Peter era um menino que gostava de contemplar o céu estrelado, os pores do sol e os raios nas tempestades. Nascera no seio de uma família muito católica, numa aldeia conhecida por seus altos penhascos e frondosos bosques, entre os quais costumava caminhar e brincar. Comprazia-lhe imaginar os Anjos a governar os elementos da natureza, como havia aprendido nas aulas de catecismo.
Peter era um menino que gostava de contemplar o céu e os pores do sol |
Numa aprazível manhã de primavera, enquanto passeava entre as árvores, sentiu uma forte inspiração, decerto angélica, e fez a promessa de rezar diariamente, por toda a sua vida, três Ave-Marias a mais: uma pedindo a Nossa Senhora que o protegesse; outra a São José, suplicando-lhe que o guardasse na hora de sua morte; e a terceira a seu Anjo da Guarda, para que o livrasse de desviar-se do caminho do bem.
Com o passar do tempo, todavia, Peter foi-se deixando levar pela má influência de outros meninos e seu relacionamento com o sobrenatural acabou por esfriar-se. Aos dezoito anos já havia abandonado os Sacramentos e deixara de ir à Missa, mas não perdera o costume de rezar as três Ave-Marias de sua promessa.
Por essa época, o país entrou em guerra e logo se tornou urgente reforçar com voluntários seu debilitado exército. Um vistoso pelotão de recrutamento passou pela aldeia de Peter, convidando todos os jovens a unir-se a eles, prometendo fama e poder a quem se alistasse. O rapaz não duvidou daquela sedutora proposta e partiu com as tropas.
Entre outras qualidades, Peter possuía um raro talento para orientar-se em lugares difíceis e uma grande capacidade de liderança. Foi posto à frente do seu pelotão e não tardou em ascender a capitão. Comandava uma valente companhia, que muito se distinguira em renhidas batalhas, e com o crescimento de seu prestígio militar, seu orgulho ia também aumentando. Entretanto, no fundo de seu coração sentia um vazio que parecia sufocá-lo…
Certo dia, estando no fragor de uma terrível batalha, o jovem oficial se viu em enorme apuro: sua unidade estava rodeada pelos inimigos. A situação era tão precária, que não cabia outro remédio senão furar o cerco à noite, fugir sem serem vistos e alcançar sigilosamente o corpo do próprio exército. Isto, porém, equivalia a reconhecer um vergonhoso fracasso. A fama de brilhante militar que Peter alcançara sofreria um baque tremendo… Pela primeira vez não teria conseguido realizar com êxito uma missão que lhe fora encomendada.
A arrogância venceu-lhe a razão! Abafando a voz da consciência decidiu fazer uma manobra diferente e temerária, para o que ordenou:
— Avancemos! Entremos pelo bosque e cerquemos o inimigo pelas costas. Talvez todos morreremos sem glória e sem obter nenhum proveito para nossa pátria, mas ninguém poderá dizer que fomos covardes.
Julgando-se exímio conhecedor do campo de batalha, embrenhou-se com seu esquálido esquadrão por íngremes atalhos. A floresta ia se tornando mais espessa conforme caminhavam. Ao cair da noite, estavam completamente perdidos! E não tinham uma bússola sequer para se guiar ou lanterna para iluminar o sendeiro. Era impossível sair dali…
Parado na obscuridade e sem saber o que fazer nem que rumo tomar, Peter se recordou de rezar as três Ave-Marias de sua promessa. O céu, de um azul-marinho aveludado e repleto de estrelas, lembrava-lhe os passeios e orações que fazia quando era criança. Quantas saudades sentia daquela época!
Cativado pelas palavras da sua Mãe Santíssima, o Menino Jesus começou a sorrir |
Ao terminar de rezar, um dos soldados que o acompanhava divisou um resplendor, sem conseguir distinguir exatamente de onde provinha. Fatigado e temeroso, exclamou:
— Olhem para aquele lado! Uma luz se aproxima… Deve ser o inimigo!
Alertados pela voz da sentinela, os soldados foram se agrupando sem fazer ruído, prontos para repelir o ataque.
À medida que a luz se tornava mais forte, as sombras do bosque se desvaneciam, permitindo ver as árvores com clareza. Nada no ambiente fazia pressentir um embate com o inimigo. Os soldados, pelo contrário, sentiam-se inundados de inesperada paz.
De repente, Peter saiu correndo na direção de uma clareira e ajoelhou-se diante do que parecia ser o foco daquela luz intensa e benéfica. Seus companheiros de armas se detiveram a uma respeitosa distância, prevendo que algo de extraordinário estava para suceder.
Por uma graça mística, Peter viu diante de si uma Senhora, vestida com o escapulário do Carmo e toda inundada de luz, trazendo no braço direito o Menino Jesus. Contudo, Ele não sorria e virava-lhe o rosto! Parecia estar desgostoso com o comportamento deste arrogante militar, cuja piedade na infância e juventude Lhe havia dado tantas consolações.
Caindo em si, Peter começou a chorar. Entre prantos e soluços, exclamou:
— Que desgraçado sou! Fugi em busca de poder e fama e agora me sinto triste e vazio… Perdoai-me, meu Senhor, por haver-me afastado de Vós! Maria Santíssima, tende pena deste miserável que sou eu!
Cheia de compaixão, a Virgem Imaculada olhava para seu Divino Filho e Lhe dizia:
— Vede, meu Filho e Senhor, quão sincero é o arrependimento deste pecador! Não gostaríeis de perdoá-lo, por amor a Mim?
Cativado pelas palavras da sua Mãe Santíssima, o Menino Jesus fez um nobre gesto de assentimento e começou a sorrir. Ela então Se voltou para Peter e disse:
— Graças às três Ave-Marias que rezavas todos os dias, pude interceder para que meu Filho Santíssimo te concedesse agora esta graça de conversão. Promete fazer uma boa Confissão e não mais pecar contra Ele. Meu Filho e Eu estaremos a teu lado até a guerra terminar.
Nesse momento a luz desapareceu…
Peter contou o acontecido aos seus companheiros, que o escutavam extasiados. A seguir o batedor da companhia retornou cheio de júbilo. Não estavam longe do grosso do exército. Uma trilha discreta, bem escondida no meio das árvores, conduzia diretamente até ele.
Algumas semanas depois o exército venceu a guerra. Peter voltou totalmente mudado para a aldeia. Fez-se ardentíssimo devoto de Nossa Senhora e passou o resto de sua vida dando testemunho d’Aquela que não só lhe salvou de uma situação sem saída, como, com um admirável ato de bondade, obteve a salvação de sua pobre alma. (Revista Arautos do Evangelho, Maio/2017, n. 185, pp. 46-47)