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História da Igreja


Uma Cruz de Estrelas
 
AUTOR: SANTIAGO MORAZZANI ARRÁIZ
 
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Dispensando uma análise do conjunto dos fatos e realçando apenas alguns aspectos da História, sonhemos um pouco a respeito das heróicas viagens de Afonso de Albuquerque

A paisagem calcinada e agreste não era muito própria a infundir ânimo e confiança. As silhuetas dos montes desérticos, bordejando as águas de ambos lados, pareciam ameaçar aqueles homens atrevidos que ousavam desafiar a solidão. E em meio a um silêncio inquietante, apenas interrompido pelo fraco bater das ondas nos cascos das naus, ou pelo golpe compassado dos remos das galés, a esquadra avançava em coluna, rumo ao desconhecido. À frente velejava a nau Rosário, seguida de perto pela capitânia Santa Maria da Serra, em cujo mastro principal drapejava galhardamente a bandeira dasAlfonso_de_Albuquerque.jpgquinas. Eram navios portugueses que, após rápida visita a Adém, a cidade árabe das nove colinas, acabavam de cruzar o estreito de Bab-al-Mandab, o portal de entrada do Mar Vermelho.

Um plano acariciado há longos anos

Corria o ano de 1512. Os dois reinos ibéricos, Espanha e Portugal, viviam uma época de expansão prodigiosa, produzindo gerações de heróis que se ocupavam em dar novos mundos ao Mundo, explorando regiões da terra até então desconhecidas para a Cristandade e levando aos pontos mais longínquos do orbe a mensagem do Evangelho.

Essa aventura do Mar Vermelho, entretanto, era mais do que perigosa. Porém, junto à bandeira real via-se também a insígnia do almirante, o qual não era homem que se deixasse intimidar por nenhum risco. Tratava-se do Governador da Índia, Capitão-mor da esquadra do Oceano Índico e veterano de mil expedições, cada uma mais ousada do que a outra: Afonso de Albuquerque.

Tinha ele acariciado aquele plano durante longos anos, mas as circunstâncias o haviam obrigado a adiá-lo várias vezes. Agora exultava de satisfação, na proa da Santa Maria da Serra, contemplando aquela vastidão aberta ao seu infatigável zelo missionário. Nada desejava ele tanto quanto ver as margens do Mar Vermelho cobertas pela sombra da Cruz de Cristo. E os seus olhos de águia perscrutavam insistentemente os horizontes da costa ocidental, na direção daquela Abissínia misteriosa e lendária, a Etiópia mencionada nas Escrituras Sagradas, em cujas montanhas dizia-se reinar um imperador cristão. Albuquerque ardia em desejos de chegar até o mítico personagem, o “Preste João” das tradições medievais, e saudá-lo com mensagens de amizade do Rei de Portugal. Esse encontro marcaria uma nova era nas relações entre a África e a Europa, que se abraçariam, afinal, sob o signo da Cruz.

O Capitão-mor mandou rezar o Credo

As naus ancoraram no estreito e engalanaram-se de inúmeras bandeiras. Foi um momento emocionante. Ao troar dos canhões, as tripulações se reuniram e o Capitão-mor mandou rezar o Credo e agradecer a Deus que lhes permitia realizar aquela proeza. Cantaram eles a profissão de Fé? Recitaram- na apenas? Não sabemos, mas o certo é que os montes descalvados das costas da Arábia repetiram os ecos dos dogmas divinos. E o vento ardente do deserto levou para longe as verdades pelas quais, até o fim do mundo, haverá homens e mulheres a entregarem suas vidas:

“Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro!”

Deus verdadeiro… O mesmo que se manifestara a Moisés numa montanha, às margens daquele mar, era agora simbolizado Afonso de Albuquerque.jpgpelas cruzes que ornavam as naus de Portugal. E aqueles homens rudes sabiam-se enviados por Ele e representantes de sua Igreja três vezes santa.

“Ressuscitou ao terceiro dia, conforme as Escrituras”.

E eles eram arautos do Ressuscitado, levando aos confins mais inóspitos do mundo a sua mensagem de amor infinito e deconcórdia entre todos os povos e nações.

“Cujo Reino não terá fim”.

Sim. Aquele punhado de cristãos, isolado numa paragem ameaçadora, onde jamais navegara uma esquadra européia, ousava proclamar um Reino eterno, que nunca será destruído por força alguma no Universo. E o tranqüilo balouçar das naus, pontos minúsculos em meio àquela imensidade de água e areia, parecia sublinhar a fé inabalável da Igreja nas promessas de seu Divino Fundador.

Uma cruz formada por nove estrelas

Poucos dias depois, a frota esperava ventos favoráveis na Ilha de Camarão. E, durante uma noite sem lua, os
expedicionários puderam ver uma misteriosa cruz de fogo, formada por nove estrelas, que se deslocava lentamente através do firmamento e desaparecia no oeste, sobre as terras da Abissínia. “Era muito clara e resplandecente – escreveu o próprio Albuquerque – e veio uma nuvem sobre ela, dividindo-se em partes sem tocar a cruz nem cobrir sua claridade. Foi vista de muitas naus e a gente caiu de joelhos, adorando a Deus com muitas lágrimas”. E o Capitão-mor afirmou ser esse o sinal a indicar-lhes o caminho.

A Providência manifestava assim sua aprovação ao empreendimento. Mas, sobretudo, o episódio deixava para os séculos futuros – o nosso século, talvez! – uma lição de fé. Aqueles que se lançam às arenas da evangelização devem estar dispostos a atravessar todos os oceanos e todos os desertos, materiais ou espirituais, pois em qualquer situação jamais lhes faltará o auxílio da graça. Quando sobre eles se abater a noite das provações, e eles erguerem os seus olhos para os céus, ali estará a Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, sinal de esperança e de triunfo, a lhes recordar as palavras do Divino Mestre:

“Não temais, Eu venci o mundo!” (Jo 16, 33). (Revista Arautos do Evangelho, Dez/2005, n. 48, p. 24-25)

 
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