua santidade do que medo por sua exigência em nos manter na linha… Mais do que isso, gostávamos de ser apertados por ele, pois, sobretudo nas cerimônias, é preciso que tudo seja muito benfeito.

Movidos pelo seu exemplo, alguns de nós sentimos o chamado à vocação sacerdotal. Em 1969 fomos admitidos no seminário menor, embora um ou outro – entre os quais eu, que tinha apenas 12 anos – ainda não tivesse concluído o curso elementar. Depois, fizemos os estudos superiores no seminário maior, e posso dizer que foi o período mais feliz de minha vida. Nada nem ninguém me causou o menor problema naquela época.

Nesse mesmo período passei a fazer parte da Legião de Maria e quase dois anos depois fiz a consagração a Nossa Senhora segundo a fórmula de São Luís Maria Grignion de Montfort. Essa graça assinalou um momento de grande mudança em minha vida, dando-me uma compreensão muito mais clara da espiritualidade mariana.

E acrescento algo que não costumo dizer, mas posso falar aqui sem medo… Tive também uma experiência pessoal, não digo mística, mas profunda, com Deus. Ele tocou minha alma e isso foi, de fato, ocasião para uma drástica mudança em minha vida. Tudo ficou claro para mim. Consagrando-me totalmente à Virgem, comprometia-me a dedicar minha vida à santificação dos outros e à minha própria santificação. Era uma entrega completa. Não tinha dúvida alguma a esse respeito.

Uma graça que dura até hoje…

Sim. Até hoje, essa orientação mariana não mudou. E isso não aconteceu somente comigo, mas com um grupo de jovens que fizemos juntos o seminário. Éramos doze, dos quais apenas dois não receberam a ordenação presbiteral. Um destes chegou a ser diácono, mas foi impedido de continuar por um problema de saúde.

Além da consagração a Nossa Senhora, outro fator exerceu forte influência em nossa formação de adolescentes: a devoção à Virgem de Fátima. Em nossos primeiros anos de seminário – 1969 a 1972 -, em cada paróquia se formavam grupos de crianças que se reuniam durante trinta a sessenta minutos à tarde para rezar o Rosário, antes da aula de catequese. Foi com eles que começamos a fazer esse apostolado.

Durante as férias, íamos de paróquia em paróquia, pregando sobre a Virgem de Fátima. Levávamos pequenas imagens recebidas da Suíça. Ganhávamos também muitos objetos religiosos e os distribuíamos junto com algum material comprado com dinheiro pessoal, fruto de nossas economias. Um dos meus companheiros conseguiu, inclusive, reunir o suficiente para comprar uma motocicleta e um alto-falante que utilizávamos no nosso apostolado.

Com esse entusiasmo pelas atividades apostólicas, como decidiu ingressar no serviço diplomático?

Não foi por vontade própria, mas por obediência. Fui ordenado sacerdote em 1983. No ano seguinte, meu Arcebispo, o Cardeal Francis Arinze, enviou-me a Roma para prestar serviço num dos dicastérios da Cúria. Não me agradou muito. Sentia mais propensão para as atividades pastorais, mas me agradava, sobretudo, obedecer.

Mudei-me para Roma onde, depois de dois anos, convidaram-me a ingressar no serviço diplomático. Levantei uma objeção: preciso voltar para a Nigéria para conhecer a opinião do meu Arcebispo. Falei com ele… e respondeu-me que devia entrar no serviço diplomático.

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Assim começou minha devoção a Maria. O Rosário também até hoje o recito diariamente”

Assim, entrei por obediência, sem pôr condições. Não era esse o meu desejo. Eu, que queria fazer o curso de Psicologia Pastoral, acabei fazendo os de Direito Canônico e Direito Internacional. E aqui estamos. É dura a obediência! Pode dizer-nos como nasceu sua devoção à Santíssima Virgem?

Esta devoção eu a aprendi de minha mãe e de meu pai: todos os dias eles rezavam o Rosário e os filhos tinham de participar. Mas antes disso, por volta de meus cinco ou seis anos, minha mãe ensinou-me a rezar três Ave-Marias à noite, antes de deitar-me, e outras três de manhã, logo ao despertar. E o faço até hoje.

Assim começou minha devoção a Maria. O Rosário também até hoje eu o recito diariamente. E se em alguma ocasião não consigo fazê-lo, rezo o dobro no dia seguinte. Não se trata apenas de um ato de piedade, mas há algo de muito pessoal e profundo nessa devoção: tomo Maria como minha verdadeira Mãe e esse relacionamento me consola e ajuda em muitas circunstâncias.

Qual a experiência de Vossa Excelência com os novos movimentos eclesiais?

Eles são fruto do Espírito Santo, o qual sopra onde quer, e enquanto frutos de Deus, dons de Deus, viverão. O Espírito Santo continua iluminando a Igreja, fazendo-a mais jovem através desses movimentos. Vê-se como eles lhe dão nova vida, nova orientação, como carismas já olvidados revivem em iniciativas mais recentes.

Não podemos ocultar a luz dessa inspiração divina. Pelo contrário, devemos apoiá-la. Para tanto, é necessário um diálogo contínuo entre aqueles que se sentem inspirados pelo Espírito e a Hierarquia da Igreja. Tem de haver colaboração, entendimento, compreensão entre ambas as partes.

Nesse contexto, aqueles que sentem uma inspiração do Espírito devem procurar explicar claramente qual o bem que estão fazendo ou desejam fazer, tendo, ao mesmo tempo, a humildade necessária na forma de expressar esse carisma. Se algo é
de Deus, não pode se apresentar de forma arrogante, mas de um modo condizente com as virtudes que visa difundir.

Por vezes, alguns Bispos demonstram preocupação a respeito de um ou outro movimento que lhes dá a impressão de pretender possuir toda a verdade… Mas isso acontece, muitas vezes, precisamente por falta de comunicação. Então, é indispensável manter um diálogo pastoral contínuo e paciente.

Qual a mensagem que Vossa Excelência daria para os cristãos de hoje?

Sabemos que o Evangelho é, por assim dizer, o manual de orientação para nos unirmos a Deus. Então, minha mensagem é um convite que faço para todos, e também, portanto, aos Arautos do Evangelho: vivamos em Cristo, vivamos em Maria.

Cada um de nós precisa ser um mensageiro do Evangelho, levando-o aos nossos ambientes. Temos de viver segundo o Evangelho e sermos suas testemunhas. Devemos sempre agradecer a Deus pelos dons que d’Ele recebemos, e compartilhá-los com os demais. (Revista Arautos do Evangelho, Novembro/2014, n. 155, p. 18 a 20)

                                                                * * * * *

O Arcebispo Jude Thaddeus Okolo nasceu em 1956, em Kano, Nigéria, e em 1983 foi ordenado sacerdote na Arquidiocese de Onitsha. Em agosto de 2008 foi nomeado Núncio Apostólico na República Centro-Africana e no Chade, e recebeu a ordenação episcopal como Arcebispo titular de Novica, a 27 de setembro, das mãos do Cardeal Francis Arinze, então Prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Cinco anos depois, foi enviado como Núncio Apostólico à República Dominicana e nomeado Delegado Apostólico em Porto Rico. Fala fluentemente seis idiomas: inglês, espanhol, francês, italiano, alemão e checo. 

 
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