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Plinio Corrêa de Oliveira


Dona Lucilia Ribeiro dos Santos Correa de Oliveira: Exímio modelo de bondade
 
AUTOR: IRMÃ CARMELA WERNER FERREIRA, EP
 
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Os bons exemplos são sempre importante estímulo à prática da virtude. Em Dona Lucilia vemos como uma pessoa, no sagrado âmbito do lar, pode praticar
de maneira excelente a bondade, característica
fundamental da mãe católica.

Na espiritualidade católica é costumeira a recomendação da prática da humildade, da despretensão e do desapego de si. Disso deram exemplo incontáveis santos ao longo dos séculos. Contudo, outra grande verdade precisa ser recordada: a obrigação de se reconhecer e louvar os méritos alheios, sempre que for conveniente, sob pena de incorrer em falta por omissão quem não o fizer. Trata-se de um dever de justiça.

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Coetânea de Santa Teresinha, viveu no Brasil uma dama de qualidades incomuns, cujo exemplo de vida costuma ser de grande proveito para as almas (Dona Lucilia, ainda menina, junto com seus irmãos; em 1912, em Paris; e em meados da década de 1930)

Tal foi o ensinamento do Divino Mestre no Sermão da Montanha, verdadeiro compêndio da doutrina cristã: “Não se acende uma lâmpada para colocá-la debaixo do alqueire, mas sim no candelabro […]. Assim também brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos Céus” (Mt 5, 15-16). Ou seja, os bons exemplos devem ser conhecidos, pois é uma maneira de glorificar a Deus, fonte de todo bem que pode haver em nós.

Por essa razão a Igreja promove a solene canonização de pessoas que praticaram a virtude em grau heroico, de modo a servirem de modelo para os fiéis. Mais do que a mera doutrina, são os exemplos que nos movem a trilhar o caminho do bem.

Santos aclamados e venerados em vida

Vemos, assim, que inspira o Divino Espírito Santo almas virtuosas adequadas a cada época. São alento para os bons e, em geral, autênticas pedras de escândalo para os pecadores, a quem, pelo seu modo de ser, parecem bradar: “Non licet tibi!” (Mc 6, 18). E, à semelhança de São João Batista, podem acabar sendo martirizadas, ou então relegadas ao mais estrito ostracismo.

No maravilhoso caleidoscópio da santidade, inúmeras são as vias da Providência para as almas. Por vezes, santos há cujas virtudes são reconhecidas e aclamadas em vida, recebendo eles veneração geral.

Célebre é o caso de Santo Antônio de Pádua, cujas pregações eram assistidas por dezenas de milhares de pessoas, incluindo Bispos e sacerdotes. “Findo o sermão, irrompe o entusiasmo; é uma ebriedade incontida […]. A multidão acorre ao orador. Desejam vê-lo de perto, oscular a sua túnica ou o seu crucifixo; chegam a cortar sua roupa para levar algo como relíquia. É necessária, à sua volta, uma guarda de jovens robustos para protegê-lo, a fim de não ser esmagado pela multidão”.1 Algo semelhante se passou com São João Bosco em Paris, onde fora pedir doações para a sua obra. Na Igreja de São Sulpício, passou por apuros. Levou uma hora para retornar à sacristia, tal o acúmulo de fiéis que desejam falar-lhe ou pedir uma bênção. “Ele conquistou o coração e a imaginação dos parisienses por uma mistura extraordinária de grandeza e de simplicidade, de gravidade e de alegria. Ele desconcertava; depois ele entusiasmava”.2 As mesmas cenas se repetiram nas outras cidades francesas que o santo da juventude visitou.

Ignorada pela maioria dos homens

Outros, porém, trilham o caminho do apagamento nesta Terra, sendo pouco compreendidos até pelos mais próximos, iniciando sua ação sobre um grande número de almas apenas depois da morte. Estes podem tomar para si como excelsa padroeira a própria Mãe de Deus, que levou uma vida oculta, ignorada pela maioria dos homens, mas admirada por toda a corte celeste e pelo próprio Jesus.

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As fotografias que ilustram o livro de Mons. João recentemente publicado pela Livraria Editrice Vaticana revelam uma fisionomia transbordante
de doçura e de benquerença incondicional (Dona Lucilia aos 16 anos; em 1906 pouco antes do casamento; em 1912, em Paris)        

Dentre as incontáveis almas incluídas nesta categoria cabe citar Santa Teresinha do Menino Jesus, que viveu no século XIX e de quem se guardam numerosas fotografias todas elas ilustrativas de suas excepcionais virtudes.

Tendo entrado muito jovem no Carmelo e falecido aos 24 anos, pouco haveria a se relatar de sua vida não fossem os Manuscritos Autobiográficos escritos por ordem da superiora, que, por sinal, era uma de suas irmãs de sangue. Com efeito, a leitura dessa obra revela a grandeza de alma da iniciadora da Pequena Via de santificação, abrindo passo para as novas gerações, tão frágeis e incapazes de imitar os santos dos grandes sacrifícios e das grandes generosidades. A sua vida de tal maneira serviu de estímulo às almas que, em pouco tempo, várias edições da obra se esgotaram, para surpresa do Carmelo de Lisieux. E as graças e milagres se multiplicaram, como cumprimento da promessa da santa de enviar uma chuva de rosas sobre a Terra. De desconhecida em vida, hoje Santa Teresinha conta-se entre as santas mais populares e está incluída no privilegiado rol dos Doutores da Igreja.

Aos 91 anos, preocupava-se com os outros

Por coincidência, coetânea desta mesma santa, viveu no Brasil uma pessoa de qualidades incomuns, cujo exemplo de vida costuma ser de grande proveito para as almas. Trata-se de Dona Lucilia Ribeiro dos Santos Corrêa de Oliveira, mãe de um eminente líder católico do século XX, Dr. Plinio Corrêa de Oliveira.

Com a finalidade de divulgar a sua vida, acaba de ser publicada a biografia de Dona Lucilia, escrita por Monsenhor João Scognamiglio Clá Dias, EP, profusamente ilustrada por fotografias que falam por si, tal a expressividade de sua fisionomia transbordante de doçura e de benquerença incondicional.

Como exemplo de mãe católica, nunca tendo atuado fora do lar, poderá servir de inspiração a incontáveis pessoas em nossos dias, cujas vidas também se desenrolam no seio da família. Os inúmeros fatos narrados revelam como é possível executar as tarefas cotidianas com muita elevação de alma, reportando tudo ao sobrenatural e a Deus Nosso Senhor. Como diz São João da Cruz, no final da vida seremos julgados segundo o amor a Deus, e não de acordo com a exterioridade de nossas obras.3

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Dona Lucilia, no fim da década de 1930, visitando as instalações do jornal “Legionário”; na década de 1960, pouco antes de cumprir 80 anos

Algumas atitudes de Dona Lucilia podem nos dar ideia da caridade que a animava. Nos idos de 1968, ao acompanhar a convalescença de Dr. Plinio, que se recuperava de uma grave crise de diabetes e havia se submetido a séria intervenção cirúrgica, teve o autor ocasião de admirar a extraordinária doçura, suavidade e bondade de trato de Dona Lucilia. Preocupava-se com o bem dos outros e esquecia-se de si, dando mostras de um desapego incomum. Assim, em certa ocasião, por indicação médica, o autor precisou aplicar nela uma injeção. Dona Lucilia fitou o jovem que se aproximava com a seringa e disse: “Ora, mas justamente nesta noite de sábado, eu estou dando esta amolação ao senhor! Perdão por estar atrapalhando seu programa”. Terminado o procedimento, antes do jovem se despedir, ela ainda acrescentou: “Entristeceu-me muito ter causado esse transtorno ao senhor”. Para Dona Lucilia não importava o seu mal-estar; aos 91 anos, preocupava-se mais com os outros do que consigo mesma.

Esse esquecimento de si encantava a todos os que tinham algum contato com ela. Certo dia, encontrou no apartamento dois jovens lendo enquanto aguardavam serem chamados por Dr. Plinio. Ela logo interveio: “Os senhores me permitem uma sugestão? Eu fiz muitas imprudências em minha vida, lendo e forçando a vista em lugares pouco iluminados. E agora os vejo neste hall de entrada, que não é próprio para a leitura. Sempre que necessito me distrair folheando álbuns ou revistas, uso a sala de jantar, que tem muita luz, e como eu não vou mais retornar, os senhores poderiam passar para lá. Tenho certeza de que enxergarão melhor naquele ambiente”. Não parou aí a sua solicitude. Por duas vezes, mandou que averiguassem se o seu oferecimento havia sido aceito. Na terceira, a emprega pediu que os dois jovens fizessem o favor de passar à sala de jantar, pois Dona Lucilia não se tranquilizaria enquanto isso não se desse. São cortesias, fruto da autêntica caridade, desconhecidas pelo mundo moderno…

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Dona Lucilia em seu apartamento, há um mês
de seu falecimento. Esta fotografia pertence
à série tirada pelo autor do livro

“A você eu tenho inteiramente”

Se nem todos a compreenderam e valorizaram, um reconhecimento ela teve a vida toda: o de Dr. Plinio, a quem chamava seu “filhão”. Quando já octogenária, viúva, ao cruzar com Dr. Plinio no corredor do apartamento em que moravam, pôs-lhe as mãos sobre os ombros e, fitando-o no fundo dos olhos, disse: “Filhão, só tenho a você, mas a você eu tenho inteiramente”.

Certa feita, depois de uma estada de Dr. Plinio de cerca de dois meses na Europa, Dona Lucilia olhou-o atentamente ao se reencontrarem, concluindo feliz: “Filhão, graças a Deus, você é sempre o mesmo!”. Como mãe diligente, preocupava-se com a perseverança do filho em meio às batalhas e perigos do mundo.

Em sua nobreza de alma, também não se apegava a vantagens materiais ou de prestígio social. Numa oportunidade em que determinado empreendimento de Dr. Plinio não obteve êxito, ela não se entristeceu. Quando lhe perguntaram qual a razão desse alheamento, respondeu que se tivesse sido bem sucedido, seu filho se ausentaria de casa por longos períodos, tendo que morar em outro Estado, e o convívio entre ambos diminuiria muito. Isso lhe causaria algum sofrimento, pois, conforme comentou na ocasião, “viver é estar juntos, olhar-se e querer-se bem”. Esta era, em suma, a sua divisa, pela qual pautava com verdadeira caridade o relacionamento com o próximo.

Caminhou para a morte com serenidade

“Talis vita, finis ita”, reza o ditado latino. Uma existência levada com tal espírito cristão e desprendimento teria um fim coerente. Assim, foi ela caminhando para a morte com toda a serenidade. Na manhã de 21 de abril de 1968, relata o livro, “com os olhos bem abertos, dando-se perfeitamente conta do solene momento que se aproximava, levantou-se um pouco, fez um grande sinal da cruz e, com inteira paz de alma e confiança na misericórdia divina, adormeceu no Senhor…”.

Começava, assim, junto aos que vão rezar em sua sepultura, e também pela ação de suas fotografias, uma torrente de graças que cresce a cada dia, trazendo alento na prática da virtude a incontáveis almas necessitadas de refrigério, luz e paz. ² (Revista Arautos do Evangelho, Maio/2013, n. 137, p. 36 à 39)

1 CHERANCÉ, Léopolde de. Saint Antoine de Padoue. Paris: Poussielgue, 1895, p.109-110.

2 LA VARENDE. Jean de. Don Bosco. Paris: Fayard, 1961, p.181.
3 Cf. SÃO JOÃO DA CRUZ. Dichos de luz y amor, n.59. In: Vida y obras completas de San Juan de la Cruz. Madrid: BAC, 1964, p.963.

 
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