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Plinio Corrêa de Oliveira


A boa oração é sempre atendida: Desfazendo objeções
 
PUBLICADO POR ARAUTOS - 24/09/2019
 
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Encerrando a série de seus comentários ao livro de Santo Afonso de Ligório – “A oração, grande meio da salvação” –, Dr. Plinio relembra e responde algumas objeções que poderiam ser levantadas acerca do valor das nossas preces e da propícia disposição de Deus para com elas.

Lemos na Escritura, sobretudo nos Evangelhos, muitas afirmações a respeito da eficácia da oração. Uma das mais famosas é: “Pedi e recebereis, procurai e achareis, batei e abrir-se-vos-á” (Lc 11, 9). É a lição da parábola do homem que dorme e que, à força de ser importunado pelo vizinho a lhe bater à porta, atende o pedido deste (Lc 11, 5ss).

Ao explicar a parábola, Nosso Senhor comenta: “Quem de vós, se um filho pede pão, lhe dará uma pedra? Ou se pede peixe, lhe dará uma serpente? Ou se pede um ovo lhe dará um escorpião? Se vós pois, que sois maus, sabeis dar bons presentes a seus filhos, quanto mais vosso Pai que está nos Céus concede o bom Espírito para aqueles que o pedem.”

Por que confiar no valor da oração, se nem sempre é atendida?

Se essas palavras devessem ser tomadas “quadradamente” ao pé da letra, como se tratando de uma promessa absoluta de Nosso Senhor, a conclusão é que todas as nossas orações são sempre atendidas.

Ora, a experiência nos mostra que nem todas são atendidas; logo, dir-se-ia que essa promessa não pode ser tomada ao pé da letra.

“Então qual o valor dela?” — perguntará alguém. “Se Deus se reserva ressalvas ao fazer uma promessa, fica-se mais ou menos desnorteado quanto à sua validade.”

Certa vez alguém me confidenciou: “Eu não rezo porque Deus não me atenderá, pois Ele quer que eu passe por uma prova”.

Trata-se evidentemente de uma atitude errada. Mas vê-se que a pessoa tinha uma dificuldade que pode ser expressa no seguinte raciocínio:

“Se estou doente e peço a Deus que me cure, ou se estou tentado e peço que a tentação cesse, que grau de confiança posso ter no atendimento de meu pedido? O próprio São Paulo rogou três vezes a Deus que afastasse dele as tentações e não foi atendido, pois a tentação era uma dádiva para ele. Vale então a pena eu pedir?”

O problema acima está posto em termos bem agudos e rudes. Mas é um problema lógico que exige solução, com o objetivo de compreender melhor o valor da oração e a atitude de Deus para com quem reza.

Poucos são os livros de piedade que consideram essa dificuldade inteiramente de frente. Em geral, fazem considerações muito abstratas e não fornecem uma explicação satisfatória. Tive de refletir bastante para chegar às conclusões que enunciarei a seguir.

O pedido que nunca é recusado

Em primeiro lugar, na oração devemos distinguir duas espécies de pedidos.

Há aquele que Deus atende sempre, no sentido mais rigoroso da palavra, isto é, o de nossa santificação, perseverança e salvação eterna, desde que nossa oração seja insistente. Porém, mesmo nesse caso há conformes. Pois isso não implica que se obtenha imediatamente o que pedimos. Há pessoas que se julgam no direito de fixar prazos a Deus. Elas não compreendem que Deus pode tardar em conceder as graças que imploramos, pois quer provar a nossa paciência e confiança.

Ele pode querer que passemos por provações terríveis, antes de nos conceder o que pedimos. Conheço almas que quanto mais rezam, tanto mais acreditam naufragar. A solução para elas não é parar de rezar, mas orar com maior empenho. Pois quando Deus lhes conceder a graça pedida, fa-lo-á com juros. Na minha experiência de vida espiritual eu afirmo que esse trato de Deus para com essas almas é um sinal de verdadeira predileção por elas.

É preciso que essas almas tenham confiança, esperem contra toda a esperança, sabendo que um dia obterão o que pedem, em vista da promessa de Nosso Senhor: “Em verdade, em verdade vos digo, tudo o que pedirdes ao Pai em meu nome, Ele vô-lo concederá”. A expressão “em verdade, em verdade” equivale a um verdadeiro juramento de Nosso Senhor.

Discernindo as vias da Providência

Tendo criado o homem com inteligência e livre arbítrio, está nos desígnios da Providência que ele não só utilize esses dons para progredir na vida material, mas também para buscar a própria santificação.

A inteligência humana, servida como por um instinto que vem da graça, encontra condições para realizar um reto juízo a respeito de tudo quanto se refere à vida espiritual.

A cada homem Deus dá uma noção do que lhe convém para a sua salvação. Não se trata de uma noção genérica, mas de uma noção aplicada à sua vida pessoal concreta. Mas a medida de segurança e de clareza que as almas têm no conhecimento de suas próprias vias, varia muito de uma para outra.

Há algumas às quais Deus concede uma clareza excepcional a esse respeito, enquanto outras vêem num lusco-fusco. Isso depende da pedagogia de Deus com cada alma.

Assim, por exemplo, àquelas que por seus defeitos naturais seriam muito tentadas de orgulho, Deus concede pouca clareza nesse discernimento, a fim de que não repousem sobre si, e sejam obrigadas a rezar muito para poder ver com clareza como se conduzir, bem como a consultar e a seguir a direção espiritual de um outro homem, que tem mais discernimento do que elas.

De fato, nos casos em que as certezas são tênues, ou em casos de dúvida, Deus completa essa noção por meio da abalizada orientação de diretores espirituais.

A ação do Espírito Santo nas almas

Quando posso ter confiança de que meus pedidos serão ouvidos por Deus?

É precisamente quando, por efeito de uma graça interior de discernimento, tenho certeza de que minha solicitação corresponde aos caminhos traçados por Deus a meu respeito. Então devo pedir com toda confiança, porque Deus quer me conceder o que Lhe rogo.

Há, evidentemente, outros meios de comprovar qual é o caminho que Deus escolheu para mim: são certos sinais e circunstâncias que confirmam a certeza interior inicial. A confiança adquire então um fundamento lógico, e a promessa de que nossa oração será atendida se aplica nesse caso estritamente.

As certezas quanto às vias de Deus nascem às vezes de revelações interiores como, por exemplo, no caso de Santa Joana d’Arc. Nascem também, por vezes, não de revelações, mas do conjunto de inspirações postas pelo Espírito Santo na alma. Santa Teresinha do Menino Jesus tinha certeza absoluta de que todas as suas irmãs seriam religiosas e rezava ardentemente para que o fossem, sem condicionar suas preces a outros desígnios de Deus, pois estava convicta de estar pedindo o que Deus queria dar. Esta é a fé que move montanhas, tanto no primeiro caso, como no segundo.

Essas certezas interiores, quando são obra da graça do Espírito Santo, revelam-se tão fortes que não são passíveis de dúvida.

Em outros campos da vida espiritual elas também se manifestam, como por exemplo naquele famoso episódio de São Mauro, discípulo de São Bento, que em certa ocasião caminhou sobre as águas por ordem do abade para salvar o menino Plácido que estava se afogando. Uma ação especial da graça, por meio de imponderáveis, lhe disse no interior da alma que ele devia seguir o caminho da obediência naquela circunstância. Foi tal a eloqüência da voz interior, que não titubeou um instante, e inclusive operou um prodígio.

Essa é a fé que move as montanhas.

Sentir os “imponderáveis” e ouvir as vozes interiores

É preciso estar atento a esse instinto interior que nos mostra o que a Providência quer nos conceder em concreto. Pois Deus tem caminhos muito diferentes para as almas.

Santa Teresinha do Menino Jesus, por exemplo, tinha como propósito “nada pedir e nada recusar”. Ora, ela que tinha essa praxe, é a Santa que mais atendeu pedidos, cumprindo seu projeto de passar o Céu derramando sobre a Terra uma chuva de rosas. Sua via espiritual era de nunca pedir nada, mas ela estimulava as pessoas a que pedissem.

Não estava na via de Santa Teresinha fazer o que Santa Escolástica fez. Esta soube, por revelação, que a morte de São Bento estava próxima. Certo dia em que o Abade a visitou, insistiu com ele que não fosse embora mas permanecesse ainda algum tempo conversando. São Bento foi terminante e decidiu se retirar. Ela então rezou, e uma tempestade tremenda impediu que São Bento a deixasse.

Há muitas mansões na Casa do Pai Celeste. Compete à alma discernir sua própria via, e pedir as graças que Deus quer lhe conceder.

Mas é preciso considerar que há um certo lusco-fusco, ao qual Deus nos quer deixar sujeitos, e que torna possível um engano na interpretação dessa voz interior.

Foi o que se deu com Santa Joana d’Arc. Por tudo quanto se diz da sua vida, parece que ela não imaginava morrer queimada, como término normal de sua carreira. É frisante, nesse sentido, em certa ocasião ela ter saltado da torre onde estava presa, para tentar fugir, chegando mesmo a se machucar. Ela não compreendeu, mas resignou-se à vontade de Deus, o que é o mais importante.

Esses lusco-fuscos existem, e é preciso nos habituarmos a eles.

Geometrizar a vida espiritual, ou nos enervarmos com ela, é agir contra o regime estabelecido por Deus.

Por outro lado, se é verdade que interiormente posso me enganar, como no caso de Santa Joana D’Arc, não quer isso dizer que não devo confiar no que me é dado conhecer interiormente sobre o meu caminho. Meu diretor espiritual pode se equivocar em relação a mim, mas isso tampouco quer dizer que a direção espiritual não valha nada. Essa alternativa, infalibilidade ou zero, está evidentemente fora da linha da Providência.

A boa oração é sempre respondida

Esses princípios, quando aplicados à oração para obter bens materiais, ensinam-nos que é preciso ter confiança de que seremos atendidos quando há razões ponderáveis para julgar que o que pedimos é bom e conforme à vontade da Providência.

E se fizermos nosso pedido a Deus, em maneira condicional — que é como deve ser — e Deus não nos atender, saibamos que nos dará qualquer outra coisa. Pois nossa oração nunca ficará sem ser atendida, mas nos trará algum benefício, que inclusive pode ser maior do que o solicitado por nós.

Devemos imitar São Paulo que, quando pediu a Deus a libertação das tentações que sofria, o fez com a predisposição de aceitar a vontade de Deus de não atendê-lo e mantê-lo exposto à vexação para o bem de sua alma. (Revista Dr. Plinio, Março/2004, n. 72, p. 26 a 30).

 
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