Na escura madrugada do dia 8 de novembro de 1997, às 3 horas, zarpamos do porto fluvial de Manaus, rumo a Belém do Pará, numa balsa de transporte de caminhões.
Medindo aproximadamente 70 metros de comprimento por 18 de largura, era ela impulsionada por um rebocador na parte traseira.
Nessa viagem, a grande embarcação transportava 25 carretas. Entre elas, na parte dianteira, estava colocada a kombi na qual – com mais sete amigos, leigos como eu – percorria o Norte do Brasil, divulgando a devoção a Nossa Senhora.
A queda no rio
Por volta das quatro horas, quando ainda muitos se preparavam para dormir, fui até a kombi pegar alguns papéis. Devido à densa escuridão de uma noite sem luar, pisei inadvertidamente em falso, caindo nas águas bem na frente da balsa que avançava!
Não encontrei coisa alguma em que me agarrar, nem sequer tive tempo de gritar, de tal forma a queda fora inesperada e desajeitada.
Eu tinha certeza de que ninguém havia visto nem ouvido minha precipitação nas devoradoras águas do imenso rio. Ao cair, o primeiro pensamento que me ocorreu foi de que seria colhido e estraçalhado pela hélice do rebocador!
Imediatamente fui tragado para baixo da balsa. Por mais que me debatesse, não conseguia sair de baixo do casco e fui sendo levado aos trambolhões.
Aterrorizava-me a ideia da hélice que se aproximava. Já quase sem fôlego, nadei no sentido que parecia desviar-me dela. E – enorme alívio! – passou afinal a balsa e encontrei-me vivo à tona d’água.
Luta com o piloto
Ao emergir, percebi que estava próximo do rebocador e gritei por socorro três vezes.
Apesar do forte ruído do motor, meus gritos foram ouvidos por um amigo e um marinheiro que lá se encontravam. Se não fosse isso, minha ausência só teria sido notada no dia seguinte…
O marinheiro subiu imediatamente à torre de comando para avisar o piloto. Enquanto isso, meu amigo fez averiguações e constatou que o náufrago era eu. O piloto, porém, negava-se a fazer voltar a balsa para recolher-me, argumentando:
— Não quero desanimá-lo, mas é praticamente impossível que seu companheiro seja resgatado vivo.
A essas alturas, os outros amigos meus juntaram-se ao primeiro.
Um deles, mais fogoso e decidido, ameaçou energicamente o piloto de “sérias complicações”, além de processo judicial, caso não tomasse imediatamente todas as medidas para tentar salvar a vida do náufrago.
Os argumentos categóricos e, sobretudo, a forte compleição do interpelante obtiveram o resultado desejado.
Sozinho num rio-oceano e na escuridão
Enquanto isso acontecia no rebocador, eu me encontrava boiando em meio às pequenas ondas, vendo as luzes do barco se distanciarem e o ruído do motor cessar por completo. Em pouco tempo, não vi nem ouvi mais nada…
Sozinho naquela escuridão, a muitos quilômetros de qualquer margem do rio, invocava incessantemente o auxílio de Nossa Senhora e de meus santos protetores.
Nunca em minha vida rezei com tanto ardor!… Vi-me logo acalmado por um sentimento de confiança e de resignação.
Na balsa, o piloto reduziu a marcha do motor e começou a fazer a manobra de meia-volta.
Era uma operação muito difícil em meio à escuridão porque, sem instrumentos de navegação, o único ponto de referência eram as luzes da usina termonuclear de Manaus, a 20 quilômetros de distância.
Fiquei flutuando por volta de 20 minutos. Pensei na morte, e encomendei minha alma a Deus e à Virgem Santíssima.
Veio-me à mente o que sabia do rio Amazonas: nele vivem mais de 300 espécies de piranhas, além de outros peixes maiores e ferozes… Acabrunhavam-me esses tristes pensamentos quando, para minha surpresa, vejo as luzes da balsa que estava voltando!
Dois de meus companheiros de atividades apostólicas se postaram na proa, munidos de uma boa lanterna, e quando a balsa se aproximou, logo conseguiram localizar-me.
Porém, por incrível que pareça, eu não tive tempo nem forças para sair da rota da embarcação que vinha na minha direção e ela passou implacavelmente por cima de mim mais uma vez!
Mas, graças a Deus, consegui escapar por uma lateral, devido à pequena velocidade com que ela avançava.
O resgate
A correnteza do rio dificultava a manobra da balsa. Afinal, alguém atirou-me uma boia. Todavia, a corda era insuficiente e eu estava por demais enfraquecido para dar algumas braçadas.
Era necessário alguém pular na água e trazer-me a boia. Um marinheiro se recusou a fazê-lo, alegando não saber nadar.
Então um de meus amigos – percebendo que ninguém faria nada e que minhas forças iam-se esgotando rapidamente – jogou-se nas águas, nadou até mim e me pôs a boia nas mãos.
Agarrei-me a ela como pude e fui alçado para a balsa. Mais um pouco de demora, e eu teria perdido totalmente as forças e afundado!
Ofegante, sem conseguir sequer falar, sentei-me numa cadeira do convés. Custava-me acreditar que ali estava, são e salvo! Comovido até as lágrimas, agradecia a Nossa Senhora o milagre por ela operado em meu favor.
O depoimento do experimentado piloto corrobora minha convicção do milagre. Declarou ele que, em 30 anos de navegação no Amazonas, não conhecia nenhum caso de resgate de náufrago com vida nesse rio à noite.
Com esse trágico episódio, aprendi uma grande lição: é que, por mais desesperadora que seja qualquer situação, nunca devemos desanimar, pois, se nos encomendarmos com confiança a Nossa Senhora, Ela certamente nos ajudará.