São três. O mais velho não tem mais de 15 anos. Sentados na calçada, junto a uma bicicleta, nem sequer conversam. É sábado, têm longas horas livres diante de si, a tarde está quente…

Em que pensam? Talvez nem eles saibam dizer, mas, apesar de muito jovens, já sentem penosamente o que o Evangelho chama – de modo tão expressivo – “o peso do dia e do calor” (Mt 20, 12); o peso da vida e suas dificuldades, o peso das dúvidas e das incertezas.

Um deles deixa seu olhar distraído vagar por cima dos telhados. No azul vivo, duas pipas se debatem sem conseguir subir ao céu e por fim desaparecem, uma após a outra, sendo recolhidas por outros meninos que estavam à distância.

Na jovem mente surge, de maneira um tanto confusa, a ideia: “É… tudo cai mesmo, nada se eleva, nada faz mudar esta vida sem graça.”

Bocejo, modorra… Alguém grita na esquina:

— Fabrício! A mãe está te chamando!

E lá se vai o Fabrício rua abaixo, arrastando os pés. Os outros dois ali ficam, mas os raios do sol já começam a incomodá-los fortemente.

O Leandro se espreguiça, cumprimenta o amigo com um gesto de mão displicente e se afasta vagarosamente, levando a bicicleta.

O terceiro – o que há pouco contemplava a queda das pipas – não sente vontade de sair, nem de ficar, nem de nada… Que vida monótona!

De repente, um som totalmente inusitado rasga a calmaria da tarde: são toques de clarim! Nosso jovem ergue a cabeça, surpreso e maravilhado, olhando em todas as direções.

No extremo da rua passa um grupo de moços, trajados como ele nunca viu! Em dois pulos está ele ao lado dos recém-chegados. São jovens como ele, alegres e sorridentes! O rapaz está deslumbrado…

Boa tarde! Como é seu nome? – pergunta um deles.

Eu? Reinaldo. Mas… o que é isso? Quem são vocês?

— Não sabe? Somos Arautos do Evangelho e estamos em missão mariana no seu bairro, trazendo a imagem de Nossa Senhora.

Reinaldo nem prestou atenção nas palavras, pois nesse momento seu  olhar caiu sobre a grande cruz que todos eles ostentavam no traje.

Como é bela! – pensou. Ele nunca havia visto uma cruz assim. Que cores! Vermelho, branco, dourado… Foi tomado pela curiosidade e as perguntas lhe vinham à mente: “Por que essa forma, essas cores, esse tamanho?”…

Olha, pode me explicar isso que vocês têm no peito? É uma cruz?

— Sim! É a Cruz dos Arautos!

— Bonita, bonita mesmo… E por que tão grande? Por que tantas pontas?

Vou lhe explicar: esta é a cruz da alegria e do entusiasmo, da felicidade santa que possui quem se dedica a um altíssimo ideal!

Ideal? O que é isso?

—  O ideal é um apreciável e alto valor pelo qual vale a pena sacrificar-se e que merece nossa dedicação! O amor pelo ideal é posto por Deus nas almas. Para nós, esse ideal é servir à Igreja e ao Papa, e trabalhar para que o mundo inteiro seja conforme a vontade de Deus. É um grande, enorme ideal e daí o tamanho da cruz. Você percebe que não poderia ser menor, não é?

— Ah! Entendi! E as pontas?

— A forma desta cruz, cheia de pontas como a explosão de belos fogos de artifício, fala-nos de jú­bilo e esperança, pois sabemos que, com a ajuda de Nossa Senhora, esse ideal será realizado.

E por que vermelha e branca?

O vermelho é a cor do Sagrado Coração de Jesus, Redentor nosso e Senhor do Universo, mas é também a cor do heroísmo.

— Heroísmo?

A coragem de enfrentar todas as dificuldades e a certeza de vencer em todas as lutas de nossa vida, repetindo com São Paulo: “Tudo posso naquele que me fortalece” (Fl 4, 13).

— Quem te fortalece?

— Deus Nosso Senhor, que sempre manda sua graça para nos socorrer, por meio de Nossa Senhora, Mãe Santíssima d’Ele e nossa.

— É verdade… minha mãe sempre reza a Nossa Senhora. Diz que Ela nunca falhou. E o branco?

O branco é justamente a cor do Imaculado Coração de Maria, virginalíssimo e sem mancha alguma. É também o símbolo da virtude da pureza, que todos nós praticamos com o auxílio d’Ela.

É difícil praticar?

Não é só difícil, mas também impossível sem a ajuda da graça, como, aliás, todas as outras virtudes. Mas rezando muito e fugindo das ocasiões próximas de pecado, qualquer pessoa pode praticá-la, com alegria e entusiasmo.

Encantado, o menino ouvia a explicação:

Mas vamos ao dourado: é apenas um filete, um cordão muito fino, no meio do vermelho e do branco. O ouro é o mais nobre de todos os metais e, assim, representa a nobreza de nossa missão. Dourada é também a luz do sol ao amanhecer, e este pequeno fio nos lembra a esperança do Céu, onde desejamos chegar pela misericórdia divina. Lá teremos a aurora sem fim e a luz que não se acaba, junto a Deus, Maria Santíssima, os anjos e os santos.

O rapaz nunca ouvira alguém falar-lhe sobre isso e ouvia atentamente:

Ele está entre o vermelho e o branco, para mostrar que só pode ter heroísmo na luta e perseverança na virtude, quem tem esperança na vida eterna. Mas… desculpe-me, Reinaldo, meus companheiros já estão longe, acabam de virar a esquina. Gostei enormemente de conversar com você. Que Nossa Senhora lhe ajude muito, mas muito, ouviu?

A você também! E obrigado pela explicação!

— Até logo, então!

— Até logo!

Nessa noite Reinaldo demora a adormecer. Voltam à sua memória as palavras ouvidas no encontro com os Arautos: ideal, heroísmo, pureza, Céu, eternidade…

E, sobretudo, aquela cruz! Aquela cruz o deixou fascinado. Como é possível haver uma cruz tão bonita? Que alegria, que emoção! “Acho – pensa ele – que hoje encontrei um ideal”.

E as lágrimas lhe correm pela face.