Maria é Mãe da Igreja não apenas por ser Mãe de Jesus Cristo e sua muito íntima colaboradora na “nova economia, quando o Filho de Deus assume d’Ela a natureza humana, para libertar o homem do pecado”[1] mediante os mistérios da sua carne, mas também porque “refulge em toda a comunidade dos eleitos como modelo de virtude”.[2] 

Como, na verdade, cada mãe humana não pode limitar a sua missão à geração de um novo homem mas deve alargá-la à nutrição e à educação, assim Se comporta também a Bem-Aventurada Virgem Maria.

Cooperadora no desenvolvimento da vida divina nas almas

Depois de ter participado no sacrifício redentor do Filho, e de maneira tão íntima que Lhe fez merecer ser por Ele proclamada Mãe não só do discípulo João, mas – seja consentido afirmá-lo – do gênero humano, por aquele de algum modo representado.

Assim, Ela continua agora no Céu a cumprir a missão que teve na terra de cooperadora no nascimento e desenvolvimento da vida divina em cada alma dos homens remidos.

Esta é uma consoladora verdade que, por ser livre beneplácito de Deus sapientíssimo, faz parte integrante do mistério da salvação humana; por isso, ela deve ser considerada como de fé por todos os cristãos. […]

Correspondência perfeita e modelar à graça

É bom, além disso, ter presente que a eminente santidade de Maria não foi apenas um dom singular da liberalidade divina: foi também o fruto da contínua e generosa correspondência da sua livre vontade às moções interiores do Espírito Santo.

É por motivo da perfeita harmonia entre a graça divina e a atividade da sua natureza humana que a Virgem rendeu suprema glória à Santíssima Trindade e Se tornou honra insigne da Igreja, que como tal A saúda na Sagrada Liturgia: “Tu és a glória de Jerusalém, Tu és a alegria de Israel, Tu és a honra do nosso povo”.

Nas páginas do Evangelho admiramos os testemunhos de tão sublime harmonia. Maria, logo que obteve a certeza pela voz do Anjo Gabriel de que Deus A elegia para Mãe do seu Filho Unigênito, sem qualquer hesitação, deu o seu consentimento para uma obra na qual teria de empregar todas as energias da sua frágil natureza, declarando: “Eis aqui a Serva do Senhor. Faça-se em Mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38).

Desde esse momento, Ela consagrou-Se inteiramente ao serviço, não apenas do Pai Celeste e do Verbo Encarnado, tornado seu Filho, mas também de todo o gênero humano, pois compreendeu bem que Jesus, além de salvar o seu povo da escravidão do pecado, seria o Rei de um Reino messiânico, universal e eterno (cf. Mt 1, 21; Lc 1, 33).

Louvor e imitação de suas excelsas virtudes

Pois bem, perante tanto esplendor de virtudes, o primeiro dever de quantos reconhecem na Mãe de Cristo o modelo da Igreja é o de, em união com Ela, render graças ao Altíssimo por ter realizado em Maria tão grandes obras em benefício da humanidade inteira.

Mas não basta. É igualmente dever de todos os fiéis tributarem à fidelíssima Serva do Senhor um culto de louvor, de reconhecimento e de amor.

E isso, uma vez que, segundo a sapiente e suave disposição divina, o seu livre consentimento e a sua generosa cooperação nos desígnios de Deus tiveram e continuam a ter uma grande influência na realização da salvação humana. […]

Porém, nem a graça do Redentor Divino, nem a intercessão poderosa da sua Mãe e nossa Mãe espiritual, nem a sua excelsa santidade poderiam conduzir-nos ao porto da salvação, se a tudo isso não correspondesse a nossa perseverante vontade de honrar Jesus Cristo e a Virgem Santa com a devota imitação das suas sublimes virtudes.

É, pois, dever de todos os cristãos imitar com espírito reverente os exemplos de bondade que lhes foram deixados pela Mãe do Céu. […]

Vértice do Antigo Testamento, aurora do Novo

Se, pois, contemplarmos a humilde Virgem de Nazaré na auréola das suas prerrogativas e das suas virtudes, vê-La-emos refulgir ao nosso olhar como a “Nova Eva”

Mas também, a excelsa Filha de Sião, o vértice do Antigo Testamento e a aurora do Novo, na qual se realizou a “plenitude do tempo” (Gal 4, 4), predestinado por Deus Pai para enviar o seu Filho Unigênito ao mundo.

Na verdade, a Virgem Maria, mais do que todos os patriarcas e profetas, mais do que o “justo e piedoso” Simeão, implorou e obteve “a consolação de Israel, […] o Messias do Senhor” (Lc 2, 25-26), e saudou a sua vinda com o hino do Magnificat, quando Ele desceu ao seu castíssimo seio, para nele assumir a nossa carne.

Receptáculo transbordante de graça

Por isso, é em Maria que a Igreja aponta o exemplo do mais digno modo de receber no nosso espírito o Verbo de Deus, consoante a luminosa sentença de Santo Agostinho:

Mais bem-aventurada, pois, foi Maria em receber Cristo pela fé do que em conceber a carne de Cristo. A consanguinidade materna de nada teria servido a Maria, se Ela não Se tivesse sentido mais feliz em acolher Cristo no seu Coração, que no seu seio. […]

O que deve ainda estimular mais os fiéis a imitar os exemplos da Virgem Santíssima, é o fato de o próprio Jesus, tendo-Lha dado por Mãe, implicitamente A ter apontado como modelo a imitar.

De fato, é natural que os filhos tenham os mesmos sentimentos que as mães e reproduzam os seus méritos e virtudes.

Portanto, assim como cada um de nós pode repetir com São Paulo: “O Filho de Deus amou-me e entregou-Se a Si mesmo por mim” (Gal 2, 20; cf. Ef 5, 2), do mesmo modo com igual confiança pode acreditar que o Salvador Divino lhe deixou, também a ele, em herança espiritual a sua própria Mãe.

Entregou-A com todos os tesouros de graça e de virtude de que A tinha cumulado, a fim de que os derramasse sobre nós, como efeito da sua poderosa intercessão e da nossa corajosa imitação.

É por isso que com razão São Bernardo afirma: “Vindo a Ela o Espírito Santo, encheu-A de graça para Ela mesma; inundando-A novamente o mesmo Espírito, Ela tornou-Se superabundante e transbordante de graça também para nós”.

 

Excertos de: SÃO PAULO VI. Signum magnum, 13/5/1967.

 

 

 

Notas
[1] CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.55.
[2] Idem, n.65.