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Espiritualidade


O mais sublime convívio com Cristo Redentor
 
AUTOR: CAROLINA AMORIM ZANDONÁ
 
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Participar do mesmo calvário, beber do mesmo cálice, carregar a mesma cruz: eis a clave do sublime convívio que Nosso Senhor Jesus Cristo veio estabelecer com os homens através da Redenção.

Deus criou os seres humanos com o instinto de sociabilidade e dispôs que o relacionamento harmonioso com os semelhantes fosse uma das maiores fontes de felicidade para quem está nesta terra.

Ora, quando as pessoas, de proche en proche, fazem chegar à sua plenitude esse relacionamento terreno, logo desejam incluir nele os Anjos e, em certo sentido, o próprio Deus. Convivendo familiarmente já neste mundo com aqueles que moram nas alturas celestes, tornam-se participantes das alegrias que os espíritos angélicos gozam na visão beatífica.

Judite – Igreja São Germano de Auxerre, Paris

Cores que representam os matizes do convívio

Variada, misteriosa e cheia de simbolismo se apresenta a história do convívio entre os homens no Antigo Testamento. Dir-se-ia que, nessa matéria, a humanidade cintilou ao longo dos milênios com cores diversas, semelhantes às das pedras preciosas.

O reencontro de José com seus irmãos no Egito (cf. Gn 45–46) poderia ser imaginado envolto numa linda cor ametista, pois esta pedra espelha com seu brilho suave e sereno as alegrias do trato retomado, depois de uma longa e dolorosa separação.

A forte, leal e incondicional amizade entre Davi e Jônatas (cf. I Sm 20), não será tão rara e valiosa quanto o verde profundo de uma esmeralda?

E como não comparar a vigorosa cor vermelha do rubi à singular perspicácia e heroica coragem de Judite ao decepar a cabeça do chefe dos inimigos de Israel para defender o seu povo e o Santuário de seu Deus? (cf. Jt 8–13).

Seguindo adiante na esteira dessas comparações, caberia perguntar a que se assemelha o límpido fulgor da mais excelente das pedras, o diamante, cujo feérico brilho parece refletir algo do novo e sublime relacionamento que a Sabedoria Eterna quis estabelecer com a humanidade quando “na terra Ela apareceu e com os homens conviveu” (Br 3, 38).

Ao Se encarnar no seio de Maria Santíssima, Nosso Senhor Jesus Cristo inaugurou uma era da História. Ensinou-nos a amar o próximo da forma mais excelsa, santa e perfeita que se possa imaginar, e deu- -nos provas superabundantes desse amor ao longo da Paixão.

Conviver suave e harmoniosamente em meio à dor, manter a união no auge da contrariedade, estar disposto a imolar-se pelo outro sem esperar retribuição, eis alguns dos ensinamentos transmitidos pelo Salvador no fim de sua vida pública, como corolário de sua doutrina. 

Tal convívio, ao mesmo tempo dulcíssimo e coalhado de sofrimentos, se mostrou mais forte, luminoso e cristalino do que o diamante, atraindo as almas com seu imaculado esplendor.

O indispensável papel do sofrimento

“Se alguém quiser vir comigo, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-Me. Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas aquele que tiver sacrificado a sua vida por minha causa, recobrá-la-á” (Mt 16, 24-25). Nesta passagem da Escritura, Nosso Senhor estabelece o sofrimento como elemento necessário para acompanhá-Lo e alcançar sua amizade.

Carregar a cruz significa não apenas estar disposto a aceitar a dor e a contrariedade, mas fazê- -lo por amor. Dos que lhe são mais próximos Jesus espera uma intimidade completa, que os leve a discernir seus divinos anseios e desígnios, e a tudo padecer com Ele, por Ele e para Ele.

No entanto, já entre os Apóstolos encontramos diferentes graus de correspondência a esse convite. Ao ouvir o primeiro anúncio da Paixão, São Pedro repreendeu o Mestre, merecendo receber d’Ele esta grave censura: “Vai para longe de mim, satanás! Tu não pensas como Deus, e sim como os homens” (Mc 8, 33).

São João, pelo contrário, teve uma atitude perfeita quando, reclinando-se sobre o peito de Jesus durante a Última Ceia, perguntou-Lhe quem O haveria de trair (cf. Jo 13, 23-25). Mais do que escutar a resposta vinda dos lábios do Redentor, ele procurou auscultar os anseios do Sagrado Coração e amou os insondáveis desígnios de Deus, sem pôr obstáculos a que se consumassem todos os sofrimentos de seu Senhor. 

O amor incondicional deste Apóstolo levou-o a, unido a Maria Santíssima, dizer fiat à vontade do Padre Eterno e à obra da Redenção, tornando-o digno de estar junto à Cruz de Cristo (cf. Jo 19, 26).

Diversidade de reações em face do sofrimento

Ora, não só os Apóstolos, mas todos os homens, bons e maus, passam inevitavelmente por esse “divino desafio” de dizer fiat aos sofrimentos que ante eles se apresentam neste vale de lágrimas. E também entre nós há diversos modos de reagir em face dessa realidade.

Algumas pessoas, acomodadas à situação em que se encontram, fazem de tudo para evitar qualquer moléstia ou preocupação, preferindo acreditar na triste ilusão de um mundo “perfeito”, sem dificuldades nem angústias. Elas se assemelham a São Pedro quando atraiu sobre si a reprovação do Salvador: “Vai para longe de mim, satanás! Tu não pensas como Deus, e sim como os homens”.

Outras, sedentas de vantagens, gozos medíocres e alegrias passageiras, podem ser contadas entre o grande número dos egoístas que, mesmo sabendo não ser possível desterrar por completo o sofrimento de suas vidas, “se portam como inimigos da Cruz de Cristo, cujo destino é a perdição, cujo deus é o ventre, para quem a própria ignomínia é causa de envaidecimento, e só têm prazer no que é terreno” (Fl 3, 18-19).

Poucos são, infelizmente, os que, diante das inevitáveis aflições desta terra, as enfrentam com serenidade, resignação e alegria.

Aparição de Nosso Senhor a São Francisco de Assis – Igreja de São Roque, Quebec (Canadá)

Homens e mulheres configurados com Cristo

Deus, porém, não abandona o mundo aos desvarios do pecado, nem deixa de suscitar almas que indiquem à humanidade o caminho da retidão, do desprendimento e da verdadeira caridade. Essas almas são chamadas a, juntamente com Cristo, serem pregadas na Cruz (cf. Gal 2, 19) e abraçarem a dor da forma como a Providência queira enviá-la, pois o sofrimento as configura com Nosso Senhor de uma maneira perfeitíssima.1

Na vida dos Santos encontramos inúmeros fatos que ilustram essa sublime realidade, tantas vezes manifestada no próprio corpo pela presença dos sagrados estigmas e por outros fenômenos sobrenaturais.

Grande exemplo de amor à cruz deu-nos São Francisco de Assis. Varão cheio de Deus, alcançou tão alto grau de união com Cristo que, após um êxtase, mereceu tornar-se fisicamente semelhante ao Crucificado, trazendo em sua carne as chagas de Jesus.2 Como explica São Boaventura, seu biógrafo e filho espiritual, “assim como ele havia imitado a Cristo nas ações de sua vida, do mesmo modo devia se conformar a Ele nas aflições e dores da Paixão, antes de partir deste mundo”.3

O que dizer, então, de Santa Teresa de Jesus, cujo coração era frequentemente transpassado por um Anjo com uma seta incandescente, que a deixava abrasada de amor a Deus? A dor causada pela transverberação arrancava-lhe sonoros gemidos e lamentos! No entanto, a paz e consolo por ela sentidos naqueles instantes eram tais que de modo algum desejava evitar ou diminuir esse sofrimento.4

Cabe ainda lembrar Santa Gema Galgani, escolhida pela Providência para viver intensamente a glória da cruz. Essa jovem eleita teve também a imensa graça de portar em seu corpo os sagrados estigmas, como prova do grande amor e predileção que o Redentor e sua Mãe Santíssima nutriam por ela.5

Sigamos o seu exemplo!

Todos nós, batizados, somos chamados à santidade e, portanto, a padecer por amor a Deus os sofrimentos que Ele queira nos enviar, tendo a certeza de que as forças para enfrentá-los nos virão d’Ele mesmo.

Assim, quando abraçarmos nossa cruz e sentirmos nossa fraqueza clamar dentro de nós, olhemos para além da dureza e negrume do simples lenho. Fixemos nossas vistas em quem nela está pregado e lancemo-nos em seus braços, que nos convidam a conviver com Jesus nesta hora suprema!

E, a seu exemplo, nos momentos mais terríveis busquemos auxílio n’Aquela que não só sofreu e enfrentou com Ele toda a Paixão, mas foi também, por seu amor e fidelidade adamantina, seu máximo consolo, ornando com lágrimas de brilhante o Sacrifício Redentor. (Revista Arautos do Evangelho, Agosto/2019, n. 212, p. 34-36)

1 Cf. ROYO MARÍN, OP, Antonio. Teología de la perfección cristiana. 4.ed. Madrid: BAC, 1962, p.341. 2 Cf. SÃO BOAVENTURA. Vida de San Francisco. Legenda Maior. Madrid: San Pablo, 2004, p.134. 3 Idem, ibidem. 4 Cf. AUCLAIR, Marcelle. La vida de Santa Teresa de Jesús. 14.ed. Madrid: Palabra, 1982, p.111-113. 5 Cf. SANTA GEMA GALGANI. Autobiografía. In: La gloria de la Cruz. Madrid: BAC, 2002, p.33.

 
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