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Comentários ao Evangelho


A noite da derrota do mal
 
AUTOR: MONS. JOÃO SCOGNAMIGLIO CLÁ DIAS, EP
 
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Segundo os conceitos humanos, um terrível fracasso abatera-se sobre Jesus de Nazaré. Na perspectiva divina, contudo, sempre esteve presente o grandioso triunfo comemorado na Vigília Pascal.

1 “Quando passou o sábado, Maria Madalena e Maria, a mãe de Tiago, e Salomé, compraram perfumes para ungir o corpo de Jesus. 2 E bem cedo, no primeiro dia da semana, ao nascer do sol, elas foram ao túmulo. 3 E diziam entre si: ‘Quem rolará para nós a pedra da entrada do túmulo?’. 4 Era uma pedra muito grande. Mas, quando olharam, viram que a pedra já tinha sido retirada. 5 Entraram, então, no túmulo e viram um jovem, sentado ao lado direito, vestido de branco. E ficaram muito assustadas. 6 Mas o jovem lhes disse: ‘Não vos assusteis! Vós procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui. 7 Vede o lugar onde O puseram. Ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que Ele irá à vossa frente, na Galileia. Lá vós O vereis, como Ele mesmo tinha dito'” (Mc 16, 1-7).

Mons João Cla Dias EP_.jpgI – Contraste entre derrota e vitória

Concluída a Quaresma, período dedicado à consideração das nossas misérias e ao pedido de perdão, e encerradas as cerimônias da Paixão do Senhor, começa no Sábado Santo o triunfal crescendo de alegria próprio à Vigília Pascal.

A cerimônia dessa noite é a mais bela de todo o ciclo litúrgico. Ela começa fora do recinto da igreja, sem nenhuma iluminação, simbolizando as trevas do pecado que dominavam o mundo antes da Redenção, bem como as que invadiram a Terra depois da morte de Nosso Senhor, o momento mais trágico da História da humanidade.

À medida que o rito se desenvolve, a escuridão inicial vai sendo rasgada pelo fogo sagrado, símbolo da Ressurreição. Esta suplanta e faz esquecer tudo aquilo que ficou para trás, a ponto de ser-nos necessário um esforço para recordarmos as penitências feitas durante a Quaresma ou o ambiente trágico próprio à Sexta-Feira Santa.

A Vigília Pascal comemora o momento misterioso e augusto no qual Cristo venceu a morte, cujas circunstâncias exatas só nos serão desvendadas no dia em que a humanidade, reunida no Vale de Josafá, conhecer em minúcias – minuto a minuto, segundo a segundo – tudo quanto se passou ao longo dos séculos com toda e qualquer criatura humana ou angélica.

Para Deus tudo é presente

A marcada contraposição entre tragédia e triunfo, que caracteriza a Liturgia do Sábado Santo, encontra seu sentido mais profundo num outro contraste, infinito este: a diferença entre o inteligir divino e o humano.

Deus abarca num simples olhar de sua divina Inteligência o conjunto dos acontecimentos da História e da Eternidade, pois para Ele tudo é presente.1 O homem, entretanto, é dotado de um intelecto discursivo, incapaz de ver num só lance o passado, o presente e o futuro, como sucede com o Criador.

Cristo consola os justos_.jpg
“Cristo consola os justos”, por Fra
Angélico – Museu de São Marcos,
Florença (Itália)

Tendo sido criados no tempo, analisamos os eventos conforme eles se apresentam, e influenciados pelas impressões recebidas no momento, facilmente erramos na sua avaliação. Assim, podemos reputar como um fracasso determinado acontecimento que Deus considera como um triunfo, pois vê simultaneamente a vitória que dele há de advir.

Consideremos nessa perspectiva a Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor.

Fracasso aparente do Divino Mestre

Os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo levaram Jesus ao tribunal de Pilatos, o qual procurava esquivar-se de pronunciar a sentença de morte, por não ver n’Ele crime algum. A multidão, porém, exigia sua condenação, chegando ao cúmulo de preferir que o magistrado romano libertasse o infame Barrabás. O Divino Redentor foi então revestido com o manto de irrisão, flagelado, coroado de espinhos e submetido às piores humilhações. Recebeu cusparadas e bofetadas no rosto e, estando já quase sem forças, teve de carregar às costas a Cruz na qual haveria de ser imolado.

A certa altura do percurso, os soldados obrigaram Simão de Cirene a ajudá-Lo a transportar o pesado Madeiro até o alto do Calvário, onde O crucificaram. Pregado na Cruz, sofreu os insultos dos transeuntes, que diziam: “Tu que destróis o templo e o reconstróis em três dias salva-Te a Ti mesmo! Se és o Filho de Deus, desce da Cruz!” (Mt 27, 40).

Tudo parecia perdido para o Mestre que viera trazendo uma doutrina nova dotada de potência. Provara ser o Messias, e seu povo O rejeitara, bradando: “Crucifica-O, Crucifica-O!” (Jo 19, 6). Era o Filho de Deus e estava sendo executado como um malfeitor, entre dois ladrões. Os sumos sacerdotes, junto com os escribas e os anciãos, zombavam dele, dizendo: “A outros salvou, a Si mesmo não pode salvar! É rei de Israel: desça agora da Cruz e acreditaremos n’Ele. Confiou em Deus; que O livre agora se é que O ama! Pois Ele disse: ‘Eu sou Filho de Deus'” (Mt 27, 42-43).

Sob o prisma meramente humano, como não concluir que o Divino Mestre havia fracassado da forma mais completa? Esses fatos, porém, não refletiam a realidade no que ela tem de mais essencial.

Ingratidão dos nossos primeiros pais

Tendo como fundo de quadro que a infinita Inteligência de Deus tudo contempla como em presente, acompanhemos o magnífico panorama da História Sagrada que nos é apresentado pelas leituras da Vigília Pascal.

Na primeira delas (Gn 1, 1-2, 2), narra-se a criação do homem, que Deus quis assumir como filho dando-lhe em herança um destino eterno: o Céu. Para isso, formou seu corpo do pó da terra e o animou com um sopro de vida que “transparece através de sua carne imaculada, irradia dos seus pés à sua fronte real e nos leva a admirar, em sua virginal beleza, o duplo desabrochar da graça e de uma natureza perfeita”.2

Colocou-o, em seguida, no paraíso de delícias que havia preparado para ele, e passou a tratá-lo com uma “santa familiaridade, a qual não é ainda a união bem-aventurada do Céu, mas a prepara, atraindo a alma para as coisas do alto”.3

O demônio, porém, tomado de inveja, conseguiu induzir o homem a pecar. E a ingratidão dos nossos primeiros pais abriu para a humanidade uma era de escravidão. Na aparência, Deus havia sido derrotado. Mas, enquanto imaginamos Satanás comemorando com gargalhadas frenéticas seu aparente triunfo, podemos nos perguntar: “Terá sido realmente vencido Aquele que fez todas as coisas e poderia ter criado infinitos universos, com infinitos Adões e Evas, Aquele que tem o poder de a qualquer momento fazer tudo voltar ao nada?”

A morte de Cristo destroçou o império de Satanás

As leituras seguintes dessa noite percorrem a história do povo eleito durante esse período. Lembram a aliança feita por Deus com Abraão (Gn 22, 1-18); narram a libertação da escravidão no Egito (Ex 14, 15-15,1); anunciam a vinda do Santo de Israel (Is 54, 5-14 e Is 55, 1-11); recriminam o povo judeu por ter abandonado a fonte da sabedoria (Br 3, 9-15.32-4,4) e prometem a Israel “um coração novo e um espírito novo” (Ez 36, 16-17a.18-28).

Vão assim preparando os nossos corações para melhor compreender o acontecido na plenitude dos tempos, quando as divinas mãos cravadas no Lenho rasgaram o decreto de condenação lançado pelo Pai e abriram as portas do Paraíso eterno.

Santas mulheres no Sepulcro_.jpg
“Santas mulheres no Sepulcro”
Abadia Beneditina de Subiaco (Itália)

A morte do Redentor destroçou o império de Satanás. Em virtude dela, “Deus anulou o documento que, por suas prescrições, nos era contrário e o eliminou, cravando-o na Cruz” (Col 2, 14). O supremo Sacrifício de Cristo trouxe-nos a vida sobrenatural e a eterna. Pelo Batismo, aqueles que caminhavam nas sombras da morte ficam limpos do pecado e recebem o penhor da ressurreição, no final dos tempos.

“Ó Deus, quão estupenda caridade vemos no vosso gesto fulgurar; não hesitais em dar o próprio Filho, para a culpa dos servos resgatar”- canta a Igreja, no Precônio Pascal. Éramos servos infiéis e Deus, para nos remir, sacrificou seu próprio Filho. Bendito pecado de Adão que nos mereceu um tão grande Redentor!

Se não fosse a morte e Ressurreição de Cristo, nós seríamos eternos prisioneiros do anseio de ver a Deus face a face, sem jamais o conseguir. Passar a eternidade nesse desejo de contemplar a Deus sem nunca poder realizá-lo é o maior tormento para a alma humana! Nisso consiste precisamente a pena de dano no inferno, sofrimento mais terrível que o causado pelo fogo.

De sinal de ignomínia a símbolo de glória

Na Vigília do Domingo da Ressurreição, o triunfo de Jesus sobre o pecado enche de alegria a Igreja e os corações de todos os fiéis. Os sinos repicam, o altar se ilumina, e o órgão ressoa enquanto a assembleia canta jubilosa: “Gloria in excelsis Deo”.

“Ó noite em que Jesus rompeu o inferno, ao ressurgir da morte vencedor”, proclama o Precônio Pascal. Quando o demônio parecia ter derrotado Nosso Senhor, Este o venceu definitivamente, como Mestre e como Deus. A cruz, outrora sinal de ignomínia, transformou-se em símbolo de glória e passou a ornar as coroas dos reis e a encimar as torres das catedrais.

E o que aconteceu com aqueles que julgavam ter vencido o Nazareno? Alguns, tocados pela graça, pediram o Batismo (cf. At 2, 37-41); sobre outros caiu a terrível tragédia da destruição de Jerusalém, por Ele predita. E os príncipes dos sacerdotes, escribas e fariseus passaram para a História marcados por um sinete de opróbrio e rejeição.

O triunfo de Nosso Senhor vai se manifestar de maneira toda especial em seus discípulos. De fugitivos, reagrupam-se em torno da Virgem Santíssima e começam a percorrer as nações, pregando com destemor o Evangelho. Levantam por todas as partes o estandarte da Cruz, desafiando o paganismo e conquistando o mundo para Cristo.

Christus vincit! Christus regnat! Christus imperat! Eis o resultado do grande contraste que comemoramos na noite da Vigília Pascal. A Morte e Ressurreição de Jesus enchem de gáudio as almas dos fiéis, ao tornar patente quão completa foi a vitória do Bem.

II – A manhã do Domingo da Ressurreição

Nenhum dos quatro Evangelistas descreve o momento exato da Ressurreição. São Marcos, ao qual está dedicado o presente ano litúrgico, refere-nos apenas que, após a morte de Jesus, José de Arimateia envolveu o seu sagrado Corpo num pano de linho e o depositou no sepulcro (cf. Mc 15, 46). E entra logo a seguir na narração do episódio evangélico que hoje comentamos.

Piedoso zelo das santas mulheres

1 “Quando passou o sábado, Maria Madalena e Maria, a mãe de Tiago, e Salomé, compraram perfumes para ungir o corpo de Jesus. 2 E bem cedo, no primeiro dia da semana, ao nascer do sol, elas foram ao túmulo”.

Devotamente preocupadas em embalsamar o Corpo do Redentor, uma vez que não haviam tido tempo suficiente de fazê-lo na sexta-feira antes de pôr-se o sol, dirigiram-se as três santas mulheres para o túmulo no primeiro dia da semana. “Bem cedo”, esclarece o Evangelista, como quem quer acentuar o ardente zelo que as movia.

Como tantas vezes acontece no Evangelho, há nessa expressão tão breve, de apenas duas palavras, uma bela lição para nós: nossos deveres para com Deus, nós os devemos cumprir sem tardança nem protelações desnecessárias.

3 “E diziam entre si: ‘Quem rolará para nós a pedra da entrada do túmulo?’. 4a Era uma pedra muito grande”.

Os sepulcros daquele tempo, bem diferentes dos atuais, eram cavados na rocha e fechados com uma grande lápide circular encaixada entre dois trilhos também de pedra, um embaixo e outro em cima. Quem quisesse entrar neles, precisava correr essa lápide que era lacrada com outros materiais.

Cristo Ressurecto.jpg
Cristo ressurrecto”, pelo Mestre da
Misericórdia – Pinacoteca dos
Museus Vaticanos

Ora, havia para aquelas mulheres um obstáculo maior do que aquela pedra: eram os guardas do Templo postados ali, a mando dos chefes da sinagoga. Eles não são mencionados por São Marcos, mas sim por São Mateus.

Preocupação dos sumos sacerdotes e insegurança dos discípulos

Narra o primeiro Evangelista: “No dia seguinte, os príncipes dos sacerdotes e os fariseus dirigiram-se todos juntos à casa de Pilatos. E disseram-lhe: Senhor, nós nos lembramos de que aquele impostor disse, enquanto vivia: Depois de três dias ressuscitarei. Ordena, pois, que seu sepulcro seja guardado até o terceiro dia. Os seus discípulos poderiam vir roubar o corpo e dizer ao povo: ‘Ressuscitou dos mortos’. E esta última impostura seria pior que a primeira” (Mt 27, 62-64).

Pilatos, sempre na sua atitude espúria de homem incapaz de tomar decisões em favor do bem, não quis mandar soldados romanos para custodiar o túmulo, mas permitiu que os sumos sacerdotes ali postassem os seus. “Foram, pois, e asseguraram o sepulcro, selando a pedra e colocando guardas” (Mt 27, 66).

Enquanto isso, os discípulos de Jesus pareciam alheios à previsão feita meses antes pelo Divino Mestre: “O Filho do Homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes e aos escribas. Eles O condenarão à morte. E O entregarão aos pagãos para ser exposto às suas zombarias, açoitado e crucificado; mas ao terceiro dia ressuscitará” (Mt 20, 19).

Teriam esquecido eles o anúncio da Paixão, três vezes repetido, conforme narram os Sinópticos? 4 Não parece provável. Porém, como afirma São João, eles “ainda não haviam entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dentre os mortos” (Jo 20, 9).

No mesmo sentido, comentando a Ressurreição de Cristo em sua obra Jesus de Nazaré, Bento XVI lembra o acontecido com Pedro, Tiago e João na descida do monte da Transfiguração. Eles “refletiam preocupados sobre a palavra de Jesus, segundo a qual o Filho do Homem havia de ‘ressuscitar dos mortos’. E perguntavam-se entre si que queria dizer ‘ressuscitar dos mortos’ (cf. Mc 9, 9-10). Isso de fato, em que consiste? Os discípulos não o sabiam; só o encontro com a realidade lhes permitira aprendê-lo”.5

“Ele ressuscitou; não está aqui”

4b “Mas, quando olharam, viram que a pedra já tinha sido retirada. 5 Entraram, então, no túmulo e viram um jovem, sentado ao lado direito, vestido de branco. E ficaram muito assustadas. 6 Mas o jovem lhes disse: ‘Não vos assusteis! Vós procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui. 7a Vede o lugar onde O puseram'”.

Se as santas mulheres, chegando ao sepulcro, tivessem encontrado apenas o túmulo vazio, poderiam pensar que fora roubado o corpo do Divino Mestre. Entretanto, havia ali um jovem vestido de branco, o qual lhes disse: “Não vos assusteis!”. Naquele tempo acreditava-se que quem via um anjo morria logo em seguida. Por isso, ele começa por tranquilizá-las, e só depois lhes anuncia o acontecido: “Vós procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui”.

Onde se encontrava naquela hora a guarda posta pelos fariseus e príncipes dos sacerdotes para vigiar o sepulcro? São Mateus nos explica o acontecido: “E eis que houve um violento tremor de terra: um anjo do Senhor desceu do Céu, rolou a pedra e sentou-se sobre ela. Resplandecia como relâmpago e suas vestes eram brancas como a neve. Vendo isto, os guardas pensaram que morreriam de pavor” (Mt 28, 2-4). E depois fugiram, para relatar aos superiores o ocorrido.

Afirmação da primazia de Pedro

7bc “Ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que Ele irá à vossa frente, na Galileia. Lá vós O vereis, como Ele mesmo tinha dito”.

Há neste versículo um pormenor muito importante: o anjo manda anunciar o acontecido “a seus discípulos e a Pedro”. Fazendo essa menção explícita ao Príncipe dos Apóstolos, o anjo mostra o quanto era já reconhecido nesses primórdios da Igreja o seu primado.

Ora, Simão, filho de João, havia prevaricado. Três vezes negara o Mestre, na casa do sumo sacerdote. Não teria ele, com isso, perdido a primazia sobre os Doze? Entretanto, na mente de Deus estava presente a fidelidade que o Primeiro Papa haveria de Lhe manifestar, e em função dela era tratado pelo anjo. “A menção a São Pedro nesta passagem”, comenta Fillion, “destinava-se a mostrar ao Apóstolo que Jesus havia perdoado inteiramente sua recente falta”.6

III – Maria e a Ressurreição

Em seus relatos sobre a Ressurreição nada dizem os Evangelistas a respeito de Maria Santíssima. Entretanto, não é possível imaginar a Mãe do Redentor ausente desses acontecimentos.

Enquanto o corpo de Jesus repousava no sepulcro, os Apóstolos certamente sentiam, por um misterioso instinto, que a história do Homem Deus não podia estar concluída com aquela morte, mas não chegavam a imaginar a anunciada Ressurreição. Como supor, com efeito, que Jesus aceitaria o desafio lançado pelo mau ladrão: “Se és Cristo, salva-Te a Ti mesmo” (Lc 23, 39)? Porque se o fato de um vivo ressuscitar um morto – como Ele fizera com Lázaro – já resultava inteiramente incomum, quanto mais o seria alguém sair dos abismos da morte pelas próprias forças, dizendo ao seu corpo: “Levanta-te!”.

Imaculado Coraçao de Maria.jpg
Qual não terá sido o gáudio de
Maria ao sentir misticamente em
Si a Alma de Jesus unir-Se
de novo ao Corpo?

A Santíssima Virgem, porém, não tinha a esse respeito a menor fímbria de dúvida. Na noite do Sábado Santo, afirma Plinio Corrêa de Oliveira, “somente Nossa Senhora, em toda a face da Terra, teve uma Fé completa e sem sombra de dúvida na Ressurreição. […] A cada minuto que passava, de algum modo a espada da saudade e da dor penetrava ainda mais seu Coração Imaculado. Mas, de outro lado, havia a certeza de uma grande alegria da vitória que se aproximava. Esta concepção A inundava de consolação e gáudio”.

Dr. Plinio acrescenta que Nossa Senhora “representou nessa ocasião a Fé da Santa Igreja e, por assim dizer, sustentou o mundo, dando continuidade às promessas evangélicas, pois, se não houvesse Fé sobre a face da Terra, a Providência teria encerrado a História. Maria foi a Arca da Esperança dos séculos futuros. Ela teve em Si, como numa semente, toda a grandeza que a Igreja haveria de desenvolver ao longo dos séculos, todas as promessas do Antigo Testamento e todas as realizações do Novo; tudo isto viveu dentro da alma de Nossa Senhora”.7 Para termos uma visão mais completa desse grandioso panorama, cabe lembrar que, segundo a opinião de renomados mariólogos, Cristo Sacramentado jamais deixou de estar presente em Maria Santíssima desde a Santa Ceia até a sua Assunção ao Céu. Toda vez que Ela comungava, renovavam-se em seu coração as Sagradas Espécies, tornando-A um tabernáculo permanente da Eucaristia.8

Ora, estando Cristo realmente presente na Sagrada Hóstia, Nossa Senhora deve ter sentido de algum modo, em seu interior, a Alma e o Corpo de Jesus separarem-Se no momento da sua morte, enquanto a Divindade continuava unida a ambos. Pois, como explica o Doutor Angélico, “tudo o que pertence a Cristo segundo seu próprio ser, pode ser atribuído a Ele enquanto existe em sua própria espécie e no Sacramento, a saber, viver, morrer, sofrer, ser animado e inanimado, etc.”.9

Esse fenômeno pungente e misterioso supera nossa capacidade de compreensão. No Cenáculo, Maria Santíssima recebeu “o mesmo e verdadeiro Corpo de Cristo, que então era visto pelos discípulos sob a própria figura e era tomado na espécie do Sacramento”. Ele, afirma São Tomás, “não era impassível na forma em que era visto sob sua figura, muito pelo contrário estava preparado para a Paixão. Por isso, nem era também impassível o Corpo que se entregava sob a espécie do Sacramento”.10

Nossa Senhora havia comungado o Corpo de Cristo padecente, e tendo-O custodiado durante toda a Paixão, os sofrimentos do seu Divino Filho reproduziam-se simultaneamente de algum modo no seu interior. E no mesmo momento em que Ele ressuscitava no Santo Sepulcro, ressuscitava também na Sagrada Hóstia presente em Maria.

Qual não terá sido o seu gáudio ao sentir misticamente em Si a Alma de Jesus unir-Se de novo ao Corpo, e Ele Se apresentar agora mais glorioso do que antes da morte? Bem arquitetônico seria que nesse exato momento Nosso Senhor Lhe aparecesse fisicamente para consolá-La, pois Ela fora a Corredentora e compartilhara todos os sofrimentos da Paixão.

Em nossa época, na qual a impiedade parece ir tomando conta do mundo, devemos renovar nossa Fé na promessa feita por Cristo, de que jamais as forças do inferno prevalecerão contra a sua Igreja (cf. Mt 16, 18), e manter bem vivo na alma o anseio de sermos santos, perfeitos e íntegros sob o ponto de vista moral e doutrinário. Pois, para o Lumen Christi, tão belamente simbolizado pelo Círio Pascal, enxotar para o fundo dos infernos os demônios que hoje tentam a humanidade, basta haver um conjunto de fiéis, inteiramente unidos a Jesus e Maria, que peçam isso com verdadeiro afinco.

“Coragem! Eu venci o mundo” (Jo 16, 33)! Façamos o propósito firme de tender à santidade, a fim de que o triunfo definitivo de Cristo, obtido pela sua Morte e Ressurreição, refulja gloriosamente em nossos dias. (Revista Arautos do Evangelho, Abril/2012, n. 124, p. 11 à 17)

 
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