Durante os dois mil anos de sua militante, vitoriosa e imortal existência, a Santa Igreja sempre foi e será um vivíssimo reflexo do esplendor de Deus.

Fecundada pelo precioso Sangue do Redentor, Ela foi fundada com vistas a fazer com que Céus e terra, em uníssono, rendessem ao Criador um único cântico de louvor.

Ciente deste papel de mãe, educadora e rainha das nações, a Esposa de Cristo se esmerou em manifestar sua pulcra grandeza nas catedrais; sua atraente piedade nas imagens e pinturas sacras; sua majestade luminosa e multiforme nos vitrais.

No entanto, tudo isso externa uma beleza estática. Tais elementos cativam, sem dúvida, o espírito do fiel que deles se aproxima, mas são apenas figuras e predicados que apontam uma realidade muito mais alta.

Que realidade é esta?

Para explicá-la, imaginemos que fosse dado a alguém a dádiva de uma visita ao Paraíso Celeste.

Lá chegando, poderia encontrar os palácios esplendorosos dos Santos, os jardins dotados de singularíssima variedade de flores e perfumes, superando tudo quanto a terra já deu na sua plenitude, ou, então, se depararia com mares calmos e límpidos, mais parecidos com safiras derretidas.

Contudo, se esse ­extasiante conjunto de sublimidades estivesse deserto, isento de qualquer vida, movimento e som, acaso estaria completa a alegria daquele ­visitante?

Assim também seria a alma católica se fizesse parte de uma Igreja desprovida de Liturgia, pois é através da pompa própria aos ritos sagrados que a voz da graça se faz ouvir suave e materna como a dizer: “Meu filho, vem degustar um pouco do que é o Céu”…

Seja na harmonia ora suave, ora grave, ora gloriosa das músicas; seja na sacralidade compassada dos movimentos do celebrante e dos que servem ao altar.

Seja na fumaça perfumada do incenso que se eleva cheia de nobreza, como a oração do justo a Deus; seja, enfim, na beleza tantas vezes arrebatadora dos objetos sagrados, a Liturgia é feita para o homem se esquecer momentaneamente da pequenez da vida cotidiana, e imergir na atmosfera celeste para a qual foi criado.

“Ao Senhor triunfante convém toda a glória”,1 rezamos no Ofício Divino. A dignidade e riqueza dos ritos e alfaias litúrgicos não reflete opulência ou ostentação, mas sim o desejo de glorificarmos nosso Pai e Criador.

Este anseio deve estar presente tanto numa cerimônia pontifícia, quanto na mais modesta das Celebrações Eucarísticas, pois todas elas constituem para o católico alento para a alma, segurança para seus passos e vigor para sua vida.

A Liturgia poderia ser vista também, de modo análogo, como uma repetição daquelas inefáveis conversas que Deus mantinha com o homem no Paraíso “à hora da brisa da tarde” (Gn 3, 8), antes de sua horrível queda.

É participando dela que o fiel pode provar e ver a suavidade do Senhor, conhecer de alguma forma o Deus sumamente belo, a quem serve, e conviver com o Pai indescritivelmente bom que, já na terra, nos dá a saborear as coisas do Céu.


1 4ª SEMANA DO SALTÉRIO. Hino do Ofício das Leituras. In: COMISSÃO EPISCOPAL DE TEXTOS LITÚRGICOS. Liturgia das Horas. Petrópolis: Vozes; Paulinas; Paulus; Ave-Maria, 2000, v. III, p. 1033.