— Ai! Que Senhora tão bonita! Ai! Que Senhora tão bonita!

A voz cristalina da pastorinha ecoava pelas encostas da serra, misturando-se ao som dos chocalhos das ovelhas as quais, plácidas e obedientes, iam ganhando a estrada de volta ao redil.

Enquanto conduzia o rebanho, a pequena Jacinta não continha a alegria pelo que havia presenciado, junto com seu irmão Francisco e a prima Lúcia, naquele bendito domingo, 13 de maio de 1917.

Logo de manhã, quando o lindo alvorecer prenunciava um dia ensolarado e risonho, aprontaram-se e foram assistir à Missa na igreja paroquial de Fátima.

Cumprido o preceito, retornaram às suas casas em Aljustrel, a fim de combinar, como de costume, o local aonde levariam a pastar as ovelhas.

Escolheram a Cova da Iria, propriedade dos pais de Lúcia, nos altos da Serra de Aire.

Após prepararem um lanche, partiram contentes e festeiros, tocando vagarosamente o rebanho, para que os animais fossem pastando pelo caminho.

O tempo transcorria calmo e entretido durante a permanência dos pastorinhos na Cova da Iria.

Junto de uma pequena oliveira que o pai de Lúcia plantara por ali, os três comeram a merenda, composta de pão de centeio, queijo e azeitonas, e rezaram um Terço.

Perto do meio-dia, subiram até um terreno mais elevado da propriedade e começaram a brincar.

De repente, em meio ao seu inocente recreio, as três crianças foram surpreendidas por um clarão semelhante ao de um relâmpago. Correndo os olhos pelo horizonte, viram que continuava limpo, o céu luminoso e sereno.

Entreolharam-se, então, mudas e atônitas: que seria aquilo? Mas já Lú­cia, com certa vozinha de mando, ordenou:

— Vamos embora, porque pode vir trovoada.

— Pois vamos – disse Jacinta.

Reuniram o rebanho e tocaram-no, descendo pela direita.

Mais ou menos no meio da encosta, tendo uma azinheira grande pela frente, viram um segundo relâmpago.

Um pouco assustados, procuraram acelerar a descida, mas logo se detiveram maravilhados: a curta distância, sobre uma carrasqueira de um metro e pouco de altura, viram uma majestosa Senhora que lhes disse com doçura:

— Não tenhais medo, Eu não vos faço mal.

Era uma Senhora vestida toda de branco – contou depois Lúcia – mais brilhante que o Sol, espargindo luz mais clara e intensa que um copo de cristal cheio de água cristalina, atravessado pelos raios do Sol mais ardente.

Seu rosto era de uma beleza nunca vista, nem triste, nem alegre, mas sério, talvez com uma suave expressão de leve censura.

O vestido, mais branco que a pró­pria neve, parecia feito de luz.

Tinha as mangas relativamente estreitas e era fechado no pescoço, descendo até os pés, os quais, envolvidos por uma tênue nuvem, mal eram vistos roçando as folhagens da azinheira.

Cobria-lhe a cabeça um manto, também branco e orlado de ouro, do mesmo comprimento que o vestido, envolvendo-Lhe quase todo o corpo.

As mãos, trazia-as juntas em oração, apoiadas no peito, e da direita pendia um lindo Rosário de contas brilhantes como pérolas, terminando por uma cruzinha de vivíssima luz prateada.

[Como] único enfeite, um fino colar de ouro-luz, pendente sobre o peito, e rematado, quase à cintura, por uma pequena esfera do mesmo metal.

Os três pastorinhos se encontravam tão perto da aparição que ficavam dentro da luz que A cercava.

Lúcia tomou a iniciativa de falar:

— Donde é Vossemecê?

— Sou do Céu.

— E que é que Vossemecê me quer?

— Vim para vos pedir que venhais aqui seis meses seguidos, no dia 13, a esta mesma hora. Depois vos direi quem sou e o que quero. Depois voltarei ainda aqui uma sétima vez.

— E eu também vou para o Céu?

— Sim, vais.

— E a Jacinta?

— Também.

— E o Francisco?

— Também, mas tem que rezar muitos Terços.

E Nossa Senhora continuou:

— Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos, em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido e de súplica pela conversão dos pecadores?

— Sim, queremos!

— Ides, pois, ter muito que sofrer, mas a graça de Deus será o vosso conforto.

Ao pronunciar essas últimas palavras, a Santíssima Virgem abriu as mãos e uma luz intensa saiu delas, penetrando no mais íntimo da alma dos pastorinhos. Sentiram-se muito próximos de Deus e mais felizes do que nunca.

Então, por um impulso que lhes foi comunicado do alto, caíram de joelhos e repetiram para si mesmos:

— Ó Santíssima Trindade, eu Vos adoro. Meu Deus, meu Deus, eu Vos amo no Santíssimo Sacramento.

Passados alguns instantes, Nossa Senhora acrescentou:

— Rezai o Terço todos os dias para alcançardes a paz para o mundo e o fim da guerra.

Referia-se à Primeira Guerra Mundial, iniciada em 1914.

Depois, a Senhora começou a elevar-Se serenamente, sempre rodeada de luz, e subiu em direção ao leste até desaparecer no azul do céu.

Os três pastorinhos permaneceram silenciosos e pensativos, contemplando longamente o firmamento, enquanto despertavam do estado de êxtase em que se encontravam.

Ao seu redor, a natureza voltara a ser o que era antes. O sol continuava a brilhar sobre a terra, e o rebanho, espalhado, deitara-se à sombra das azinheiras. Na serra deserta, tudo era sossego.

A celeste Mensageira havia produzido nas crianças uma deliciosa impressão de paz e de alegria radiante, de leveza e liberdade. Parecia-lhes que poderiam voar como os pássaros.

A Virgem Maria falou apenas com Lúcia, enquanto Jacinta permanecia calada, só ouvindo o que Ela dizia.

Mas Francisco não A ouvia, concentrando toda a sua atenção somente em vê-La.

Quando as meninas lhe relataram o diálogo com Nossa Senhora e a referência que a ele fora feita, encheu-se de grande alegria. Cruzando as mãos acima da cabeça, exclamou em voz alta:

— Ó minha Nossa Senhora! Rezarei quantos Terços Vós quiserdes!

Já ecoavam na serra os sinos das Ave-Marias do entardecer, quando os pastorinhos tocaram as ovelhas, tomando o caminho de volta. O silêncio dos três era às vezes entrecortado pelas alegres exclamações de Jacinta:

— Ai! Que Senhora tão bonita! Ai! Que Senhora tão bonita!