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Contos Infantis


Um estranho visitante…
 
AUTOR: BRUNA ALMEIDA PIVA
 
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Quando irmão Luigi abriu a porta, deparou-se  com um personagem incomum, vestido com  roupas pesadas, porém elegantes. Com o rosto  sério, revelou ele em poucas palavras  o motivo de sua vinda.

É inverno. A neve cai com suavidade naquela pequena cidade ao sul da Itália, cobrindo com seu manto de inocência as casas e a vegetação. Pelas ruas, algumas crianças fazem guerra de bolas de neve, enquanto os adultos as vigiam discretamente…

Próximo dali, no convento, os dias dos frades se sucedem como de costume: soa o sino, realizam-se as refeições em conjunto, aproveita-se o tempo para meditação, trabalho e oração, e também se lê bastante. Tudo isso numa atmosfera sobrenatural, cheia de fé e piedade.

Tal estado de espírito, todavia, teve seus períodos de altos e baixos, segundo contam os religiosos. Nos primórdios da fundação ingressou no mosteiro um jovem chamado Luigi, que andava meio relaxado em sua vida interior. Certo dia, ele recebeu a função de porteiro, o que lhe impedia participar de quase todos os atos comuns.

Cada vez mais distante das santas cogitações a que convida a vida comunitária, não encontrou nada melhor para passar o tempo do que ler um livro de História focado em tramas políticas e assuntos frívolos, que em nada ajudava a elevar as vistas para o Céu.

Após algumas horas lendo um interminável relato de façanhas feitas por reis para aumentar seus domínios, acirradas rivalidades entre nobres, visando satisfazer tão só seu egoísmo, e intrincadas alianças entre governantes sequiosos de poder, o irmão porteiro foi interrompido por lentos e fortes golpes da aldrava: alguém havia chegado. Pela solenidade dos toques, decerto tratava-se de uma pessoa bem-educada…

Curioso por descobrir quem era o ilustre visitante, foi depressa recebê-lo:

— Pois não, senhor, o que desejais?

Tratava-se de um personagem incomum, vestido com roupas pesadas, escuras, porém elegantes, parecidas às usadas há muito tempo… Com o rosto sério, revelou ele, em poucas palavras e num italiano perfeito, o motivo de sua vinda.

— Venho pedir encarecidamente que rezem por mim.

— Ah… É claro! Teríeis a bondade escrever vosso nome?

– respondeu com solicitude irmão Luigi – Mandarei entregá-lo a um sacerdote para que amanhã bem cedo inclua as vossas intenções na Santa Missa.

O homem se reclinou com distinção sobre um móvel próximo e escreveu: Gilles-Gilbert de Peyraud. Sem dúvida, não era italiano! E sua forma de se comportar parecia saída dos antigos tempos…

O religioso procurou não exteriorizar seu espanto e logo encaminhou o pedido para um dos sacerdotes da comunidade. Tendo feito isso, despediu-se do insólito visitante e voltou à sua leitura com a imagem do aristocrata girando-lhe pela mente.

De súbito, algo lhe fez perder a cor… Estupefato, não podia acreditar no que estava lendo! Levantou-se, deixou o livro aberto sobre a mesa e ajoelhou-se diante de um Crucifixo próximo. O que lhe causara tanto assombro? O que poderia haver de tão impressionante num simples livro de História?!…

Neste momento passava por ali um frade que, ao notar a pálida fisionomia de seu companheiro, correu ao seu encontro e perguntou-lhe o que havia acontecido. Irmão Luigi indicou com um gesto o trecho do livro que estava lendo: “No meio daquela crítica situação, o rei teve de lamentar a perda de uma das mais notáveis figuras de sua corte: Monsieur Gilles-Gilbert de Peyraud, morto repentinamente durante a guerra…”.

Sem entender o espanto de seu companheiro, ouviu atento seu relato e os dois, impressionados, decidiram contar tudo ao superior. No caminho, iam conversando:

— Meu Deus, meu Deus… – exclamou o irmão porteiro – Foi um nobre e agora é uma alma do Purgatório! Apareceu-me para pedir orações…

— Por isso ele usava uma vestimenta tão diferente! E seu nome está em outro idioma… Também, não é para menos: morreu há mais de um século!

Depois de ouvir atentamente o ocorrido, o padre superior convocou todos os sacerdotes e religiosos da comunidade

Encontraram o padre superior, afinal, aos pés do Santíssimo Sacramento. Depois de ouvir com atenção o ocorrido, convocou ele todos os sacerdotes e religiosos da comunidade e pediu que rezassem por aquela pobre alma durante todo o período do Advento.

Os dias se passaram e o irmão Luigi parecia outra pessoa: rezava com fervor, dedicava-se à meditação e sempre oferecia as Missas a que assistia pelos fiéis defuntos, seguro de que os véus que separam nossas vidas terrenas do mundo sobrenatural são apenas as barreiras dos sentidos. Contudo, uma dúvida o perturbava: teria o homem misterioso subido ao Céu? Ou ainda era necessário rezar mais por ele?

Transcorrido o Advento e os júbilos do Natal, a vida comunitária voltou para sua abençoada rotina. Inteiramente mudado, o jovem porteiro dedicava-se agora, nos intervalos do trabalho, a ler escritos sobre a bem-aventurança eterna e o convívio entre os Anjos e Santos. No dia seguinte à Solenidade do Batismo do Senhor, quando mais ensimesmado estava com sua leitura, veio-lhe de novo ao pensamento a figura do ilustre ancião…

Desejoso de mandar celebrar mais Missas em sufrágio por sua alma, caso fosse preciso, decidiu pedir um sinal que revelasse com clareza onde ele se encontrava. Mal havia terminado de formular o pedido, ouviu a aldrava batendo de forma enérgica e solene… Um arrepio interior tomou conta do religioso. Seria uma segunda visita da eternidade?

Caminhou pressuroso para ver quem era. Ao abrir a porta, não havia ninguém… Não obstante, um perfume celestial suavíssimo se alastrou por todo o ambiente, inundando-o de uma alegria calma, de uma paz indizível. Fora de si de contentamento, concluiu ser uma prova de que seu novo amigo já estava no Céu! As orações de todos o haviam libertado! Logo correu a espalhar a notícia pelo convento.

Ao cair da tarde, todos se reuniram na igreja para agradecer o acontecido. O singular episódio serviu para afervorar o ânimo de certos monges que, como irmão Luigi, andavam um pouco abatidos. Agora, ao invés de rezarem por Gilles, rezavam para ele! Uma vez que já gozava do convívio com Deus, com Nossa Senhora e com todos os Bem-aventurados, poderia obter-lhes inúmeras graças.

A partir de então, aquele que antes era um estranho visitante tornou-se um fiel intercessor da comunidade, que sempre o invocava pedindo diversos auxílios e favores.

 
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