Hoje a Igreja celebra a memória litúrgica do Imaculado Coração de Maria. É uma celebração significativa, pois trata-se do Coração de Mãe. Mãe do Filho de Deus feito homem.

Mãe da humanidade redimida pelo seu Filho na Cruz. Mãe da Igreja, como proclamou o Papa Paulo VI, no final da segunda sessão do Concílio Vaticano II. Mãe dos sacerdotes.

A propósito, o Beato João Paulo II recordou que aquele discípulo que estava ao pé da Cruz e acolheu Nossa Senhora como mãe era um Apóstolo de Jesus, portanto um sacerdote. Se Nossa Senhora é Mãe de todos os cristãos, de todos os discípulos de Jesus, Ela o é de modo especial dos sacerdotes.

A razão do celibato sacerdotal

Prezados ordenandos, eu creio que as palavras do profeta Isaías, que ouvimos na primeira leitura desta Missa, iluminam a vossa ordenação sacerdotal.

Diz o profeta: “Exulto de alegria no Senhor, minha alma se rejubila em Deus; Ele me vestiu com as vestes de salvação, envolveu-me com o manto da justiça e adornou-me como um noivo com sua coroa” (Is 61, 10).

Estas palavras expressam a gratuidade e a beleza do amor de Deus para com Israel. Mas elas podem exprimir também a gratuidade e a beleza de seu amor para conosco.

De fato, a vocação sacerdotal só se explica a partir da gratuidade do amor de Deus, da beleza desse amor. Ele confia em nós e nos dá uma missão.

“Exulto de alegria no Senhor”. O dia da ordenação presbiteral é um dia de muita alegria. Júbilo não só interior, mas também exterior, que eu vejo estampado em vossas faces. Alegria que envolve toda a liturgia que estamos celebrando: os ritos, as orações, os cantos.

“Adornou-me como um noivo com a sua coroa”. À semelhança do Bispo, que pela ordenação se torna esposo da Igreja, também o presbítero, pela ordenação se torna esposo da Igreja. Por isso deve dedicar à Igreja toda a sua vida, todo o seu amor.

E aqui se encontra a razão do celibato sacerdotal. Não é um celibato qualquer. Não é uma simples ascese. Trata-se de um celibato evangélico. Através do celibato, o estilo de vida do sacerdote identifica-se com o estilo de vida de Cristo.

Embaixador de Cristo e administrador dos mistérios de Deus

Da segunda leitura desta Missa, quero sublinhar duas afirmações do Apóstolo Paulo. Primeira: “Somos embaixadores de Cristo” (II Cor 5, 20).

O sacerdote é embaixador de Cristo, seu representante, seu vigário. O embaixador não pronuncia a sua mensagem, mas sim a daquele que o enviou. Por isso mesmo, o sacerdote não deve anunciar as suas opiniões pessoais, mas a palavra de Deus, a palavra de Cristo.

Mas o embaixador de Cristo é também administrador dos mistérios de Deus, ou seja, dos bens salvíficos que são os Sacramentos. E dois Sacramentos são confiados de modo muito especial aos cuidados do sacerdote: o da Eucaristia e o da Reconciliação.

O sacerdócio ministerial, que reveste o Bispo e o presbítero, foi instituído na Última Ceia com a Eucaristia e em vista da Eucaristia. Com as mesmas palavras com as quais Cristo instituiu a Eucaristia, Ele instituiu também o sacerdócio ministerial: “Fazei isto em minha memória”.

A fonte da espiritualidade do sacerdote

Por isso mesmo a Eucaristia deve ocupar o centro da vida do sacerdote. Ele não pode deixar de celebrá-la cada dia. E deve também ser a fonte da sua espiritualidade.

O Beato João Paulo II, em sua última Carta aos Sacerdotes por ocasião da Quinta-Feira Santa, assinada por ele num leito de hospital, afirma que a fonte da espiritualidade do sacerdote são as palavras pronunciadas por Jesus na Última Ceia, as quais o sacerdote repete em cada celebração da Eucaristia.

Recordemos essas palavras tão belas e misteriosas: “Tomou o pão em suas mãos e deu graças”.

Componente, pois, da espiritualidade do sacerdote, deve ser uma ação de graças contínua, cada dia, a cada momento, pelo dom da vocação.

“Isto é o meu corpo por vós entregue. Este é o cálice do meu sangue por vós derramado”. O sacerdote precisa ser uma hóstia, consumir a sua vida cotidianamente pelo bem da Igreja e dos irmãos.

O sacerdote abre as portas da misericórdia divina aos pecadores

O outro Sacramento confiado de modo especial ao cuidado do sacerdote é o da Reconciliação. Como ministro deste Sacramento, ele abre as portas da misericórdia divina aos pecadores.

Mas não podemos nos esquecer, queridos ordenandos: o sacerdote não é só ministro deste Sacramento, é também sujeito dele. E por isso deve, com frequência, aproximar-se do Sacramento da Confissão.

Esta aproximação frequente do Sacramento da Reconciliação faz com que o sacerdote seja honesto consigo mesmo; faz com que ele não se instale nos seus erros, mas cada dia se esforce para superar todos os seus erros, todas as suas limitações; faz com que ele seja misericordioso para com os irmãos.

O sinal de amor do sacerdote por Cristo é apascentar o rebanho 

Eu creio que a pergunta de Cristo registrada no Evangelho que acabamos de ouvir, serve de conclusão para esta nossa reflexão: “Não sabeis que devo estar na casa de meu Pai?” (Lc 2, 49).

É interessante observar que esta é a primeira palavra de Jesus registrada no Evangelho. E a primeira vez que Ele fala no Evangelho é para referir-se ao seu Pai. Que coisa maravilhosa! 

“Estar na casa do Pai” significa cuidar das coisas de Deus. O sacerdote é ordenado, não para cuidar das coisas do mundo, não para ser político, ser economista, ser cantor e dar shows.

Ele é ordenado para estar na casa do Pai, cuidar das coisas de Deus, anunciar a sua Palavra, celebrar a Eucaristia, ouvir as confissões dos fiéis, cuidar do rebanho que lhe é confiado.

Aliás, o rebanho confiado a cada sacerdote não lhe pertence, pertence a Cristo que é o único Pastor. Por isso disse Ele a Pedro: “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21, 17).

E o sinal do amor de Pedro por Cristo foi justamente apascentar o rebanho. O sinal principal do amor de cada sacerdote por Cristo é apascentar o rebanho que lhe é confiado.

Prezados ordenandos, o Coração Imaculado de Maria, cuja memória litúrgica estamos celebrando, é uma fonte de graças para toda a Igreja. Por isso ela a celebra cada ano.

Que o Imaculado Coração de Maria, pois, vos dê um coração sacerdotal semelhante ao coração de seu Filho: coração humano, coração puro, coração misericordioso, coração santo. Amém.

 

Excerto da Homilia na Missa de ordenação presbiteral celebrada na igreja do Seminário dos Arautos, Caieiras, Grande São Paulo, 2/7/2011.