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Plinio Corrêa de Oliveira


O “Legionário”, arma de batalha pela Igreja
 
PUBLICADO POR ARAUTOS - 01/08/2019
 
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Durante duas décadas, o “Legionário” foi para Dr. Plinio excelente tribuna de defesa dos princípios católicos e valioso instrumento de ação apostólica. Numa conferência para jovens alunos, abaixo transcrita, ele descreve como idealizou as modificações necessárias para o jornal atingir esse objetivo.

Ia dar um balanço [da situação] em que então me encontrava, com referência às possibilidades de desenvolver um apostolado frutuoso. Quais eram [os fatores] positivos e quais os negativos.
Como estava o projeto de Ordem de Cavalaria, que era o centro de tudo. Era o centro de tudo, não como um fim em si, mas como instrumento mais idôneo e eficaz para conseguir o que eu queria: a Contra-Revolução¹.

O primeiro desses meios era o “Legionário”. Podia ser considerado debaixo de dois pontos de vista. Em primeiro lugar, como publicação. Em segundo lugar, como meio de recrutamento de elementos para o nosso grupo.

Mudança no “Legionário”, inspirada em jornal francês

Vamos tratar do “Legionário”, que era o que publicávamos naquele tempo, e que portanto tem mais relação com a história desse tempo. Era um jornal a respeito de cuja influência ou maneira de ação eu tive muitos esclarecimentos analisando um jornal chamado “Sept”, quinzenário francês mais ou menos com tantas páginas quanto o “Legionário”.

Era organizado de um modo muito vivo, com uma paginação muito atraente, tratando de temas muito atuais. Por causa disso, apesar de ser um simples jornalzinho, com poucas páginas — não era revista, circulava na França e na Bélgica daquele tempo, e nem me lembro bem se o jornal era francês ou belga — mas com garra! Intervinha nos acontecimentos, influenciando. Numa palavra, tratava de tudo quanto havia de mais candente e delicado.

Até então, o “Legionário” tinha uma certa tendência para se dirigir ao grande público, no interesse de conquistá-lo. Era escrito, em parte, para converter para a religião católica aqueles que não  eram católicos, em parte para afervorar e orientar os que já eram católicos. Lendo o jornal “Sept”, compreendi que isso estava errado, pois um jornal de pequeno formato ou de pequeno tamanho, ou devia dirigir-se para um público especial, influente e não pequeno, e através desse público influenciar todo o conjunto, ou não adiantaria para nada.

O “Legionário”, então, deixou de ser um jornal feito para converter os não-católicos, e passou a um jornal destinado a orientar os católicos. E não quaisquer católicos em geral, mas os do Movimento Católico.

O Movimento Católico

O Movimento Católico era constituído naquele tempo pelos católicos mais fervorosos, que iam sempre à Missa aos domingos, e que em geral pertenciam a associações religiosas. Chamava-se movimento, porque era um conjunto de pessoas que dedicava uma parte de seu tempo, ou todo o seu tempo, a favorecer por sua atuação a Igreja Católica, a expansão da Fé. Tinha um número muito grande de pessoas.

Deputado mais votado na eleição de 1934, Dr. Plinio compreendeu que uma importante atuação sobre o público católico que o elegeu seria o modo ideal de influenciar o conjunto dos acontecimentos no Brasil

O resultado de minha eleição, em 1934, exprimia bem isso. Fui eleito por essa gente. Eram muitas pessoas, muito unidas, dirigidas por um clero ortodoxo e muito coeso, um episcopado evidentemente muito católico e firme, e um Arcebispo que dirigia com energia, em cujo brasão estava este lema: “Ipse firmitas et autoritas mea” (Minha firmeza e minha autoridade é o próprio Cristo). E mandava!… Dom Duarte mantinha tudo isso coeso.

E eu entendi bem que, agindo sobre esse público, e orientando-o, teríamos uma possibilidade de influenciar o conjunto dos acontecimentos no Brasil. Transformei, então, o “Legionário” num órgão especializado para o Movimento Católico. Não tinha por fim ajudar os católicos a converter não-católicos, mas formar sua mentalidade.

Objetivo: formar a mentalidade dos católicos

Quem tomasse outras revistas católicas e as folheasse, veria que tratavam mais ou menos de tudo: uma notazinha sobre missões no Tocantins; outra informando que morreu um Bispo em Estocolmo; mais adiante, uma notícia de que foi lançada uma missão nova entre os esquimós e que os primeiros foram batizados, etc. Coisas apreciáveis… mas com isso não se formava a mentalidade de uma pessoa.

A formação da mentalidade comportava, na nossa concepção, algumas características. Aqui no Brasil, em geral, dá-se um fato que eu costumo explicar da seguinte maneira: os outros povos crêem na verdade da Religião Católica, quando são tais; o brasileiro não crê, ele sabe que a Religião Católica é verdadeira. Ele crê, porque pesca no ar. Intui. É muito raro ver-se um brasileiro dar uma argumentação contra a Igreja Católica. Se a vida dele não é compatível com a Fé, e não quer emendá-la, abandona a Religião Católica. Quando pensa em converter-se, não vai refletir para escolher qual a religião verdadeira, pois já sabe que é a católica. De maneira que, quando ele volta, regressa ao Catolicismo. Fé, graças a Nossa Senhora, naquele tempo ainda era muito estável, entre os católicos que pertenciam ao Movimento Católico.

Nós não tratávamos de afervorar um indivíduo sob esse ponto de vista, mas tínhamos a idéia de que o modo pelo qual um indivíduo podia ser extraviado da doutrina católica era no que dizia respeito à apreciação da sociedade temporal, das finalidades, da razão de ser desta. E, neste ponto, mesmo os católicos mais fervorosos tinham idéias esquisitas.

Era preciso fazer lentamente uma apreciação dos acontecimentos que fosse mudando as mentalidades numa determinada direção. Mas, que acontecimentos? E em que direção? A política brasileira, considerada de um modo geral, tinha muito pouco conteúdo ideológico. Mesmo as correntes representantes de algo que era possível defender ideologicamente, não tinham vontade de fazer uma defesa ideológica. O brasileiro tem preguiça de raciocínios de caráter ideológico.

Por outro lado, nosso povo, que é tão cordato e tão amigo de ser amigo, é muito sensível. Qualquer ataque ao interesse político de alguém, deixá-lo-ia num ressentimento único. Isso, para o “Legionário”, seria muito incômodo, muito desagradável. 

O jeito era preocuparmo-nos preponderantemente com a política exterior. E com o motivo de cuidar da política dos outros países, formar as mentalidades dos leitores sobre as grandes idéias que havia fora do Brasil.

Através dos fatos, criar interesse pela doutrina

Uma nota muito acentuada do “Legionário” passou a ser, então, a tomada de posição a respeito de questões internacionais. Não estavam incluídas as relações do Brasil com outros países — que eram muito tranqüilas e sem interesse —, mas os problemas internos das outras nações, sobretudo na Europa.

Por que Europa? Porque pela sua cultura multissecular, pela inteligência e pela instrução de seus filhos, mesmo de partidos que execrávamos, davam um tom à vida política que era de pensamento e de ideologia. Esse tom ideológico, nos interessava comentar.

No centro da perspectiva do mundo contemporâneo estava a Revolução Francesa, exatamente o fato que divide a História, dando fim aos Tempos Modernos e começo aos Contemporâneos.

Quem prestar atenção, perceberá que muito disso ainda existe entre nós. Por exemplo, vêem bem a importância da Reunião de Recortes² na nossa vida. Se ela fosse extinta, ficaríamos reduzidos a um terço ou à metade de nossa vitalidade.

Um modo de ensinar poderia ser: fazer artigos abstratos ou teóricos. Um outro modo seria noticiar os fatos e analisá-los e, a propósito destes, dar doutrina. Interessar na doutrina através dos  fatos. Foi o sistema adotado pelo “Legionário”, e que até hoje é o nosso sistema de raciocinar. É um dos fatores que torna a Reunião de Recortes tão importante, e tão característica.

Coerência na idéias

Uma outra característica do “Legionário”, sob esse ponto de vista, era a seguinte:

As idéias do tempo faziam com que a disputa ideológica fosse compreendida apenas no que diz respeito a assuntos políticos, sociais e econômicos. O “Legionário” abriu muito mais o leque. Demonstrou que esses assuntos e essas preferências religioso-filosóficos, sócio-político-econômicos podem manifestar-se em tudo: na forma de um lustre, na cor de um vaso, no modo de ser de um tecido, nos desenhos ou ornatos de um prato ou de um copo, no sabor de uma comida ou de uma bebida… Tudo é portador de uma preferência nesses assuntos.

Portanto, o que cumpre fazer, mais do que tudo, é saber mostrar que não tem uma opção inteiramente correta quem é, digamos, pró-medievalista (no sentido amplo em que tomo a palavra) em matéria sócio-político-econômica, e, ao mesmo tempo, detesta o gótico e gosta da arte moderna. Não pode ser. Este está em contradição consigo. O homem não tem o direito de ser contraditório, mas deve ser coerente.

De maneira que o “Legionário” fazia aquilo que, hoje, se chamaria uma contra-revolução cultural. Por revolução cultural se entende exatamente isto: uma revolução que não é apenas política, mas que envolve uma total transformação em toda a mentalidade, modos de ser e ambiente que cerca o homem.

A contra-revolução cultural é a contra-revolução sofística mais a contra-revolução tendencial; somadas, elas constituem um todo. Então, nesta amplitude temos a noção, a idéia de que a Revolução e a Contra-Revolução abrangem todo o pensamento humano. E que, ou um homem é totalmente uma coisa, ou ele não é nada.

Tudo quanto há de bom na sociedade humana vem da Igreja Católica

Outra coisa que era muito marcada na orientação do “Legionário” era a seguinte: tudo quanto há de bom na sociedade humana vem da Igreja Católica.

É um erro condenado pela Igreja a afirmação de que, sem apoio da religião, o homem nada faz de bom. O pecado original atingiu, vulnerou a fundo a natureza humana, mas não tão fundo que um homem com as suas simples forças naturais não possa praticar várias ações boas, independente da religião. Mas, sem auxílio da graça, o homem não pode se manter, estável e duravelmente, na prática dos dez Mandamentos.

Segundo ponto: se, numa determinada sociedade se torna habitual que a população viole um ou mais Mandamentos, esta sociedade está caminhando para o seu declínio. Não há remédio. A ordem humana perfeita decorre do cumprimento dos Mandamentos. E se estes não foram cumpridos, esta vai água abaixo. É uma questão de mais ou menos tempo…

Terceiro: pelo contrário, se a sociedade humana toda — salvo as exceções baixas, que sempre há — cumprir estavelmente os dez Mandamentos, a sociedade sobe a um píncaro maravilhoso. Ainda que seja um pequeno país sem recursos econômicos e pobre, se o seu povo tiver muita Fé, sobe, na ordem temporal, ao mais alto grau que lhe é possível.

Mais ainda: quanto mais uma sociedade subir na ordem temporal — pela cultura, pela riqueza ou por qualquer outro fator — tanto mais lhe será necessário cumprir bem os Mandamentos e amar a Deus. Porque essas qualidades naturais, se não forem encaminhadas pela virtude e pela prática habitual dos dez Mandamentos — prática, tanto melhor quanto mais fervorosa — os próprios fatores de grandeza precipitarão sua queda. Quer dizer, a podridão intelectual dos países muito intelectualizados, quando deixam a Fé, é tão alucinante e tremenda, que tende com todo o seu
peso para levá-los a desatinos. (Revista Dr. Plinio, Abril/2003, n. 61, pp. 26 a 30).

* penúltima foto: Dr Plinio ao centro da foto, numa homenagem do “Legionário” aos congregados marianos.
* última foto: Dr. Plinio (de pé, no centro) e Da. Lucilia (sentada à direita de Dom Duarte), por ocasião da inauguração das novas máquinas do “Legionário”

Notas: 
1) Este termo deve ser entendido no sentido empregado por Dr. Plinio em “Revolução e Contra-Revolução”.
2) Reunião semanal, baseada em notícias recortadas de jornais, na qual Dr. Plinio analisava os acontecimentos mundiais à luz dos ensinamentos do Magistério da Igreja.

 
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