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O Sacramento do Matrimônio
 
AUTOR: REDAÇÃO
 
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É dever fundamental da Igreja reafirmar vigorosamente, como fizeram os Padres do Sínodo de 1980, a doutrina da indissolubilidade do Matrimônio a quantos consideram difícil ou mesmo impossível ligar-se a uma pessoa por toda a vida.

A família nos tempos de hoje, tanto e talvez mais que outras instituições, tem sido posta em questão pelas amplas, profundas e rápidas transformações da sociedade e da cultura. Muitas famílias vivem esta situação na fidelidade àqueles valores que constituem o fundamento do instituto familiar. Outras tornaram-se incertas e perdidas frente a seus deveres, ou ainda mais, duvidosas e quase esquecidas do significado último e da verdade da vida conjugal e familiar. Outras, por fim, estão impedidas por variadas situações de injustiça de realizarem os seus direitos fundamentais. […]

O influxo da situação na consciência dos fiéis

Vivendo em tal mundo, sob pressões derivadas sobretudo dos mass media, nem sempre os fiéis souberam e sabem manter-se imunes diante do obscurecimento dos valores fundamentais e pôr-se como consciência crítica desta cultura familiar e como sujeitos ativos da construção de um humanismo familiar autêntico.

Entre os sinais mais preocupantes deste fenômeno, os Padres sinodais1 sublinharam, em particular, o difundir-se do divórcio e do recurso a uma nova união por parte dos mesmos fiéis; a aceitação do matrimônio meramente civil, em contradição com a vocação dos batizados “a casarem-se no Senhor”; a celebração do Sacramento do Matrimônio sem uma fé viva, mas por outros motivos; a recusa das normas morais que guiam e promovem o exercício humano e cristão da sexualidade no Matrimônio […].

Fruto, sinal e exigência do amor absolutamente fiel de Cristo

É dever fundamental da Igreja reafirmar vigorosamente – como fizeram os Padres do Sínodo – a doutrina da indissolubilidade do Matrimônio: a quantos, nos nossos dias, consideram difícil ou mesmo impossível ligar-se a uma pessoa por toda a vida e a quantos foram subvertidos por uma cultura que rejeita a indissolubilidade matrimonial e que ridiculariza abertamente o empenho de fidelidade dos esposos, é necessário reafirmar o alegre anúncio da forma definitiva daquele amor conjugal, que tem em Jesus Cristo o fundamento e o vigor (cf. Ef 5, 25).

Radicada na doação pessoal e total dos cônjuges e exigida pelo bem dos filhos, a indissolubilidade do Matrimônio encontra a sua verdade última no desígnio que Deus manifestou na Revelação: Ele quer e concede a indissolubilidade matrimonial como fruto, sinal e exigência do amor absolutamente fiel que Deus Pai manifesta pelo homem e que Cristo vive para com a Igreja.

Cristo renova o desígnio primitivo que o Criador inscreveu no coração do homem e da mulher, e, na celebração do Sacramento do Matrimônio, oferece um “coração novo”: assim os cônjuges podem não só superar a “dureza do coração” (Mt 19, 8), mas também e sobretudo compartir o amor pleno e definitivo de Cristo, nova e eterna Aliança feita carne. Assim como o Senhor Jesus é a “testemunha fiel” (Ap 3, 14), é o “sim” das promessas de Deus (cf. II Cor 1, 20) e, portanto, a realização suprema da fidelidade incondicional com que Deus ama o seu povo, da mesma forma os cônjuges cristãos são chamados a uma participação real na indissolubilidade irrevogável, que liga Cristo à Igreja, sua Esposa, por Ele amada até ao fim (cf. Jo 13, 1).

O dom do Sacramento é, ao mesmo tempo, vocação e dever dos esposos cristãos, para que permaneçam fiéis um ao outro para sempre, para além de todas as provas e dificuldades, em generosa obediência à santa vontade do Senhor: “O que Deus uniu, não o separe o homem” (Mt 19, 6).

Testemunhar o valor inestimável da indissolubilidade e da fidelidade matrimonial é uma das tarefas mais preciosas e mais urgentes dos casais cristãos do nosso tempo. Por isso, juntamente com todos os irmãos que participaram no Sínodo dos Bispos, louvo e encorajo os numerosos casais que, embora encontrando não pequenas dificuldades, conservam e desenvolvem o dom da indissolubilidade […].

Sacramento de santificação mútua e ato de culto

O Sacramento do Matrimônio, que retoma e especifica a graça santificante do Batismo, é a fonte própria e o meio original de santificação para os cônjuges. Em virtude do mistério da Morte e Ressurreição de Cristo, dentro do qual se insere novamente o Matrimônio cristão, o amor conjugal é purificado e santificado: “O Senhor dignou-Se sanar, aperfeiçoar e elevar este amor com um dom especial de graça e caridade” (Gaudium et spes, n.49).

O dom de Jesus Cristo não se esgota na celebração do Matrimônio, mas acompanha os cônjuges ao longo de toda a existência. O Concílio Vaticano II recorda-o explicitamente, quando diz que Jesus Cristo “permanece com eles, para que, assim como Ele amou a Igreja e Se entregou por ela, de igual modo os cônjuges, dando-se um ao outro, se amem com perpétua fidelidade. […] Por este motivo, os esposos cristãos são fortalecidos e como que consagrados em ordem aos deveres do seu estado por meio de um Sacramento especial; cumprindo, graças à energia deste, a própria missão conjugal e familiar, penetrados do espírito de Cristo que impregna toda a sua vida de fé, esperança e caridade, avançam sempre mais na própria perfeição e mútua santificação e cooperam assim juntos para a glória de Deus” (Gaudium et spes, n.48).

A vocação universal à santidade é dirigida também aos cônjuges e aos pais cristãos: é especificada para eles pela celebração do Sacramento e traduzida concretamente nas realidades próprias da existência conjugal e familiar (Lumen gentium, n.41). Nascem daqui a graça e a exigência de uma autêntica e profunda espiritualidade conjugal e familiar, que se inspire nos motivos da criação, da aliança, da cruz, da ressurreição e do sinal, sobre cujos temas se deteve várias vezes o Sínodo.

O Matrimônio cristão, como todos os Sacramentos que “estão ordenados à santificação dos homens, à edificação do Corpo de Cristo, e enfim, a prestar culto a Deus” (Sacrosanctum concilium, n.59), é em si mesmo um ato litúrgico de louvor a Deus em Jesus Cristo e na Igreja: celebrando-o, os cônjuges cristãos professam a sua gratidão a Deus pelo dom sublime que lhes foi dado de poder reviver na sua existência conjugal e familiar o mesmo amor de Deus pelos homens e de Cristo pela Igreja sua Esposa.

E como do Sacramento derivam para os cônjuges o dom e a obrigação de viver no cotidiano a santificação recebida, assim do mesmo Sacramento dimanam a graça e o empenho moral de transformar toda a sua vida num contínuo “sacrifício espiritual” (Lumen gentium, n.34). Ainda aos esposos e aos pais cristãos, particularmente para aquelas realidades terrenas e temporais que os caracterizam, se aplicam as palavras do Concílio: “E deste modo, os leigos, agindo em toda a parte santamente, como adoradores, consagram a Deus o próprio mundo” (Lumen gentium, n.34). ²

Excertos da Exortação apostólica Familiaris consortio, de Sua Santidade João Paulo II, 22/11/1981

1 Nota da Redação: João Paulo II refere-se à V Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos sobre a família cristã (26/9 a 25/10/1980), cujas reflexões deram origem ao presente documento.

 
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