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Plinio Corrêa de Oliveira


Uma prefigura do Céu
 
PUBLICADO POR ARAUTOS - 15/08/2019
 
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Tema sobremaneira grato a Dr. Plinio era a consideração da sociedade enquanto cumprindo a Lei de Deus e, por isso mesmo, constituindo um conjunto harmônico capaz de refletir adequadamente o Criador. Como veremos a seguir, dentro dessa temática salientava ele, de modo especial, a importância da tendência à perfeição — um dos mais belos frutos da ação da graça na alma do homem.

Se todos os homens cumprissem os dez Mandamentos, grande número das leis se evaporaria por desnecessidade, e o mundo seria perfeito.

Santo Agostinho, grande Doutor da Igreja que viveu ainda antes da queda do Império Romano do Ocidente, tem esta famosa sentença: “Imaginai um país onde o rei e todo o povo cumpram os dez Mandamentos; imaginai um lar onde o pai, a mãe e também todos os filhos cumpram os dez Mandamentos; imaginai uma escola onde todos os professores e todos os alunos cumpram a Lei de Deus na sua integridade; imaginai o mesmo se dando com todos os oficiais e soldados de um exército; imaginai, enfim, os dez Mandamentos observados em qualquer campo da atividade humana. Existiria uma coisa chamada perfeição. A organização social tornar-se-ia exímia e tenderia a ser perfeita. Enquanto os Mandamentos fossem cumpridos, os frutos seriam os melhores, os mais excelentes, os mais magníficos. Isto é a ordem.”

Pela ação da graça, o homem tende ao mais perfeito

Essa ordem foi levada à sua plenitude por Nosso Senhor Jesus Cristo, e Ele deu aos homens a força necessária para pô-la em prática. Os dez Mandamentos são muito bonitos, empolgam. Cada um deles é lindíssimo: “Não matarás… Amarás a Deus sobre todas as coisas… Não tomarás seu santo nome em vão”, etc. O homem começa a cumpri-los, e sente como são belos. Daí a algum tempo, porém, que peso! Porque não é fácil observá-los. A tal ponto que a Igreja nos ensina não sermos capazes de obedecê-los duravelmente, sem o apoio da graça de Deus.

Ora, Deus concede essa graça a todos os homens, e por causa disso todos têm a possibilidade de cumpri-los. Sendo assim, o movimento natural de todas as coisas é para cima, para o alto, para a perfeição. E essa tendência, própria à alma cristã, de fazer tudo de maneira excelente, desde o mais insignificante até o mais elevado, marca um homem: na sua cortesia, no modo de dobrar uma folha para pô-la num envelope, no modo de dizer “sim” ou “não”, no jeito de se levantar, de se sentar e de andar — tudo deixa transparecer uma inclinação para a perfeição.

Essa tendência é tal que o homem procura levá-la até o ápice do concebível por ele. Quer dizer, não intenta apenas o perfeito, mas o perfeitíssimo. Ele quer se unir a Deus no Céu.

Uma sociedade precursora do Céu empíreo

Para termos idéia de como essa excelência é alcançável na Terra, imaginemos um ambiente onde toda a conversa seja marcada pela presença da fé, numa atmosfera ao mesmo tempo leve e séria, amena e forte, onde as pessoas saibam tratar de qualquer assunto, até dos menores, de maneira aprazível e profunda.

Situemos neste ambiente, por exemplo, o rei Felipe II da Espanha (a quem costumo chamar de “o Felipão”). Sem querer afirmar que tenha sido um santo, há nele algo denotativo de uma fé que comunicava àquela alma uma grandeza, uma compenetração, uma largueza de vistas, uma profundidade de horizontes, uma firmeza de decisão extraordinária. Consideremos a ele como um analogado primário de todos os homens sérios de seu reino, e que em cada casa de família que se entrasse, por mais alta ou mais modesta que fosse, o pai seria uma reedição do “Felipão”.

Que estabilidade, que segurança, que recolhimento, que compenetração no ambiente em torno desse homem! Os filhos lhe vêm falar num tom de voz baixo, fazem-lhe confidências ou pedem instruções. E ele, às vezes, fora das horas de convívio, responde-lhes apenas por uma meia palavra, porque está pensando, rezando, lendo ou escrevendo algo de muito elevado…

Quando fiel à sua tendência para a perfeição, o homem procura o ápice da excelência concebível por ele, desejando se unir com Deus no Céu (“Juízo Final”, detalhe, por Giotto)

Agora imaginemos a mãe, partícipe das qualidades de Nossa Senhora, Mater Misericordiae, temperando pela presença dela o que pode haver no pai de, digamos, grandeza assombrosa. Ela tem a chave do coração dele, sabe lhe dizer a palavra necessária para criar o melhor relacionamento possível entre ele e os filhos. E ela o faz com uma abundância de misericórdia, uma majestade, uma perfeição de sorriso que torna uma humilde trabalhadora em rainha da casa, assim como pode tornar uma rainha em mãe trabalhadora, afável e condescendente com os seus filhos. Pensemos depois nos filhos compenetrados desse ambiente. Eles também, a seu modo, verdadeiros anjos nesta imagem da corte celeste que é a família. Pois do mais velho até o último, estão dispostos numa hierarquia de irmãos parecida com a ordem dos anjos.

Compreende-se que nada pode ser aprazível como esta casa. E se alguém me dissesse: “Dr. Plinio, na Ilha de Marajó, perto de Belém do Pará, existe uma família que é igual a essa descrita pelo senhor” — eu iria visitá-la, sem hesitações. Se me oferecessem a alternativa de viajar à Europa para rever a Sainte Chapelle, a catedral de Toledo e quantas outras maravilhas, ou de me encontrar com esta família no norte, eu preferiria conhecê-la, ainda que ela vivesse nos pântanos da Ilha de Marajó, no meio dos bois. Eu iria e teria visto o que queria!

Ali está a casa-santuário, a casa-sacrário, que é a família católica perfeita!

Agora, imaginemos uma cidade onde toda a população que anda pelas ruas é assim, onde as pessoas se vêem e se cumprimentam com atenção, respondendo aos acenos discretamente, com pequenos sorrisos e amabilidades, e depois continuam seu caminho, deixando pela atmosfera um rastro de perfumes espirituais.

Do interior de uma casa com as janelas abertas ouve-se uma música segundo Deus, justa, temperante, prudente e forte. Mais adiante, percebe-se uma conversa, eventualmente uma risada cristalina, e se sente um aroma de pombo bem preparado.

Todas essas coisas produzem sobre nós algo do efeito que a ação dos anjos exercerá sobre as almas e os corpos quando estiverem no Céu empíreo. Em suma, toda essa sociedade assim formada seria já uma espécie de realidade precursora do Paraíso celestial. (Revista Dr. Plinio, Agosto/2003, n. 65. p. 20-21).

 
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