No precioso legado de São Marcelino aos Irmãos Maristas, destaca-se seu sapiencial método pedagógico, uma das mais perfeitas expressões de sua vocação.

O bom exemplo do mestre

Como pressuposto para o êxito da missão do Instituto, julgava ele primordial a compenetração de seus discípulos no sentido de serem verdadeiros educadores, e não meros transmissores de conhecimentos:

Queremos educar as crianças, isto é, instruí-las sobre seus deveres, ensinar-lhes a praticá-los, infundir-lhes o espírito e os sentimentos do Cristianismo, os hábitos religiosos, as virtudes do cristão e do bom cidadão.[1]

E fazia uma interessante analogia entre o cultivo do solo e a importância da educação infantil:

Por melhor que seja um terreno, se permanecer inculto não produzirá senão espinhos e abrolhos. Da mesma forma, por melhores que sejam as disposições de uma criança, se lhe faltar a educação crescerá sem virtudes e sua existência será nula para o bem.[2]

Considerava como elemento imprescindível para a eficácia dessa missão o respeito mútuo entre aluno e professor e, sobretudo, o bom exemplo do mestre, uma das credenciais para conseguir a obediência dos alunos.

A educação é, portanto, em primeiro lugar, questão de bom exemplo, porque a virtude fortalece a autoridade; porque é da natureza do homem imitar o que vê fazer, e os atos têm mais força para convencer e persuadir do que palavras e instruções.

A criança aprende mais pelos olhos do que pelos ouvidos. Vendo os pais ou chefes trabalhando, acostuma-se ao trabalho e aprende um ofício.

Assim também, é vendo fazer o bem e recebendo bons exemplos que aprende a praticar a virtude e a viver cristãmente.

O Irmão piedoso, observante, caritativo, paciente, dedicado, honesto e fiel a todos os deveres está sempre dando catecismo.

Sem notar, pelos bons exemplos vai transmitindo aos alunos a piedade, a obediência, a caridade, o amor ao trabalho e todas as virtudes cristãs.[3]

E não deixava passar nenhuma oportunidade de lembrar isso aos religiosos: “Sei também que tem bastantes alunos” – escrevia a um Irmão diretor – “terá, portanto, bastantes cópias de suas virtudes, pois é à sua ­imagem que as crianças se formam e são seus exemplos que vão nortear a conduta deles”.[4]

A disciplina é o corpo da educação

Outro aspecto ao qual São Marcelino dava primordial importância na arte de ensinar era a disciplina.

Insistia em dizer que a ordem é agradável a todos, inclusive às crianças, esclarecendo que a essência da disciplina não é a repressão pela força e pelo medo dos castigos, mas sim a correção dos defeitos e a formação da vontade.

A disciplina representa a metade da educação da criança; faltando essa metade, na maioria dos casos inutiliza-se a outra.

De que adianta ao menino saber ler, escrever e até saber o catecismo, se não aprendeu a obedecer, a se comportar, se não adquiriu o hábito de refrear as más inclinações para seguir a voz da consciência?

Por que razão os homens de hoje são tão volúveis, sensuais, incapazes de renúncia, incapazes de suportar algo que contrarie a natureza?

Porque não foram submetidos à disciplina desde a infância. Desfrutaram demasiada liberdade. Não se lhes ensinou o autodomínio, a abnegação e a luta contra as más inclinações. A disciplina é o corpo da educação; a Religião, a alma.[5]

“Tudo a Maria, para Jesus”

Como exímio didata, não lhe faltavam os sentimentos paternais, num perfeito equilíbrio da firmeza com a bondade, que se reflete neste conselho:

Diga aos seus alunos que Deus ama muito aqueles que são bem comportados, porque se parecem com Jesus, o máximo de bem comportado, e que ama também aqueles que não são bem comportados, porque espera que ainda vão chegar lá.[6]

É na devoção a Nossa Senhora, entretanto, que se encontram o fundamento e a quintessência da pedagogia marista, como está prescrito na Regra da fundação: “Os Irmãos envidarão todos os esforços para inspirar aos meninos grande devoção à Santíssima Virgem”.[7]

Tal era o desejo de São Marcelino Champagnat de glorificar a Mãe de Deus que o lema “tudo a Jesus por Maria” não o contentou. Daí a razão de, ao adotá-lo para seu Instituto, tê-lo complementado com um ousado e filial trocadilho, o qual bem poderia resumir sua vida: “Tudo a Maria, para Jesus!”.[8]


Notas
[1] SÃO MARCELINO CHAMPAGNAT, apud FURET, Jean-Baptiste. Vida de São Marcelino José Bento Champagnat. São Paulo: Loyola, 1999, p.498.
[2] Idem, p.499.
[3] Idem, p.500-501.
[4] SÃO MARCELINO CHAMPAGNAT. Carta ao Ir. Bartolomeu, 31/1/1830, apud FURET, op. cit., p.262.
[5] SÃO MARCELINO CHAMPAGNAT, apud FURET, op. cit., p.490.
[6] Idem, p.471-472.
[7] SÃO MARCELINO CHAMPAGNAT. Regra de 1837, apud FURET, op. cit., p.319.
[8] FURET, op. cit., p.313.