Quem nasceu na América do Sul e teve oportunidade de visitar alguma das mais famosas catedrais da Europa concordará comigo em quão difícil é explicitar as impressões que assaltam o espírito ao entrar nelas pela primeira vez.
Nobres, grandiosas e distintas, mas ao mesmo tempo acolhedoras e afáveis, essas construções parecem evocar o Salmo que canta: “Excelso é o Senhor, mas olha os pequeninos” (137, 6).
São edifícios criados para o culto divino nos quais se refletem extremos opostos, embora harmônicos: Deus é Altíssimo, porém inteiramente acessível a seus filhos.
Ao analisar os diversos aspectos e pormenores desses templos, algo prende particularmente a nossa atenção: os vitrais que recobrem boa parte das suas paredes.
Feitos em cores variadas, destilam magníficos arco-íris sobre as colunas e muros do recinto quando atravessados pelos raios do sol.
E enquanto nossa sensibilidade desfruta desse espetáculo de inexprimível beleza, o espírito percebe que Deus, ou algum dos seus Anjos, quer comunicar-se conosco através dessa feérica visão.
Durante o dia, o melhor lugar para ver os vitrais é do lado de dentro da catedral.
O Sol dá vida aos vidros que os compõem e, com sua luminosidade cambiante, modula sem cessar as cores e o ambiente no interior do templo.
Ora as naves são atravessadas por fachos resplendentes de luz, ora pervadidas de neblinas coloridas, tamisadas e difusas; ora a ação do astro-rei é tão suave e discreta que só poderemos percebê-la olhando diretamente para as janelas, transformadas em mosaicos de luz.
Quando o sol se recolhe e são acessos os lustres no interior do templo, os vitrais parecem ter perdido seu colorido.
Mas não é assim: ao olhá-los do lado de fora, na penumbra da noite, adquirem uma magnificência singular, invisível do lado interno, mas não para quem os contempla da parte externa do edifício.
Algo semelhante acontece conosco. Quando é “dia” em nossa vida espiritual, sentimos a alma cumulada de graças, que tornam fácil a prática da virtude e o desenvolvimento dos dons sobrenaturais.
E julgamos que esses momentos de alegria luminosa são os mais propícios para crescer no amor a Deus e alcançar o cume da santidade.
No entanto, no decorrer do tempo, chegam períodos nos quais essas manifestações sobrenaturais diminuem, cedendo o passo à noite da dor e às trevas da aridez.
E, como vivemos num mundo avesso a qualquer forma de sofrimento, julgamos que estamos nos afastando do caminho da perfeição e decaindo espiritualmente. Porém, não é assim.
Nossas vistas apoucadas não alcançam o imenso valor dessa fase de prova permitida pela Providência, nem discernem os benefícios que tais tormentos trazem à nossa alma.
Mas o Pai Celeste, que constantemente nos acompanha com seu olhar, sabe que os melhores momentos da vida de um homem são aqueles nos quais passa por dificuldades, dores e decepções, pois seu coração se torna justo à medida que vai sendo imolado.
Não é fácil atravessar com fidelidade os períodos de provação que muitas vezes Deus permite seus filhos experimentarem, sobretudo quando eles vêm acompanhados por uma sensação de abandono.
Por isso, ser-nos-á proveitoso guiarmo-nos nessas ocasiões pelo seguinte pensamento: “Deus é bom e, ao purificar minha alma com a dor, faz nascer nela a luz da fidelidade.
Ainda que eu O sinta distante, Ele olha para a catedral de minha alma e sorri com ternura ao ver belos vitrais iluminados pela luz que Ele próprio depositou em meu interior.
Mesmo caminhando em meio às sombras das maiores aflições, não temerei. Eu confio, Senhor, que aos vossos olhos reluzem os méritos daquele que aceita com alegria o sofrimento”.