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Contos Infantis


O valor da espera e do abandono
 
AUTOR: SARAH RAMOS MAFORT
 
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Quando já estava desiludida e resignada com seu triste estado, Susana ouviu uma voz diferente das outras: doce, atraente, ao mesmo tempo transbordante de nobreza e seriedade. De quem seria aquela voz?

Amanhece um alegre dia de primavera. O sol expande seus raios de forma esplêndida sobre as margens do Lago de Genesaré. Os pássaros embelezam o ar com seus cânticos e toda a natureza parece rejubilar-se para comemorar a mais sorridente das estações do ano.

Algo nunca visto, porém, chama a nossa atenção: as árvores de uma colina próxima começam uma inusitada conversa!

Da. Figueira, anciã de 327 anos, inicia o diálogo:

— Minhas irmãs, tenho o prazer de anunciar-vos que Josefina dos Cedros, vossa reverenda professora, foi levada à carpintaria do Sr. Mateus, a fim de ser transformada num barco de pesca para um homem chamado Simão.

— Senhora – disse Margarida Carvalho –, com vossa permissão peço que me deis a oportunidade de revelar aqui o fim de minha querida irmã Terebinda Carvalho. Por sua nobreza de porte e formosura, ela se tornou um lindo armário entalhado para uso do sumo sacerdote. Ela o agradou tanto que recebeu por missão custodiar os mais valiosos objetos de culto do Templo!

— Que felicidade a dela! – exclamou a jovem Susana Azinheira – Como eu gostaria…

Sem ter quase tempo de sentir dor,
Susana viu-se transformada…

— Minha pequena, saiba que para nos transformarmos em algo muito bonito e de boa qualidade é necessário, antes de tudo, passar por longos e cruéis sofrimentos, como o de ser cortada em diversas partes e sentir uma série de pregos a nos perfurar – disse a sábia anciã.

— Sim, Da. Figueira, mas não é verdade que depois de passar por tantas dores estaremos prontas para as mais altas missões? Sinto um forte desejo de servir a um rei… Acho que serei um trono!

As árvores mais velhas riram diante de tanta ingenuidade, logo voltando aos assuntos do dia a dia e não fazendo muito caso de Susana, que ainda era quase um brotinho.

Os anos se passaram e ela se desenvolveu; contudo, percebeu ter ficado bem menor do que suas companheiras. Afinal, não pertencia à majestosa família dos cedros, nem ao pujante gênero dos pinheiros… Era uma humilde azinheira!

Todas as suas amigas tinham partido para outros lugares. Com frequência via passar diante de si Margarida Carvalho, convertida em arca, carregando no seu interior ricos tecidos vindos do Oriente, ou Josefina dos Cedros, que singrava altaneira o Lago de Genesaré em busca dos mais disputados peixes. Susana, porém, se sentia cada vez mais ignorada, prevendo que seu destino seria o anonimato!

Certo dia, ouviu-se um tumulto na colina. Era o lenhador, que caminhava em direção a Susana! Uma única e dolorosa machadada fê-la sentir-se livre da terra e todas as suas esperanças voltaram-lhe à mente com uma força redobrada. Pouco depois foi entregue a um homem de aparência modesta que começou a manuseá-la, enquanto ela, preparando-se para os maiores sofrimentos, imaginava qual seria a grandeza do seu destino.

O artesão, entretanto, executou um trabalho muito rápido e simples. Sem ter quase tempo de sentir dor, Susana viu-se transformada… num cabo de vassoura! E foi jogada no fundo de um armazém.

— Que decepção! – dizia de si para consigo a pobre azinheira, com lágrimas nos olhos.

Ao observar à sua volta, percebeu não estar sozinha: com ela havia uma enorme quantidade de cabos que tiveram a mesma sina.

Passaram-se os dias e as semanas, e ninguém se interessou por ela. Na solidão, pensava: “Se minhas amigas me vissem neste estado, ririam de mim! Não era melhor ter morrido de velha na colina? Quantos sonhos perdidos… Agora mofarei aqui, sem ver novamente a luz do sol!”

Sempre que a porta do armazém era aberta suas esperanças renasciam, mas tudo era ilusão! Instantes depois fechava-se de novo e os sonhos de Susana se esvaneciam mais uma vez.

Desiludida e resignada com seu triste estado, numa tranquila manhã ouviu uma voz diferente das outras: doce, atraente, ao mesmo tempo transbordante de nobreza e seriedade:

— Bom dia, senhor vendedor! Como tem passado?

— Vamos indo… Infelizmente estamos em tempos de crise e as vendas andam muito fracas… Em que posso servi-la, Senhora?

A partir de então Susana recebeu o
maior tesouro que já houve no mundo

— Gostaria muitíssimo de poder ajudá-lo, no entanto meu esposo e eu não temos condições de comprar muitas coisas. Preciso de uma vassoura e pergunto se o senhor teria alguma bem simples, pois só possuo isto para oferecer por ela.

Ao ver a moedinha de ínfimo valor que lhe era apresentada, o homem enfureceu-se interiormente. Todavia, impactado pela dignidade repleta de doçura da nobre dama, segurou-se e, contrariando seu temperamento um tanto grosseiro, respondeu com amabilidade:

— Tenho algumas disponíveis no armazém. Por favor, pegue a que mais lhe agradar, sem nenhuma paga!

Ao ver Susana, a bondosa Senhora foi logo ao seu encontro e a pegou para levá-la consigo.

Difícil seria avaliar a alegria que a pequena azinheira sentiu ao ser acariciada por mãos suaves e delicadas como o arminho, e por perceber que do rosto da Senhora emanava uma luz discreta e envolvente.

Quem seria Ela?… Era a Virgem Maria!

A partir de então Susana recebeu o maior tesouro que já houve no mundo: participar do convívio da Sagrada Família. Por ter sofrido com resignação e humildade a dor da espera e do abandono, ela obteve a graça de servir à Rainha do Céu e da terra!

O simples varrer de Maria Santíssima deixava o Altíssimo extasiado e, por estar nas mãos d’Ela, a pequenina vassoura participava de um ato que dava mais glória a Deus do que os de todos os Santos reunidos.

Como explicar em palavras humanas a emoção de Susana durante o tempo de serviço na casa de Nazaré? Quiçá os Anjos tenham recolhido a grande relíquia que se tornou e algum dia ela ainda possa nos contar…

Para os que queiram adiantar-se, coloquem-se também a serviço de Nossa Senhora, pois sentirão o suave acariciar de suas mãos e a infinitude de graças que a estes Ela reserva! (Revista Arautos do Evangelho, Janeiro/2019, n. 205, p. 46-47)

 
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