À medida que se aproximam as comemorações natalinas, nota-se no olhar de algumas pessoas com as quais cruzamos fortuitamente, uma nostalgia, uma sede espiritual, um desejo – às vezes subconsciente – de reencontrar o verdadeiro sentido do Natal.
Com efeito, em nossos dias essa festividade se apresenta sob um invólucro de correrias, despesas, comércio e fruição, que impede suas alegrias autênticas e inocentes de se manifestarem.
Em vez de os corações se converterem ao Deus Altíssimo que veio até nós, assumindo a pobre natureza mortal para nos salvar, o mundo dirige sua atenção para um ídolo: Mamon, o deus do dinheiro.
Os costumes com que cada povo revive o nascimento de Cristo tornam-se cada vez mais massificados por essa idolatria universal, voltada para tudo quanto há de perecível e olvidada dos valores eternos.
Bem diversas são as riquezas nascidas de uma sociedade dócil às luzes de Deus! Nesse sentido, destacam-se as tradições natalinas da Alemanha.
Considerada comumente como uma nação filosófica e militar, no tempo de Natal, entretanto, ela se orna de uma delicadeza de alma capaz de interpretar
o sentimento de ternura que deveria despertar em alguém que visse no presépio uma Criança frágil, com todas as debilidades físicas da infância, chorando e com frio, mas que fosse o próprio Deus.[1]
Esse equilíbrio perfeito entre combatividade e meiguice só desabrocha em plenitude na alma realmente católica.
É essa alma que sabe admirar o sublime e o maravilhoso existentes além do mundo concreto e que, por este motivo, procura representar nas realidades materiais aspectos da beleza que não existe nesta terra, mas que ela deseja porque foi criada para o Céu.
Ora, no nascimento do Salvador não só algo das moradas eternas passou a habitar entre nós, mas o próprio Criador do Paraíso veio conviver conosco.
A humanidade atravessou milênios de espera e de preparação para tal fato e, através dos séculos, a Santa Igreja revive essa jubilosa esperança por meio do tempo litúrgico do Advento.
Na esfera temporal, uma tradição alemã, aprimorada com o passar das décadas, exprime de forma muito cândida essa expectativa: a confecção de um calendário com os dias que antecedem o Natal.
Na sua versão mais elaborada, ele apresenta uma série de janelinhas que devem ser abertas a cada dia, as quais ocultam um símbolo religioso ou uma alegoria natalina.
Em algumas cidades, a composição é transposta para a fachada de prédios públicos significativos, despertando a atenção dos transeuntes ao longo daquelas semanas.
Desse modo os fiéis se preparam inocentemente para o Natal, pondo-se na perspectiva do acontecimento que reviveremos na noite de 24 para 25 de dezembro, e as crianças, sobretudo, temperam sua pueril ansiedade pela chegada do grande dia.
As ilustrações escondidas atrás de cada janelinha em geral se assemelham às imagens contidas nas músicas germânicas próprias à Noite Santa:
[Uma] cidadezinha na neve, os tetos, em forma de cone, branquinhos, as casinhas marrons, tudo parecendo feito de pão de mel para se comer.
E uma igrejinha como que feita de marzipã, […] o caminho que conduz para a igreja, um pouco em zigue-zague […]; o sininho que toca em certa hora e as famílias que aparecem todas agasalhadas – cada indivíduo parecendo uma bolota de lã –, criancinhas que vêm em fila, carregando lanternas […].
A neve, sem fazer barulho, cai em flocos ligeiros. Um imenso silêncio, recolhido, de uma noite sagrada, na qual todo o mundo pensa no silêncio que cercava a gruta e a manjedoura.[2]
Neste Advento, façamos o propósito de montar também nós um calendário semelhante.
Contudo, não será necessário que o tenhamos – impresso ou confeccionado cuidadosamente em casa – em nossas mãos; convém, sobretudo, que o portemos no coração.
A cada dia, procuremos desligar-nos de nosso egoísmo e das coisas passageiras desta terra, e abramos, isto sim, um novo espaço em nosso interior para que a Santíssima Virgem ali deposite algo maravilhoso que nos aproxime do Paraíso, fazendo sorrir ao Menino Jesus que em breve nascerá misticamente.
