Blém, blém! O sino da estação anunciava com força a iminente partida do trem, naquele dia 19 de março.

O sol ainda despontava enquanto os passageiros iam embarcando devagar. Dentre os primeiros a entrar encontrava-se Pedro, um jovem de aproximadamente vinte anos. Ele escolhera um lugar junto à janela para melhor apreciar o panorama.

Blém, blém, blém! Era a última chamada; o trem estava prestes a pôr-se em movimento…

Um homem revestido de batina vinha em direção a Pedro. Ele vira um lugar desocupado ao lado do rapaz e lhe pedia licença para tomar assento. Sem titubear o jovem se levantou, oferecendo o próprio banco ao sacerdote, que logo entabulou uma conversa:

Que belo amanhecer! É digno da solenidade litúrgica de hoje. Sabe que Santo celebramos, meu filho?

Ah, sim senhor! – respondeu Pedro, contendo a emoção – Tenho para com São José uma gratidão sem limites.

E poderia contar o motivo deste sentimento?

O rapaz disse tratar-se de uma longa história. Todavia, como o sacerdote insistisse, narrou-a em pormenores…

O relato começava em sua aldeia natal, onde duas décadas atrás, ao repicar do carrilhão da Matriz de Santa Luzia, nascia uma criança.

O fato alegrou enormemente a José e Ana, seus pais, que há muito desejavam um filho. Não tardaram a batizá-lo com o nome de Pedro.

Menos de um ano depois, porém, a dor bateu às portas da família: José falecia, deixando a esposa viúva. Tremenda perplexidade! Ana teria que sustentar a criança sozinha. 

A boa mãe passou, então, a fazer trabalhos manuais, a vender frutas, verduras e legumes cultivados em sua pequena propriedade, e a dedicar-se, durante a noite, ao conserto de roupas, para que não viesse a faltar o pão à mesa.

Quando o dinheiro não era suficiente, ela se punha de joelhos e rezava com fervor redobrado.

Como prêmio de tanta confiança, operavam-se verdadeiros prodígios: ora eram alimentos que duravam na despensa quase indefinidamente, ora eram presentes deixados à entrada da casa por desconhecidos, ora eram trabalhos que apareciam inesperadamente. 

Certo dia, quando a piedosa mãe e seu filhinho comiam um pão feito com a última porção de farinha que lhes restava, ouviram bater à porta: Toc, toc, toc!

Ana abriu e deparou-se com um varão muito distinto, de uma nobreza que parecia não ser desta terra. Irradiava tanta luz que quase não se podia fitá-lo.

O pequeno Pedro, que estava aprendendo a andar, dirigiu-se cambaleante até a porta, encantado com o visitante. Este sorriu paternalmente e o tomou nos braços.

O menino brincava com a magnífica barba do visitante, que se mostrava ainda mais afetuoso ante aquele inocente afago. Passados alguns instantes, devolveu a criança à mãe e entregou-lhe uma bolsa com algumas moedas.

A luz que espargia o personagem tomou tanta intensidade que eles não enxergaram mais nada. E quando voltaram a ver com nitidez, o varão se tinha retirado…

A visita repetiu-se outras tantas vezes, sempre nas horas mais angustiantes. A última deu-se quando Pedro completou doze anos.

Curioso é que, mesmo não o vendo mais, mãe e filho sentiam-no de alguma forma presente, incutindo-lhes ânimo de forma discreta, mas eficaz.

Já crescido, ele começou a ajudar a mãe nos trabalhos. Não obstante, agora tudo se apresentava mais difícil. Numa manhã, Ana acordou com grande mal-estar e foi-lhe diagnosticada uma grave doença.

Não poderia mais dedicar-se aos afazeres cotidianos e precisaria tomar remédios caríssimos. Pedro ficou perplexo e lembrou-se do varão que sempre os ajudara. Onde estaria ele agora? 

De qualquer forma, não havia tempo a perder… Era preciso partir para a capital a fim de conseguir um bom emprego e com o salário pagar o tratamento da mãe. 

Pedro viajou cheio de tristeza. Chegando à capital, foi até o endereço indicado por um conhecido. Era o casarão de uma família católica abastada. Tocou a campainha e foi atendido por um mordomo que o conduziu à sala principal, pedindo que aguardasse.

Tentando afastar a angústia que o tomava, o jovem procurou distrair-se observando os objetos dispostos no salão. Havia móveis de muito bom gosto, vasos, uma bonita imagem de Nossa Senhora e… não podia acreditar no que via!

Aqui está aquele varão! – exclamou, ao pousar os olhos em certa pintura.

Uma criada ouviu a exclamação e foi ver o que estava acontecendo. Ao chegar no salão, deparou-se com Pedro que vertia copiosas lágrimas. Ele perguntou-lhe quem era a figura retratada na pintura.

É São José, o esposo de Maria respondeu ela, com certo espanto.

Quanta consolação sentiu o jovem naquele momento! Agradeceu e, pedindo licença, saiu a passos largos dali. Seu único anseio era contar à mãe o ocorrido, pois o considerava um sinal de que o Céu ia intervir para ajudá-los!

Tomou o trem de volta, marcando os segundos para chegar. Quando entrou em casa, seu coração batia depressa. Correu até o quarto de Ana, girou a maçaneta da porta e começou a falar:

— Mamãe…

Entretanto, ela não estava sozinha… Sentado junto à cabeceira da cama, o Santo Varão lhe ministrava um misterioso remédio. 

Notando a presença do rapaz, ele virou-se para fitá-lo. Quando seus olhares se cruzaram, Pedro lançou-se como uma criança em seus braços.

São José abraçou-o com força e, dando vazão a uma benquerença silenciada durante anos, disse-lhe com grande bondade:

Meu filho, quanto aguardei este momento. Tu e tua mãe passaram por inúmeras perplexidades; também eu tive as minhas. Minha vida sobre a terra foi coalhada de aflições, aparentes desmentidos e contradições. Contudo, sempre confiei e foi por esta confiança que obtive o sustento para a Sagrada Família.

E concluiu o Santo Patriarca:

Em tua vida, ainda terás de passar por situações difíceis. Lembra-te nelas de lançar-te em meus braços como quando eras criança e, deste modo, estarás também junto à minha Santíssima Esposa e ao meu Divino Filho.

O assobio longo e agudo do trem marcou o fim do eloquente relato, que o sacerdote escutava meditativo. 

— Foi assim que me tornei devoto de São José – disse Pedro, a modo de conclusão. 

A locomotiva havia chegado a seu destino!