Fale conosco
 
 
Receba nossos boletins
 
 
 
Artigos


Plinio Corrêa de Oliveira


Primeiros anos em Pirassununga
 
PUBLICADO POR ARAUTOS - 21/01/2020
 
Decrease Increase
Texto
Solo lectura
0
0
 

Foi em 1873 que Dr. Antônio se estabeleceu com a família em Pirassununga, a fim de ali exercer a advocacia. Nomeado promotor da comarca de Belém do Descalvado, que então incluía Pirassununga, habilitou-se depois ao cargo de juiz de direito, mas preferiu não seguir carreira, talvez por questões de política local. Outro motivo que o atraiu àquela região foram as terras que Dª Gabriela, sua esposa, herdara do pai, situadas em Rio Claro, São Paulo.

O jovem casal Gabriela e Antônio
Ribeiro dos Santos. O pai de Dona
Lucilia logo se tornou benquisto na
região,  por seus préstimos
advocatícios e, sobretudo, pelo
brilho de sua personalidade

Um Far West brasileiro…

Cidade tão próspera e dinâmica em nossos dias, a Pirassununga daqueles tempos idos era um pólo de coloniza ção cuja exploração metódica datava de há pouco, na qual a civilização penetrava apenas lentamente. Só alguns anos depois do nascimento de Dª Lucilia, a localidade passou a ser servida por um ramal de estrada de ferro. As características daquele sertão eram as de um Far West brasileiro, onde o policiamento ia rareando à medida que 1se adensava a mata virgem.

Décadas mais tarde, ao contar as recordações de infância, Dª Lucilia ainda deixará transparecer a impressão que lhe causava o grande contraste entre a atmosfera da sociedade paulista e aquele ambiente tão primitivo e campestre, que ia disputando espaço à mata tropical, quase tão inculta como no período em que o Padre Anchieta percorria as vastidões do Brasil.

As casas, por exemplo, eram desprovidas de assoalho, sendo o chão simplesmente de terra batida. Mesmo as residências das notabilidades locais não escapavam à regra. A primeira moradia a ter vidraças nas janelas foi a dos Ribeiro dos Santos, considerada, por isso mesmo, de luxo, já que as outras possuíam apenas folhas de pau.

Elevação e beleza no ambiente campestre

Naquele meio agreste e monótono do interior, o nobre e jovem casal Ribeiro dos Santos estabeleceu-se com coragem, decidido a prosperar. A presença de Dª Gabriela introduzia uma nota de elevação e de beleza no ambiente de simplicidade campestre da pequena cidade.

Dr. Antônio tornou-se desde logo benquisto na região. Pessoas de todas as classes procuravam-no, atraídas pelo brilho de sua personalidade e pela sua arte de conversar. Era o que invariavelmente acontecia, por exemplo, quando ele viajava naqueles trens de outrora.

Na serena Pirassununga de outrora, a casa de Dona Lucilia (à direita, na esquina do poste)

Estes paravam em cada estaçãozinha, demorando-se nelas certo tempo. Os homens desciam para tomar um cafezinho, e as notabilidades do lugar estavam muitas vezes presentes, acompanhadas de seus familiares, na expectativa de encontrar alguém importante que pudesse contar as últimas novidades da política ou trazer interessantes notícias.

Pois bem, quando Dr. Antônio chegava a algum lugar, formava-se um verdadeiro enxame de gente a seu redor, desejando desfrutar de sua companhia. Situação tão favorável adquiria, aos olhos de sua filha Lucilia, contornos luminosos.

A velha matriz da cidade

Sossego e monotonia da vida do interior

Havia um aspecto da pacata Pirassununga que agradava deveras à jovem Lucilia: era precisamente a calma. Ela nunca tomou gosto pela agitação da vida moderna, e várias vezes se referia de forma comprazida à tranqüilidade do interior. Elogiava a regularidade da vida, bem como a dignidade das pessoas dentro do sossego, ao comentar fatos locais que revelavam a íntima consonância de sua ordenada alma com a natural serenidade da atmosfera que a rodeava.

Mas, ela sentia também, e muito, o peso da monotonia daquelas longínquas paragens. Referia-se ao vazio da cidadezinha, especialmente em alguns intermináveis domingos, durante os quais até os ruídos da vida quotidiana cessavam pelo fato de ninguém sair de casa. Quando um cachorro ladrava, o som do seu latido percorria os espaços vazios sem encontrar nenhum anteparo, nenhum obstáculo. Toda a cidade, de um extremo ao outro, ficava “transparente” a qualquer som e apenas pulsava de vida vegetativa, como se nada mais ali houvesse…

Retidão admirativa de uma alma justa

O sossego da pequena Pirassununga, a que nos referimos, muito ajudava a jovem Lucilia a observar com atenção e enlevar-se pelos mais velhos. Sua capacidade de admirar os predicados alheios tinha origem na virginalidade de alma, que ela soube manter intacta. Com efeito, Dª Lucilia sempre se conservará fiel, até seus últimos dias, àquele notável senso admirativo, àquele modo primevo e rico de considerar os fatos e as criaturas com que a inocência envolve a infância de todos os cristãos.

Fórum de Pirassununga, onde Dr. Antônio advogava

Quando ainda jovem, ao contemplar as qualidades de alma dos que compunham seu ambiente, com instintiva naturalidade as mitificava tanto que chegava a afastar suas sempre bem-intencionadas vistas de tudo o que neles pudesse não ser virtude. Os senões que encontrava na conduta das pessoas, reputava-os exceção. Era como se num belo lenço de seda houvesse pequenos furos. Porém, o resto era seda muito boa…

Dona Lucilia menina

Esse modo de considerar a realidade, pelo qual a todos situava numa clave de seriedade, distinção e grandeza estava muito presente em todas as narrações dela, procurando transmitir uma ideia arquetipizada da vida e do convívio entre os homens.

Evidentemente, foi assim que o sereno olhar de Lucilia se voltou para seus pais, verdadeiras e luminosas imagens de Deus, naquele seu primeiro despertar para a vida.

Que influência tiveram eles em sua formação?

A resposta não é difícil, para quem teve a ventura de ouvi-la reviver — naquela voz clara, melodiosa e um tanto solene, que constituía um dos encantos de sua companhia — fatos ocorridos com seus queridos progenitores, dos quais tomaremos conhecimento em próximos artigos. (Transcrito, com adaptações, da obra “Dona Lucilia”, de Mons. João S. Clá Dias).(Revista Dr. Plinio, Outubro/2005, n. 91, p. 6 a 9).

 
Comentários