Fale conosco
 
 
Receba nossos boletins
 
 
 
Artigos


Santos


O auge da amizade
 
AUTOR: PE. FRANCISCO TEIXEIRA DE ARAÚJO, EP
 
Decrease Increase
Texto
Solo lectura
0
0
 
Gregório e Basílio eram amigos e ambos amavam entranhadamente a Igreja. Juntos lutaram para defendê-la e fazê-la crescer, e nessa luta sua amizade atingiu a plenitude.

Com a naturalidade do pássaro que saúda com alegres trinados a luz do sol, São Gregório Nazianzeno homenageou São Basílio Magno, seu irmão no Episcopado, com um elogio fúnebre que bem poderia intitular-se Cântico da verdadeira amizade. Nessa peça oratória, à qual não falta beleza poética, transbordaram de seu coração as seguintes palavras:

“Encontramo-nos em Atenas. Como o curso de um rio, que partindo da única fonte se divide em muitos braços, Basílio e eu nos tínhamos separado para buscar a sabedoria em diferentes regiões. Mas voltamos a nos reunir como se nos tivéssemos posto de acordo, sem dúvida porque Deus assim quis.

“Nesta ocasião, eu não apenas admirava meu grande amigo Basílio, vendo-lhe a seriedade de costumes e a maturidade e prudência de suas palavras, mas ainda tratava de persuadir a outros que não o conheciam tão bem a fazerem o mesmo. Logo começou a ser considerado por muitos que já conheciam sua reputação”.1

Dois varões unidos no desejo de obter a ciência

Algumas linhas adiante, São Gregório acrescenta: “Com o passar do tempo, confessamos um ao outro nosso desejo: a filosofia era o que almejávamos. Desde então éramos tudo um para o outro; morávamos juntos, fazíamos as refeições à mesma mesa, estávamos sempre de acordo, aspirando aos mesmos ideais e cultivando cada dia mais estreita e firmemente nossa amizade.

“Movia-nos igual desejo de obter o que há de mais invejável: a ciência; no entanto, não tínhamos inveja, mas valorizávamos a emulação. Ambos lutávamos, não para ver quem tirava o primeiro lugar, mas para cedê-lo ao outro. Cada um considerava como própria a glória do outro.

“Parecia que tínhamos uma só alma em dois corpos. E embora não se deva dar crédito àqueles que dizem que tudo se encontra em todas as coisas, no nosso caso podia se afirmar que de fato cada um se encontrava no outro e com o outro”.2

“O maior nome era sermos realmente cristãos”

Mas alcançar a ciência não era a principal meta dessa amizade. Continua São Gregório: “A única tarefa e objetivo de ambos era alcançar a virtude e viver para as esperanças futuras, de tal forma que, mesmo antes de partirmos desta vida, tivéssemos emigrado dela.

Nesta perspectiva, organizamos toda a nossa vida e maneira de agir. Deixamo-nos conduzir pelos Mandamentos divinos estimulando-nos mutuamente à prática da virtude. E, se não parecer presunção minha dizê-lo, éramos um para o outro a regra e o modelo para discernir o certo e o errado”.3

O elogio do Nazianzeno conclui com palavras que refletem o píncaro da amizade entre estes dois santos varões: “Assim como cada pessoa tem um sobrenome recebido de seus pais ou adquirido de si próprio, isto é, por causa da atividade ou orientação de sua vida, para nós a maior atividade e o maior nome era sermos realmente cristãos e como tal reconhecidos”.4

Combativos representantes de um novo tipo humano

Neste breve texto que acabamos de reproduzir, São Gregório expõe diversos elementos que nunca podem faltar na verdadeira amizade. Primeiro, a união de corações visando um objetivo legítimo, neste caso, a obtenção da ciência filosófica. Segundo, a admiração das virtudes e qualidades do outro, que leva a procurar o bem do amigo mais do que o próprio. Terceiro, o desejo de juntos atingirem a perfeição e se estimularem mutuamente à prática da virtude.

São Basílio, São João Crisóstomo
e São Gregório de Cesareia
Museu Histórico de Sanok (Polônia)

Para consolidar uma amizade sentada sobre pilares tão firmes, nada melhor do que a luta em prol de um sublime ideal. Aqueles dois jovens estudantes ufanos de sua Fé e da pureza de seus costumes brilhavam como astros no universo, em meio à geração depravada e pervertida (cf. Fl 2, 15) que era o mundo pagão. E ergueram-se naquela sociedade hostil à Religião como combativos representantes de um novo tipo humano: o cristão. Longe de se limitarem a lutar timidamente pela própria sobrevivência, tomaram a ofensiva e em pouco tempo conquistaram para Nosso Senhor um fervoroso grupo de condiscípulos.

Ambos amavam entranhadamente a Igreja

Basílio, cognominado o Magno, foi sagrado Bispo de Cesareia. Destacou- se por suas qualidades de pregador e de escritor. Foi também regulador e consolidador da vida monacal no Oriente. Em meio às suas atividades pastorais, encontrou tempo para fundar e dirigir uma monumental obra de assistência aos necessitados, que “está nas origens das modernas instituições hospitalares de internação e de cuidado dos doentes”. 5 Nela, reservava para si os trabalhos mais rudes, como o de tratar dos leprosos. Mas brilhou, sobretudo, como um dos paladinos da ortodoxia na luta contra o arianismo, o pior adversário da Igreja em sua época.

Gregório governou as Igrejas de Sásima, Constantinopla e Nazianzo. Foi tão perseguido pelas intrigas dos hereges que nem sequer conseguiu exercer o cargo de Patriarca de Constantinopla, para o qual fora eleito. Bento XVI traça seu retrato em concisas palavras: “Teólogo ilustre, orador e defensor da Fé cristã no século IV, foi célebre pela sua eloquência, e teve também, como poeta, uma alma requintada e sensível”.6

Em suma, Gregório era amigo de Basílio, sobretudo, porque ambos amavam entranhadamente a Igreja, e por isso combateram os seus inimigos. Foi nessa luta que a amizade entre esses irmãos no Episcopado atingiu seu auge. (Revista Arautos do Evangelho, Março/2017, n. 183, pp. 38 à 39)

1 SÃO GREGÓRIO DE NAZIANZO. Oratio 43. In laudem Basilii Magni, apud COMISSÃO EPISCOPAL DE TEXTOS LITÚRGICOS. Liturgia das Horas. Petrópolis: Ave-Maria; Paulinas; Paulus; Vozes, 1999, v.I, p.1111-1112. 2 Idem, p.1112. 3 Idem, p.1112-1113. 4 Idem, p.1113. 5 BENTO XVI. Audiência geral, 4/7/2007. 6 BENTO XVI. Audiência geral, 8/8/2007.

 
Comentários