Fale conosco
 
 
Receba nossos boletins
 
 
 
Artigos


Palavra dos Pastores


Rejeitar a beleza é rejeitar a verdade e o amor
 
AUTOR: REDAÇÃO
 
Decrease Increase
Texto
Solo lectura
0
0
 
Muito oportunos ensinamentos do Cardeal Juan Luis Cipriani Thorne, em conferência pronunciada no Congresso sobre "A Pastoral da Cultura na América", promovido pelo Pontifício Conselho da Cultura.

Cardeal Juan Luis Cipriani Thorne
Arcebispo de Lima e Primaz do Peru

Em uma prece carregada de reconhecimento da formosura de Deus, Santo Agostinho diz magistralmente em suas Confissões: “Tarde Vos amei, Beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei!” Em sua essência, o homem foi criado com a sede do belo. Rejeitar a beleza é, portanto, rejeitar também a verdade e o amor, empobrecendo as possibilidades de uma alta qualidade de vida do homem, chamado a sentir-se e ser filho de Deus, uma exigência premente da nova evangelização em nossos dias.

O dom da beleza e a virtude da temperança

Nós homens necessitamos da beleza para não cair na desesperança. Assim como a verdade, a beleza dá alegria ao coração dos homens. Na difusão da verdade revelada – que fez tanto bem à humanidade, e continuará fazendo até o fim dos tempos – a beleza do Evangelho tornou mais transparente ao conhecimento humano sua Boa Nova da Redenção.

Com os pés na terra, deve-se ter presente que o dom da beleza corresponde, em grau e sentido especiais, à virtude da temperança, como conservadora e defensora da ordem interna do homem. Como disse Josef Pieper, a temperança é bela por si e embeleza quem a pratica. A beleza, como esplendor do bem e da verdade, irradiada espontaneamente por todo ser que cultiva a ordem, apresenta ao mundo a temperança em um aspecto espiritual, que põe no seu justo lugar a austeridade e a virilidade, trazendo com sua conduta serenidade e equilíbrio à sociedade humana.

A beleza da temperança não é um aspecto acidental da conduta humana, porque essa consideração básica da antropologia cristã se refere não apenas à conformação do corpo sob o influxo da alma, mas também à dependência do corpo em relação à alma. Sob essa luz da beleza da temperança se compreende mais facilmente a necessidade de toda disciplina externa, a legitimidade da ordem social, no que se refere, por exemplo, ao bom uso livre e responsável dos sentidos, na conduta individual e coletiva de cada pessoa.

Portanto, reduzir a dimensão humana ao meramente útil ou ao que produz apenas êxito material ou mero prazer sensível, coisa tão freqüente em nossa época, reclama o resgate da via da beleza para refazer e promover, sem dúvida com esforço e temperança, aquilo que torna verdadeiramente feliz o homem e a mulher no decorrer de sua vida neste mundo.
Então podemos dizer com Clemente de Alexandria que “a vida inteira do Cristianismo é um longo dia de festa”. (…)

Nada há mais amável que a beleza do rosto de Maria

Com a abertura do Novo Mundo a Cristo, vimos a beleza de uma conversão de praticamente toda a população americana autóctone ao Cristianismo. Sobre as sombras da História destacam-se as luzes da aparição de nossa Mãe Santa Maria em Guadalupe, como depois ocorreria na Europa com as aparições de Lourdes e Fátima. Maria, com toda a sua formosura e toda a sua pureza, veio confortar- nos com sua solicitude maternal. Cumulou de gozo e de paz nossos espíritos. Moveu-nos expressamente a edificar templos dedicados a seu Filho Jesus e a Ela mesma, nossa Mãe. Nada há mais amável que a beleza do rosto de nossa Mãe, que enche a alma de autêntica felicidade. Também as vidas dos santos são temas que despertaram a linguagem da arte em nosso Continente. Basta mencionar Santa Rosa de Lima, São Martinho de Porres e São Turíbio de Mogrovejo, entre outros.

A arte, instrumento valioso de evangelização

Nesse contexto, os artistas têm expressado não somente sua fé, mas também seu sentido catequético, através da beleza das coisas divinas, que se reflete também nas múltiplas expressões arquitetônicas, literárias, culturais e musicais, instrumentos valiosíssimos da primeira e da nova evangelização da Igreja, e também dos povos americanos.

Os artistas cristãos tiveram presente ao longo dos séculos que “o culto não existe para a arte, mas a arte para o culto”. Esta consideração nos leva a nunca descuidar o esplendor do culto, o ritual da Liturgia, a harmonia da música sagrada, a cortesia da piedade, porque são expressões de beleza que nos conduzem a um trato cada vez mais íntimo com Cristo e são instrumentos da nova evangelização. Porque a Liturgia bem vivida expressa admiravelmente toda a formosura da fé.

Cristo é personificação da verdade e da beleza

Concretamente, a devoção à Humanidade de Cristo manifestada muitas vezes, desde a inocência de sua infância até sua morte na Cruz, abriu um imenso panorama de contemplação e expressão artística religiosa, além da prática piedosa em suas formas de devoção popular. Cristo é a verdade e a beleza em pessoa, a vinda da eternidade no tempo, do infinito no finito. Também a vida de São José, especialmente na América, desdobra uma beleza teológica, expressa de modo especial na pintura, da vida do esposo castíssimo de Maria.

Assim como a perda da contemplação espiritual das coisas de Deus obstrui a capacidade do diálogo interpessoal na sociedade em que vivemos, a beleza do conhecimento teológico indica o caminho de retorno a essa centralidade da vida de quem crê em Cristo Senhor Nosso. Trata-se de que todos nós busquemos o conhecimento das realidades divinas, na medida em que isso seja possível para cada um. (…)

Devemos esforçar-nos em resgatar o esplendor da beleza

Para concluir em uma aproximação que nos permita buscar “pontos de ancoragem” que expressem os desafios enfrentados hoje pelo processo de evangelização em torno da beleza, permito-me propor algumas idéias:

– É preciso cultivar no espírito atual a arte da contemplação, sem a qual a beleza perde a força que vem da riqueza interior do ser humano.

– É urgente aprofundar, no campo do pensamento, o estudo da metafísica que nos permita transcender o meramente físico na expressão da arte.

– Devemos analisar e, se necessário, corrigir determinadas formas falsamente artísticas que são apenas uma rejeição da ordem natural do ser humano e, ainda mais, uma negação implícita do contributo da fé que faz da arte e da beleza um instrumento de evangelização. Essas expressões negativas empobrecem e obstruem o processo evangelizador.

– Por ser a Liturgia a linguagem da fé, devemos esforçar-nos especialmente em resgatar o esplendor da beleza, cuidando de expressões como o canto, as formas externas, a pintura e a elegância. Não deixemos que um complexo, por vezes muito comum, confunda esses valores da beleza: a pobreza não está em luta com a beleza, nem com a limpeza, nem com a elegância.

– Finalmente, citando o Cardeal Ratzinger, é bom recordar que a beleza falaz, falsa – que cega o homem e não o faz sair de si mesmo para abrir-se ao êxtase de se elevar às alturas, mas o aprisiona totalmente e o encerra em si mesmo – é uma beleza que não desperta a criatividade do artista. Pelo contrário, provoca a ânsia, a vontade de poder, a possessão, o mero prazer, a mentira

(Cf. Mensagem aos participantes do “Meeting” de Rimini, 9/2/2003).

(Revista Arautos do Evangelho, Nov/2005, n. 47 , p. 44-45)

 
Comentários