Certo tempo atrás, recebi de um amigo o convite para assistir a um documentário em vídeo, uma coletânea de filmagens aéreas de algumas regiões da Europa.
Seu diretor teve o bom gosto de não fazer muitos comentários, limitando-se a dar breves informações, apenas o necessário para o espectador poder localizar-se.
O filme intitulava-se em espanhol, se não me engano, “A vista de pájaro”, ou seja, “Vista de pássaro”. Sugestivo e até poético nome, evocando como seria uma região contemplada das alturas, pelos olhos de um pássaro.
No conjunto, era uma obra muito feliz. Em determinado momento, a câmara perfazia uma volta completa em torno das evocativas ruínas de uma multissecular abadia, emoldurada por simpáticas plantações de um verde vivo e impecável.
Noutro trecho, um prestigioso casarão guarnecido por ciprestes, emergia como ilha em meio a bruma misteriosa de uma manhã de outono.
Dos amigos que comigo assistiam à projeção, alguns nasceram no Continente Europeu e outros lá viveram considerável tempo.
Assim, volta e meia alguém reconhecia uma região pela qual já tinha passado, e as sumárias explicações do filme eram completadas pelos comentários do pequeno grupo de assistentes.
Curiosamente, muitas observações manifestavam uma surpresa: “Oh, mas aquela vila? Como é bonita vista de cima!” Ou: “Eu pensei que conhecia tão bem esta cidade... mas, olhada do alto, ela parece outra, toma outra dimensão!”
Com efeito, a realidade considerada com “vista de pássaro” é quase sempre maravilhosa e sublime; e com “vista de homem”, apresenta-se frequentemente prejudicada por uma das fraquezas humanas, que é a de aferrar-se com facilidade aos pormenores.
E isso, na maioria das vezes, mais distorce a realidade do que ajuda a melhor entendê-la.
Em termos corriqueiros, isso se chamaria de “vistas curtas” ou, se quiserem, mediocridade.
E é uma das grandes fontes de atrito entre os homens, quando cada um, atento só ao exíguo espaço que consegue – ou quer – ver diante de si, não compreende o procedimento do outro, mesmo estando a pouca distância.
Poderia ser mencionado um sem-número de malefícios que decorrem dessas perspectivas acanhadas.
Basta, aqui, lembrar um: as “vistas curtas” não raro são relacionadas com uma visão meramente material das coisas, sem considerar a realidade sobrenatural que está acima de tudo quanto vemos em torno de nós.
Deus criou o universo como um grande e admirável conjunto para glorificá-Lo. Nele, nada existe sem ter uma razão de ser.
Quando disso nos olvidamos, corremos o grave risco de esquecer a finalidade da Criação, primeiro passo para relegar ao olvido o próprio Criador.
O hipotético pássaro do documentário observava das alturas o panorama, no qual as centenas de pequenos componentes formavam um conjunto encantador e maravilhoso.
Também nós, homens, se nos esforçarmos por analisar tudo de um alto ponto de observação – ou seja, sobrenatural – poderemos perceber que até mesmo as coisas mais comuns e corriqueiras tomam importância. Pois, para quem tem fé, nada é insignificante.
Então, não seria salutar, além de mais virtuoso, buscarmos sempre a “vista de pássaro”, ao invés de nos contentarmos e acomodarmos com a prosaica e habitual “vista de homem”?