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Virgem Maria


I – A isenção da chama da concupiscência
 
AUTOR: MONS. JOÃO CLÁ DIAS, EP
 
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Em virtude do admirável privilégio de sua imaculada conceição, a Bem-aventurada Virgem nunca sentiu em si o ardor das más inclinações. Preservada da culpa original, jamais qualquer sombra do pecado, venial ou mortal, ou da mais leve imperfeição, obscureceu sua perfeitíssima santidade. Vejamos o que nos dizem sobre isso os mariólogos.

Imaculado Cora?ao de Maria..........jpgI – A isenção da chama da concupiscência

Salve, ó Sagrada Mãe do Verbo, flor que brota entre os espinhos sem espinhos … glória do jardim de espinhos!

Assim o célebre poeta medieval Adão de São Vítor saúda à Virgem Santíssima.

E com muita razão.

O mundo todo não é mais do que um vasto espinheiral, Desse vasto espinheiral despontam realmente rosas brancas e vermelhas, mas todas trazem consigo o espinho da concupiscência. Só uma rosa, verdadeira glória de todo espinheiral não teve esse espinho: Maria.

O sentido da expressão “chama da concupiscência”

Tomada em sentido estrito real, a concupiscência significa um movimento de desejo do apetite sensitivo contrário à ordem da razão. Entende-se, portanto, por aquela inclinação natural do apetite sensitivo para o prazer, tanto lícito quanto ilícito; aquela funesta tendência para o pecado, aquela força que nos trona remissos para praticar o bem, tão inclinados ao mal, seja antecipando-se à razão, seja resistindo a seu império. É aquela lei de nossos membros, de que fala São Paulo, contrária a lei de nossa mente, que nos obriga a repetir com o Apóstolo: “Faço o mal que não quero” (Rom. 7, 19)

É neste sentido que tomamos a expressão: a chama da concupiscência.

Esses movimentos do apetite sensitivo, considerados em si mesmos (e não já enquanto desordenados, ou seja, em relação com a razão) não são, moralmente falando, nem bons, nem maus: são energias vitais que obedecem naturalmente a uma percepção externa sensível, e tendem a alcançar o objeto que se lhe apresenta como aprazível ou a afastar-se do objeto que se afigura nocivo. São, portanto, semelhantes àquelas majestosas quedas d’água que podem transformar-se em energia elétrica, capaz de iluminar ou de incendiar uma cidade.

Considerados, ao invés, como desordenados, ou seja, em relação com a razão e com a lei moral a que se opõem, esses movimentos do apetite sensitivo são um mal, um vício, um estímulo ao pecado. E, sob esse aspecto, a chama da concupiscência é o mais doloroso dos efeitos do pecado original (…) Ela não é, portanto, um pecado, mas é a raiz, ocasião e fonte do pecado (atual).

E a razão, como ensina o Concílio de Trento, é esta: o Batismo destrói tudo que constitui a verdadeira e própria essência do pecado, ou seja, a perda da graça santificante, da amizade divina, enquanto a concupiscência, mesmo depois do Batismo, ainda perdura.

Por que razão?

Perdura ad agonem, para o combate. De modo que, aparados pela graça de Cristo, aqueles que lhe resistem não sofrem nenhum detrimento; pelo contrário, são coroados (Sess. V, cân. 5). Observa com razão São Francisco de Sales que não se pode impedir a concupiscência de conceber o pecado, mas pode-se impedi-la de dá-lo à luz e de praticá-lo.

A completa e perene ausência dessa chama em Maria

Essa chama de concupiscência é universal. Verdade é que, em alguns Santos, tais movimentos desordenados não se apresentam; ficam eles, contudo, sempre capazes de tê-los. Só em Jesus e em Maria, essa chama esteve ausente: em Jesus, por direito decorrente da união hipostática; e em Maria, por privilégio exigido por sua Conceição Imaculada.

Todos os teólogos, sem exceção, admitem que nenhum movimento desordenado, mesmo involuntário e, portanto, sem culpa, jamais assomou no corpo virginal de Maria, contrariamente o que costuma acontecer ainda às almas mais puras. A Virgem Santíssima, portanto, desconheceu por completo a concupiscência atual, não esteve nunca sujeira a seus ultrajes. “Jamais, diz Hesíquio, a nuvem da concupiscência ofuscou a limpidez de sua mente; jamais o verme da volúpia lesou ou perturbou, no mínimo, seu coração (Homil. II de Sancta Deipara).

Tudo Era calma e serenidade dentro d’Ela. Tinha, como nós, os sentidos externos e internos, e os seus eram IMACULADA CONCEI?AO.jpgperfeitíssimos; possuía uma sensibilidade muito aguda, uma inteligência vivíssima; (tinha ainda) sentimentos provocados pelos objetos sensíveis e os movimentos das paixões naturais; porém tudo isso era admiravelmente ordenado e sujeito à razão. Enquanto nos outros Santos, observa Ricardo de São Vítor, a beleza está em não ser vencido pela má inclinação, na Virgem Santíssima, ao invés, a beleza está em não ser nem ao menos combatida, nem mesmo do modo mais longínquo, pela má inclinação.

As provas da isenção habitual da chama da concupiscência em Maria

É também sentença comum entre os teólogos, que a chama da concupiscência esteve completamente ausente da Virgem Maria, desde o primeiro instante de sua existência. De sorte que Ela teve isenta, não somente dos movimentos desordenados da concupiscência, mas da própria raiz venenosa de que os mesmos procedem.

Essa tese se acha implicitamente compreendida em todos os trechos da Escritura de que nos temos servido para provar a imunidade da Virgem Santíssima ao pecado original e, de modo todo particular, no Proto-Evangelho (Gên. III, 15) e na saudação do Anjo a Maria(Lc. I, 28).

O que dissemos da Sagrada Escritura, também fica dito a respeito da Tradição.

A razão em seguida prova do modo mais satisfatório a completa ausência da chama da concupiscência na Virgem Santíssima. E o prova de várias maneiras.

Antes de tudo, prova-o pela imunidade da culpa original. Com efeito, eliminada a causa, fica eliminado o efeito. Ora, a chama da concupiscência, na ordem presente, não é, porventura, um efeito do pecado original?

Em segundo lugar, prova-o pela perfeita santidade que é própria da Mãe de Deus. Com efeito, a perfeita santidade da Mãe de Deus, exige que esteja afastada d’Ela qualquer sombra, por mínima que seja, de desordem moral, qualquer sombra de culpa atual, por mínima que seja.

Além disse, prova-o pelo princípio de semelhança com Cristo. De fato, a Virgem Santíssima deve ser, o mais possível, conforme com Cristo. Ora, entre as perfeições da humanidade de Cristo havia também a imunidade à chama da concupiscência, embora a título diverso daquele por que sua Mãe Santíssima gozava dessa imunidade.

Prova-o, por fim, pelo princípio de eminência, em virtude do qual tudo que for concedido aos outros Santos não pode ser negado, se não ocorrer um motivo especial, à Rainha dos Santos. Ora, a imunidade foi concedida a Eva. Com mais forte razão devia ser concedida a Maria, nova Eva, Co-redentora do gênero humano.

II – A imunidade do pecado atual

Além da culpa original, além da chama da concupiscência, outra grande imperfeição que costuma, infelizmente, ser contraída pela alma humana é o pecado atual. Este se divide em mortal e venial.

O único inimigo da santificação do homem

O pecado “é o inimigo número um de nossa santificação e, na realidade, o inimigo único, já que todos os demais o são enquanto provém do pecado ou a ele conduzem.

Como é sabido, o pecado é uma transgressão voluntária da lei de Deus. Supõe sempre três elementos essenciais: matéria proibida (ou ao menos estimada como tal), advertência por parte do entendimento e consentimento ou aceitação por parte da vontade. Se a matéria é grave e a advertência e o consentimento são plenos, se comete um pecado mortal; se a matéria é leve ou a advertência e o consentimento foram imperfeitos, o pecado é venial (…)

O pecado mortal acarreta terríveis castigos de Deus

O pecado mortal deve ser um mal gravíssimo porquanto Deus o castiga tão terrivelmente. (…) Por um só pecado mortal: os anjos rebeldes se converteram em horríveis demônios por toda a eternidade; nossos primeiros pais foram expulsos do paraíso e a humanidade submersa em um mar de lágrimas, enfermidades, desolações e mortes; Jesus Cristo, o Filho mui amado do Pai, quando quis sair fiador pelo homem culpado, houve de sofrer os terríveis tormentos de sua Paixão (e morte). A razão de tudo isto é porque o pecado, em virtude da injúria contra o Deus de infinita majestade e da infinita distância que d’Ele nos separa, encerra uma malícia de certo modo infinita.

Desmoronamento instantâneo de nossa vida espiritual

O pecado mortal produz instantaneamente estes desastrosos efeitos na alma que o comete: a) Perda da graça santificante, das virtudes infusas e dons do Espírito Santo. Supressão do influxo vital de Cristo, como o sarmento separado da vinha: b) Perda da presença amorosa da Santíssima Trindade na alma; c) Perda de todos os méritos adquiridos em toda a vida passada; d)Feíssima mancha na alma, que a deixa tenebrosa e horrível; e) Escravidão a Satanás, aumento das más inclinações, remorsos de consciência; f) Reato de pena eterna: o pecado mortal é o Inferno em potência.

É, pois, como um desmoronamento instantâneo de nossa vida sobrenatural, um verdadeiro suicídio da alma à vida da graça. (…)

O pecado venial

Depois do pecado mortal, nada há que devamos evitar com mais cuidado do que o pecado venial. Ainda que seja menos horroroso que o mortal, está situado todavia na linha do mal moral, que é o maior de todos os males. Ante ele empalidecem e são como se não fossem todos os males e desgraças de ordem física que possam cair sobre nós e sobre o universo inteiro. Nem a enfermidade, nem a mesma morte se lhe podem comparar. E a ganância de todas as riquezas do mundo, e o domínio natural da criação inteira não poderiam compensar a perda sobrenatural que ocasiona na alma um só pecado venial. (…)

IMACULADA CONCEI?AO-A.jpgMalícia do pecado venial

O pecado venial é uma verdadeira ofensa contra Deus, uma desobediência voluntária a suas leis santíssimas e uma grandíssima ingratidão para com seus imensos benefícios. (…) É tão grave, com efeito, a malícia de um pecado enquanto ofensa a Deus, que não deveria ser cometido, ainda que com ele pudéssemos libertar todas as almas do purgatório, ou mesmo extinguir para sempre as chamas do Inferno.

Efeitos do pecado venial

O pecado venial, nesta vida, nos priva de muitas graças atuais, diminui o fervor da caridade, aumenta as dificuldades para o exercício da virtude e predispõe a alma para o pecado mortal (…) (Além disso), as penas que no Purgatório teremos de sofrer por essas faltas que agora tão ligeiramente se comete, excedem às maiores que neste mundo se podem padecer (…)

E no céu, os aumentos da graça santificante de que a alma ficou privada nesta vida, pela subtração de tantas graças atuais como castigo de seus pecados veniais, terão uma repercussão eterna: a alma possuirá uma glória menor da que houvera alcançado com um pouco mais de cuidado e fidelidade à graça: e, o que é infinitamente mais lamentável, glorificará menos a Deus por toda a eternidade.

Nossa Senhora isenta de todo pecado

Se considerarmos agora a imaculada alma de Maria, veremos que esteve completamente isenta, não só de todo pecado atual, tanto mortal quanto venial, mas também daquelas faltas ligeiras, semi-deliberadas, que parecem uma fatal necessidade de nossa natureza corrompida e que se infiltram mesmo na vida dos mais perfeitos dos Santos.

E não só a Virgem Santíssima jamais pecou de fato, mas nem ao menos teria podido pecar, porque, como dizem os teólogos, estava confirmada em graça.

O fato da impecabilidade de Maria

– No sentir da Igreja

Podemos exprimir a impecabilidade de Nossa Senhora nestes termos: A Bem-aventurada Virgem Maria não cometeu jamais nenhum pecado atual. Isto é de fé. Com efeito, esse é o sentimento da Igreja, como o atesta o Concílio de Trento que, no cânon 23 da Sessão VI, ensina explicitamente: Se alguém disser que o homem, uma vez justificado, pode no curso de sua vida evitar todos os pecados, mesmo os veniais, sem um privilégio especial de Deus. Como a Igreja afirma em relação à Bem-aventurada Virgem, seja excomungado.

– Na voz da Sagrada Escritura

A impecabilidade de Maria se acha contida implicitamente nas célebres palavras do Proto-Evangelho (Gen.III, 15), nas quais se estabelece uma absoluta e eterna inimizade entre a Virgem Santíssima e a serpente, autora do pecado. O demônio nunca encontrou nada em Maria que viesse delem nem na mínima parcela.

Está contida, além disse, implicitamente na saudação dirigida a Maria pelo Anjo: Ave, ó cheia de graça (Lc. I, 28). Pois, onde há algo de pecado venial, observa com razão Santo Alberto Magno (Mariale, p. 133), aí existe algo vazio de graça: portanto, nada que se assemelhe a pecado existiu em Maria.

Está contida, por fim, implicitamente ainda nas palavras do Cântico: Tu, és toda bela, ó amiga minha, e não há em ti mácula alguma (Cânt. IV, 7). Bela, observa Raimundo Giordano, o sábio Idiota, não só parcialmente, mas totalmente; e a mácula do pecado, tanto moral quanto venial, não existia nela, nem nunca existirá (Contempl. Deiparae, c. 2).

– Na voz da Tradição

A Tradição cristã testemunha o altíssimo conceito em que tinha a vida ilibada de Maria. Nos cinco primeiros séculos, a imunidade de Maria Santíssima a qualquer culpa atual era professada implicitamente nas várias afirmações genéricas em que se exaltava a absoluta pureza de Maria, sua vida de todo irrepreensível, etc.

Pelo quinto século, essa imunidade começou a ser proclamada também de modo explícito. Assim, Santo Efrém, o Sírio, proclama a Virgem Santíssima inteiramente alheia a qualquer impureza e a qualquer marcha de pecado (Ed. Veneta, 1754, p. 571).

O próprio herético Pelágio, discutindo com Santo Agostinho, não hesitava em dizer que a piedade necessariamente exigia que se excluísse da Virgem qualquer pecado. Estas palavras demonstram claramente que esta era naquele tempo a convicção comum de todos os fiéis. E Santo Agostinho não demorou, de fato, a admiti-la, pois respondeu a Pelágio que, quando se tratasse da Virgem Santíssima, não queria de modo algum fazer menção de pecado

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                                                                      Singular Privilégio

À Santa Francisca Romana, Nossa Senhora fez saber que a imunidade de todo pecado é um favor único; somente a Ela foi dito: “Tu és bela, ó amiga minha, e em ti não existe mácula nenhuma”.

Certa vez, durante um êxtase, a Bem-aventurada recebeu da divina Mãe a seguinte comunicação:
“Ninguém, absolutamente ninguém entre os humanos, se persuada poder, neste triste exílio, evitar toda a falta. Este é um fator especial que não foi concedido senão à Virgem, Mãe de Deus”.

E a mesma Santa teve a alegria de ver a Rainha do Céu, a Mãe do Filho único de Deus, concebida sem a mancha original.

(Pe. Texier, op. Cit., t. II, p. 25)

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São Tomás de Aquino e as razões da impecabilidade de Maria

São Tomás, investigando por que se atribuía a Maria tão grande privilégio, as reduz a três.

A Divina Providência, segundo o santo Doutor, devia assistir Maria de uma maneira toda particular e não deixá-La cair em nenhuma culpa: 1) Porque era Mãe de Deus. Não teria sido, de fato, uma Mãe digna de Deus se houvesse cometido qualquer pecado, pois tanto a glória, quanto a ignomínia dos genitores se refletem naturalmente sobre os filhos. 2) Porque estreitamente unida a Jesus Cristo, que é carne de sua carne. Ora, como escreve São Paulo na Segunda Epístola aos Coríntios, que aliança pode haver jamais entre Cristo e Belial? 3) Porque foi a habitação da Sabedoria Divina. Cristo é, com efeito, a Sabedoria incriada. Ora, no Livro da Sabedoria se diz claramente que a Sabedoria não entrará em um corpo sujeito ao pecado.

Todas essas razões, conclui São Tomás, nos induzem necessariamente a admitir que a Bem-aventurada Virgem não cometeu jamais pecado atual nenhum, nem mortal, nem venial. N’Ela se verifica plenamente o que é dito no Cântico (IV, 7): Tu és toda bela, ó amiga minha, e em ti não existe mácula nenhuma.

A essas três razões se podem juntar outras três, tiradas: a) da exclusão de todo pecado mortal; b) do ofício de Co-redentora do gênero humano; e c) do contínuo sentimento de sua maternidade divina.

a) A exclusão de qualquer pecado mortal exigia também na Virgem a exclusão de qualquer pecado venial. De fato, é admitido comumente pelos teólogos que o homem, no estado de inocência, não teria podido pecar venialmente antes de pecar mortalmente, pois o pecado venial procede da rebelião da parte inferior (apetite sensitivo) contra a parte superior IMACULADO CORACAO DE MARIA.jpg(apetite racional), enquanto o pecado mortal procede da rebelião da parte superior, ou seja, da razão, contra Deus. Isto posto, sabe-se bem que a parte inferior permaneceria sujeita à parte superior desde que esta ficasse sujeita a Deus. Portanto, excluído da Virgem Santíssima qualquer pecado mortal, exclui-se implicitamente com isto mesmo qualquer pecado venial.

b) Também o ofício de Co-redentora, isto é, de companheira do Redentor na obra de nossa reconciliação com Deus, era incompatível com qualquer pecado, tanto mortal como venial. O pecado, com efeito, retira todo o valor, especialmente, da satisfação.

c) A Virgem Santíssima, por fim, como observa São Bernardino de Siena, teve continuamente o sentimento da maternidade divina, ou seja, o conhecimento atual e experimental de ter o próprio Deus como Filho, gozando de toda a inefável doçura desse conhecimento: coisa irreconciliável com qualquer, fosse ainda mínima, desordem moral.

Recitando o Pater Noster, como certamente terá feito Maria não podia proferir para si mesma, porém somente para os outros, aquelas palavras: Perdoai as nossas dívidas, pois não contraiu jamais débito algum com a justiça divina.

Maria foi, portanto, isenta de qualquer pecado, de qualquer imperfeição; antes teve o privilégio da impecabilidade, pois foi confirmada na graça divina.

Natureza da impecabilidade de Maria

Com a concisão e clareza que o distinguem, Fr. Royo Marín sintetiza o pensamento dos teólogos sobre a natureza da impecabilidade de Maria:

A Santíssima Virgem Maria não só não pecou jamais de fato, como foi confirmada em graça desde o primeiro instante de sua Imaculada Conceição e era, por conseguinte, impecável.

Podem se distinguir três classes de impecabilidade: metafísica, física e moral, conforme seja o pecado metafísica, física ou moralmente impossível com ela.

– Impecabilidade de Deus

A impecabilidade metafísica ou absoluta é própria e exclusiva de Deus. Repugna metafisicamente, com efeito, que Deus pudesse pecar já que Ele a santidade infinita e princípio supremo de toda santidade. Esta mesma impecabilidade corresponde a Cristo-Homem em virtude da união hipostática, já que as ações da humanidade santíssima se atribuem à pessoa do Verbo, e, por isso mesmo, se a natureza humana de Cristo pecasse, faria pecador ao Verbo, o que é metafisicamente impossível.

– Impecabilidade dos Santos no céu

A impecabilidade física, chamada também intrínseca, é a que corresponde aos Anjos e bem-aventurados, que gozam da visão beatífica. A divina visão enche de tal maneira o entendimento do bem-aventurado, e a divina bondade atrai de tal modo seu coração, que não resta à primeira nenhuma fenda por onde passa infiltrar-se um erro, nem à segunda a possibilidade do menor apetite desordenado. Ora, todo pecado supõe necessariamente um erro no entendimento (considerando como bem real o que só é um bem aparente) e um apetite desordenado na vontade (preferindo um bem efêmero e criado ao Bem infinito e incriado). Logo, os Anjos e bem-aventurados são física e intrinsicamente impecáveis.

– A confirmação em graça

A impecabilidade moral, chamada também extrínseca, coincide com a chamada confirmação em graça, em virtude da qual Deus, por um privilégio especial, assiste e sustenta a uma determinada alma no estado de graça, a impedindo cair de fato no pecado, conservando a alma, porém, radicalmente, a possibilidade do pecado se Deus suspendesse sua ação impeditiva.

Esta última é a que teve a Santíssima Virgem Maria durante os anos de sua vida terrestre. Em virtude de um privilégio especial, exigido moralmente por sua imaculada conceição e, sobretudo, por sua futura maternidade divina, Deus confirmou em graça à Santíssima Virgem Maria desde o instante mesmo de sua puríssima Conceição. Esta confirmação não A fazia intrinsicamente impecável como os bem-aventurados – requer-se para isto, como dissemos, a visão beatífica -, mas sim extrinsecamente, ou seja, em virtude dessa assistência especial de Deus que não lhe faltou um só instante de sua vida. Tal é a sentença comum completamente certa em teologia.

Podemos ainda acrescentar que “três coisas concorriam principalmente, para tornar moralmente impossível todo pecado à Santíssima Virgem, tanto mortal quanto venial, mesmo os semi-deliberados.

A primeira era a providência especial de Deus, que velava para afastar d’Ela as ocasiões.

A segunda era aquela plenitude de graça e de auxílios, de que Deus A favorecia e pela qual sua vontade era prevenida e estimulada a aplicar-se infalivelmente, se bem que livremente, ao bem e à virtude.

A terceira consistia na isenção da chama da concupiscência, pelo que as paixões não se antecipavam nunca para tomar a razão de assalto e jamais se opunham ao domínio da mesma. Por esse privilégio singular, só a Ela concedido. Maria levava na Terra uma vida como será a nossa no Céu.

A impecabilidade e o livre arbítrio de Nossa Senhora

Nossa Senhora..........jpgMaria, pelo fato de estar dotada da impecabilidade e confirmada em graça, não ficou privada da liberdade. Do contrário não teria podido merecer. Ora, Ela mereceu e conquistou méritos extraordinários.

Portanto também a Ela se deve atribuir o elogio dos Livros Sagrados: Pudera (absolutamente falando) transgredir a lei, porém não a transgrediu nunca (Ecles. XXX, 10), porque Lhe era, moralmente impossível transgredi-la.

No mesmo sentido opina o Fr. Garriou-Lagrange, para quem “esta preservação do pecado, longe de diminuir a liberdade ou o livre arbítrio de Maria, fazia com que Ela tivesse a plena liberdade na ordem do bem, sem nenhum desvio para o mal, como sua inteligência não se desviava jamais para o erro. Assim, sua liberdade, a exemplo daquela da santa alma de Jesus, era uma puríssima imagem da liberdade de Deus, que é ao mesmo tempo soberana e impecável.

Segue-se do acima dito, “que a Bem-aventurada Virgem Maria teve a maior pureza depois de Deus, isenta perfeitissimamente de tudo que Lhe fosse contrário, isto é, não apenas de todo pecado original e atual, mortal e venial, como também de toda moral imperfeição e defeito.

Destarte, a Soberana Virgem, cheia, internamente , de uma tranqüila harmonia, externamente era temida e respeitada pelo nosso mais implacável inimigo, o demônio. Ela, por ser imaculada, não esteve jamais sob seu jugo, não provou nunca a afronta de sua tirania, mas lhe esmagou inexoravelmente a cabeça.

(CLÁ DIAS, JOÃO. Pequeno Ofício da Imaculada Conceição Comentado. Artpress. São Paulo, 1997, pp. 447 à 455)

 
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