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Voz dos Papas


O tríplice desafio da vida consagrada
 
AUTOR: REDAÇÃO
 
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Responder de forma nova e radical às atuais provocações aos conselhos evangélicos de castidade, pobreza e obediência é um tríplice desafio que estimula a missão profética das pessoas consagradas.

A vida consagrada, profundamente arreigada nos exemplos e ensinamentos de Cristo Senhor, é um dom de Deus Pai à sua Igreja, por meio do Espírito. Através da profissão dos conselhos evangélicos, os traços característicos de Jesus – virgem, pobre e obediente – adquirem uma típica e permanente “visibilidade” no meio do mundo, e o olhar dos fiéis é atraído para aquele mistério do Reino de Deus que já atua na História, mas aguarda a sua plena realização nos Céus. […]

A missão profética da vida consagrada vê-se provocada por três desafios principais, lançados à própria Igreja: são desafios de sempre, colocados sob formas novas e talvez mais radicais pela sociedade contemporânea, pelo menos nalgumas partes do mundo. Tocam diretamente os conselhos evangélicos de castidade, pobreza e obediência, estimulando a Igreja, e de modo particular as pessoas consagradas, a pôr em evidência e testemunhar o seu significado antropológico profundo. […]

A resposta da vida consagrada
está na prática alegre da
castidade perfeita
São João Paulo II – Santuário
Nacional de São Tomé,
Chennai (Índia)

A alegria de praticar a castidade perfeita

A primeira provocação provém de uma cultura hedonista que separa a sexualidade de qualquer norma moral objetiva, reduzindo-a frequentemente ao nível de objeto de diversão e consumo, e favorecendo, com a cumplicidade dos meios de comunicação social, uma espécie de idolatria do instinto. As consequências disto estão à vista de todos: prevaricações de todo o gênero, geradoras de inúmeros sofrimentos psíquicos e morais para os indivíduos e as famílias.

A resposta da vida consagrada está, antes de mais, na prática alegre da castidade perfeita, como testemunho da força do amor de Deus na fragilidade da condição humana. A pessoa consagrada atesta que aquilo que é visto como impossível pela maioria da gente, torna-se, com a graça do Senhor Jesus, possível e verdadeiramente libertador. […]

É preciso que a vida consagrada apresente ao mundo de hoje exemplos de uma castidade vivida por homens e mulheres que demonstram equilíbrio, domínio de si, espírito de iniciativa, maturidade psicológica e afetiva. Graças a este testemunho, é oferecido ao amor humano um ponto de referência seguro, que a pessoa consagrada encontra na contemplação do amor trinitário, que nos foi revelado em Cristo.

Precisamente porque imersa neste mistério, ela sente-se capaz de um amor radical e universal, que lhe dá a força para o domínio de si e a disciplina necessária para não cair na escravidão dos sentidos e dos instintos.

A castidade consagrada apresenta-se assim como experiência de alegria e de liberdade. Iluminada pela fé no Senhor ressuscitado e pela esperança dos novos céus e da nova terra (cf. Ap 21, 1), ela oferece também preciosos estímulos para a educação da castidade obrigatória nos outros estados de vida.

Profissão ativa da pobreza evangélica

Outra provocação vem, hoje, de um materialismo ávido de riqueza, sem qualquer atenção pelas exigências e sofrimentos dos mais débeis, nem consideração pelo próprio equilíbrio dos recursos naturais.

A resposta da vida consagrada é dada pela profissão da pobreza evangélica, vivida sob diversas formas e acompanhada muitas vezes por um empenhamento ativo na promoção da solidariedade e da caridade. […] Através destas formas diversas e complementares, a vida consagrada participa da pobreza extrema abraçada pelo Senhor e vive a sua função específica no mistério salvífico da sua Encarnação e da sua Morte redentora.

Entre obediência e liberdade não há contradição

A terceira provocação provém daquelas concepções da liberdade que subtraem esta fundamental prerrogativa humana à sua relação constitutiva com a verdade e com a norma moral. Na realidade, a cultura da liberdade é um valor autêntico, ligado intimamente ao respeito da pessoa humana. Mas quem não vê as consequências monstruosas de injustiça e mesmo de violência, geradas na vida dos indivíduos e dos povos pelo uso deturpado da liberdade?

Uma resposta eficaz a tal situação é a obediência que caracteriza a vida consagrada. Esta apresenta de modo particularmente vivo a obediência de Cristo ao Pai e, partindo exatamente do seu mistério, testemunha que não há contradição entre obediência e liberdade.

Com efeito, o comportamento do Filho desvenda o mistério da liberdade humana, como um caminho de obediência à vontade do Pai, e o mistério da obediência, como um caminho de progressiva conquista da verdadeira liberdade. É precisamente este mistério que a pessoa consagrada quer exprimir com este voto concreto.

Com ele, deseja dar testemunho da sua consciência de um relacionamento de filiação, em virtude do qual assume a vontade paterna como alimento diário (cf. Jo 4, 34), como sua rocha, alegria, escudo e baluarte (cf. Sl 17, 3). Demonstra assim que cresce na verdade plena de si mesma, quando permanece ligada à fonte da sua existência, e deste modo oferece uma mensagem repleta de consolação: “Gozam de grande paz os que amam a vossa Lei, para eles não existe perturbação” (Sl 118, 165).

A obediência vivificada pela caridade unifica

Este testemunho das pessoas consagradas assume, na vida religiosa, um significado particular também por causa da dimensão comunitária que a caracteriza. A vida fraterna é o lugar privilegiado para discernir e acolher a vontade de Deus e caminhar juntos em união de mente e coração.

A obediência, vivificada pela caridade, unifica os membros de um instituto no mesmo testemunho e na mesma missão, embora na diversidade dos dons e no respeito da individualidade própria de cada um. Na fraternidade animada pelo Espírito Santo, cada qual estabelece com o outro um diálogo precioso para descobrir a vontade do Pai, e todos reconhecem em quem preside a expressão da paternidade divina e o exercício da autoridade recebida de Deus ao serviço do discernimento e da comunhão.

De modo particular, a vida de comunidade é o sinal, para a Igreja e para a sociedade, daquele laço que provém de um chamamento igual e da vontade comum de Lhe obedecer, para além de qualquer diversidade de raça e de origem, de língua e de cultura. Contra o espírito de discórdia e de divisão, a autoridade e a obediência resplandecem como um sinal daquela única paternidade que vem de Deus, da fraternidade nascida do Espírito, da liberdade interior de quem se fia de Deus, não obstante os limites humanos daqueles que O representam.

Através desta obediência, por alguns assumida como regra de vida, é experimentada e anunciada, em benefício de todos, a bem-aventurança prometida por Jesus a quantos “escutam a Palavra de Deus e a põem em prática” (Lc 11, 28). Além disso, quem obedece tem a garantia de estar verdadeiramente em missão no seguimento do Senhor, e não ao sabor dos desejos pessoais ou das próprias aspirações. E, assim, é possível considerar-se guiado pelo Espírito do Senhor e sustentado, mesmo no meio de grandes dificuldades, pela sua mão segura. (Revista Arautos do Evangelho, Julho/2018, n. 199, p. 6-7)

São João Paulo II. Excertos da Exortação apostólica Vita consecrata, 25/3/1996

 
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