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Voz dos Papas


Sacerdócio e orgulho da mente
 
PUBLICADO POR ARAUTOS - 09/02/2017
 
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Instituído por Jesus Cristo para a salvação das almas, o sacerdócio não é uma profissão ou um ofício humano qualquer, que pode ser exercido livremente por todos quantos queiram.

Com a alma cheia de salutar temor pelas severíssimas contas que deveremos prestar um dia a Jesus Cristo, Príncipe dos Pastores, a respeito do rebanho que Ele nos confiou, passamos os dias na permanente preocupação de preservar os fiéis, tanto quanto possível, dos perniciosíssimos males que afligem atualmente a sociedade humana.

Consideramos, assim, dirigidas a nós estas palavras do profeta: “Clama em alta voz, sem constrangimento; faze soar a tua voz como a corneta” (Is 58, 1). E, seja de viva voz, seja por escrito, não deixamos de advertir, de pedir, de repreender, excitando sobretudo o zelo de nossos irmãos no Episcopado para que cada qual exerça a mais solícita vigilância sobre a porção do rebanho a ele confiado pelo Espírito Santo.

Corrupção dos costumes e desprezo por toda autoridade

É da maior gravidade o motivo que nos impele a elevar novamente a voz. Trata-se de solicitar toda a atenção de vosso espírito e toda a energia de vosso ministério pastoral contra uma desordem cujos funestos efeitos já se fazem sentir; e se não arrancarmos com mão forte até suas mais profundas raízes, dela decorrerão consequências ainda mais fatais ao longo dos anos.
De fato, temos sob os olhos cartas de vários de vós, veneráveis ­Irmãos, transbordantes de tristeza e de lágrimas, deplorando o espírito de insubordinação e de independência que se manifesta cá e lá no meio do clero.

Em nossos dias, infelizmente, uma venenosa atmosfera corrompe largamente os espíritos; seus mortais efeitos foram já descritos pelo Apóstolo São Judas: “Contaminam a carne, desprezam a soberania e maldizem a majestade” (Jd 1, 8); ou seja, além da mais degradante corrupção dos costumes, o desprezo aberto a toda autoridade e àqueles que a exercem. Mas o que enche de imensa dor nossa alma é o fato de que esse espírito penetre de algum modo até no santuário e infecte aqueles aos quais mais propriamente se deveria aplicar a palavra do Eclesiástico: “este é o povo da obediência e do amor” (3, 1).

E é sobretudo entre os jovens sacerdotes que esse tão funesto espírito produz devastações, espalhando entre eles novas e reprováveis teorias sobre a própria natureza da obediência. Coisa mais grave, como se se quisesse conquistar com o tempo novos recrutas para a multidão nascente dos rebeldes, faz-se dessas máximas uma propaganda mais ou menos velada entre os jovens que no recinto dos seminários se preparam para o sacerdócio.

O sacerdócio não é um ofício humano qualquer

Assim, veneráveis Irmãos, sentimo-nos no dever de apelar à vossa consciência para que, sem qualquer hesitação, vos empenheis com vigor e perseverança na tarefa de destruir essa má semente fecunda em perniciosíssimas consequências. Recordai-vos sempre que o Espírito Santo deu-vos o encargo de governar. Lembrai-vos do preceito de São Paulo a Tito: “Repreende com toda autoridade. E que ninguém te menospreze!” (Tt 2, 15). Exigi severamente dos sacerdotes e dos clérigos aquela obediência que, se para todos os fiéis é de todo obrigatória, para os sacerdotes constitui a parte essencial de seu dever sagrado.

Para evitar a multiplicação desses espíritos rebeldes, será muito útil, veneráveis Irmãos, ter sempre presente a advertência do Apóstolo a Timóteo: “A ninguém imponhas as mãos inconsideradamente” (I Tim 5, 22). De fato, a facilidade na ­admissão às Sagradas Ordens, que abre naturalmente o caminho para a multiplicação das pessoas no santuário, não aumenta em seguida a alegria. […] O sacerdócio, ­instituído por Jesus Cristo para a salvação eterna das almas, não é por certo uma profissão ou um ofício humano qualquer, que pode ser exercido livremente por todos quantos queiram.

Em consequência, que os Bispos promovam às Ordens, não de acordo com os desejos ou pretensões dos candidatos, mas, como prescreve o Concílio de Trento, conforme a necessidade das dioceses. Assim agindo, poderão escolher só os que são de fato idôneos, recusando os que demonstram inclinações contrárias à vocação sacerdotal, entre estas, sobretudo, a indisciplina e aquilo que a gera, o orgulho da mente.

Tereis os sacerdotes que tiverdes educado

Para que não vos faltem jovens com as qualidades requeridas para serem admitidos ao santo ministério, queremos, veneráveis Irmãos, insistir com mais empenho sobre aquilo que temos recomendado com frequência: a gravíssima obrigação que tendes perante Deus de vigiar e promover com toda solicitude o reto funcionamento de vossos seminários. Tereis os sacerdotes que tiverdes educado. […]

Que os seminários sejam esmeradamente mantidos no seu espírito próprio e se destinem exclusivamente a preparar os jovens, não para uma carreira civil, mas para a alta missão de ministros de Cristo.

Que os estudos de filosofia, de teologia e das ciências afins, sobretudo da Sagrada Escritura, sejam feitos de acordo com as prescrições pontifícias e com o estudo de São Tomás, tantas vezes recomendado pelo nosso venerado predecessor e por nós na carta apostólica de 23 de janeiro de 1904.

Exerçam os Bispos a mais escrupulosa vigilância sobre os professores e suas doutrinas, advertindo aqueles que sigam certas novidades perigosas, e afastando do magistério todos os que não se aproveitam das advertências recebidas. […]

Mantenha-se sempre com maior rigor e vigilância o regulamento disciplinar. Por fim, nunca falte em um seminário o diretor espiritual, homem de extraordinária prudência e perito nas vias da perfeição cristã, o qual, com incansável zelo, cultive nos jovens aquela firme piedade que é o primeiro fundamento da vida sacerdotal.

Se seguirdes conscienciosa e constantemente essas regras, veneráveis Irmãos, tereis a certeza de ver crescer em torno de vós um clero que será vossa alegria e vossa coroa.

Sejam banidos do púlpito os argumentos mundanos

Além da desordem de insubordinação e de independência que aqui deploramos, há em alguns membros do jovem clero outra que vai muito mais longe e cujos perniciosos resultados são muito mais consideráveis. Com efeito, não faltam aqueles que estão de tal forma invadidos por tão reprovável espírito que, abusando do sagrado ministério da pregação, dele se fazem abertamente propugnadores e apóstolos, para ruína e escândalo dos fiéis. […]

Ninguém pode ter autorização para pregar “sem antes ser posto à prova quanto à sua vida, sua ciência e seus costumes” (Concílio de Trento. Sessão V. Sobre a Reforma, c.2). Os padres de outra diocese não devem ser autorizados a pregar sem as cartas testimoniais do respectivo Bispo. A matéria da pregação deve ser a indicada pelo Divino Redentor, que disse: “Pregai o Evangelho” (Mc 16, 15), “ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi” (Mt 28, 20). Ou seja, como comenta o Concílio de Trento, “indicando-lhes os defeitos que precisam abandonar e as virtudes que devem praticar para fugir do castigo eterno e conquistar a glória celeste” (Sessão V. Sobre a Reforma, c.2).

Sejam, pois, totalmente banidos do púlpito os argumentos mais adequados às polêmicas de imprensa e aos discursos acadêmicos do que ao lugar santo. Dê-se preferência às pregações sobre temas morais, em lugar dessas conferências, das quais o mínimo que se pode dizer é que são infrutíferas. Faça-se a pregação “não com a eloquência persuasiva da sabedoria humana, mas como uma demonstração do Espírito e do poder divino” (I Cor 2, 4). Por isso a principal fonte da pregação deve ser a Sagrada Escritura, entendida, não segundo as opiniões particulares de espíritos às mais das vezes obnubilados pelas paixões, mas segundo a Tradição da Igreja, as interpretações dos Santos Padres e dos Concílios.

De acordo com estas normas, veneráveis Irmãos, deveis ser os juízes daqueles aos quais confiais o ministério da divina palavra. E quando encontrardes pregadores mais preocupados com seus próprios interesses do que com os de Jesus Cristo, mais ávidos de sucesso humano que do bem das almas, afastai-os do púlpito. Admoestai-os, corrigi-os e, se isto não for suficiente, removei-os inexoravelmente de um encargo do qual se mostram totalmente indignos. (São Pio X. Excertos da Carta encíclica “Pieni l’animo”, 28/7/1906: ASS 39 (1906), 321-329) – Revista Arautos do Evangelho, Fevereiro/2017, n. 182, 6-7.

 
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