Antes de ser ensinada e difundida pela Igreja Católica, a crença na ressurreição dos corpos era motivo de grande perplexidade para as religiões e os filósofos pagãos do mundo antigo.
Sem acreditar na imortalidade da alma humana, eles estavam convencidos de que, com a morte, uma pessoa ou desaparecia completamente ou algo dela se reincorporaria, perdendo a identidade consigo mesma na natureza ou num deus impessoal existente alhures.
Surpreendente doutrina que dividiu o mundo antigo
Com o advento do Cristianismo e a pregação dos Apóstolos, a doutrina da ressurreição dos mortos causou imensa atração.
Com efeito, a ideia de que o homem é constituído por uma alma espiritual e um corpo material, e a noção de que um Deus onipotente ressuscitará a todos nós por toda a eternidade, como ressuscitou a Si mesmo, reunindo novamente em cada pessoa os dois elementos que a compõem, era de molde a surpreender e a maravilhar aqueles povos da Antiguidade.
Porém, diante do Evangelho – ou seja, da boa notícia de que o Verbo de Deus Se tinha feito carne, nos havia remido, ressuscitara e abrira o caminho da ressurreição para todos nós – os espíritos se dividiram.
Uns se mostravam antipáticos ao novo ensinamento, preferindo suas velhas convicções de que a existência do homem termina com sua morte e, portanto, tratava-se de prolongar e aproveitar ao máximo a vida terrena.
Outros, mais elevados, pensavam: “Depois da série de tormentos que suportamos neste mundo, eu julgava que me afundaria no negrume da sepultura, desfazendo-me no nada. Mas agora chegam-me aos ouvidos ensinamentos a respeito da ressurreição gloriosa, de um dia em que eu me levantarei da sepultura para uma felicidade superior a todas deste mundo!? Que maravilha!”
Compreende-se que a nova doutrina causasse essa divisão em duas famílias de almas.
Aconteceu, então, que os da primeira, mais numerosos, mais poderosos, começaram a desafiar e a perseguir os da segunda: surgiram os mártires do tempo do Império Romano.
Homens e mulheres convertidos ao Cristianismo, até então respeitados e venerados por seus semelhantes, se encontraram de repente na arena do Coliseu, semi-desnudos, insultados e vaiados por uma multidão enraivecida.
Por quê? Porque abraçaram a crença na vida eterna.
Belezas envolvidas na ressurreição dos mortos
Não é difícil, pois, imaginar o drama e a reviravolta que a pregação da ressurreição provocou na velha humanidade.
Como não é difícil nos darmos conta de que não podemos tomar como banalidade o que deixou perplexo um imperador romano, o que causava dor de cabeça a um filósofo pagão, e fazia estremecer de alegria um ancião ou uma criança inocente.
Antes, devemos sempre ter presente toda a beleza que essa verdade encerra, e o quanto ela foi, ao longo da História da Igreja, ensinada e fundamentada pelos maiores e mais ilustres expoentes da Teologia católica.
Para não nos estendermos, basta evocarmos o pensamento do grande São Tomás de Aquino, que prova a ressurreição com argumentos tirados da razão natural e da Escritura: é fato revelado pelo Espírito Santo.
E ele apresenta como um dos elementos da Revelação esta frase de São Paulo: “Quando tu semeias, não semeias o corpo da planta que há de nascer, mas semeias o mero grão”.
A interpretação fantástica dada pelo Doutor Angélico: o grão é o cadáver e a planta que nascerá é o homem ressurreto, saído daquele.
Esta sentença se ajusta de modo magnífico às palavras de Nosso Senhor no Evangelho: “Se o grão não se decompor, não frutifica”.
Quer dizer, enquanto o homem não termina a sua batalha neste mundo e morre, dele não brotará o fruto da sua própria ressurreição.
Assim, quando se fecha a tampa do caixão contendo um cadáver, devemos ter o seguinte pensamento, inspirado pela fé: se é verdade que a morte representa um castigo, verdade é também que aqui está uma semente para a ressurreição.
Nisto devemos ver como é bela a continuidade de uma vida humana levada na virtude e no amor a Deus, de uma existência virtuosa que passa sobre a morte com os olhos postos nas glórias da ressurreição.
É essa verdade que nos incute ânimo, que nos explica a vida, que nos faz seguir sempre em frente, rumo ao encontro da eterna e completa felicidade. Felicidade esta que o mesmo São Tomás aduz como mais uma prova da ressurreição.
Posto que o homem procura como meta final a alegria perfeita, a qual não pode ser achada senão na eterna bem-aventurança, tem de haver uma vida após a morte e uma ressurreição da carne, sob pena de que tudo neste universo seja errado, fracassado e sem sentido.
De fato, para que viver, se não existe este objetivo de alcançar a felicidade sem limites, infinita, sem sombras, onde compreendemos eternamente, na medida de nós mesmos, o eterno, o insondável e perfeitíssimo que é Deus?
Ver Deus em Deus, ver Deus na Pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, vê-Lo em Nossa Senhora, nos Anjos e nos Santos! Esta é a autêntica alegria. O que não for isto, é burla em matéria de felicidade.
Portanto, com o auxílio e o amparo da Santíssima Virgem, chegará para todos nós o dia em que nossas almas estarão definitiva e perenemente unidas aos nossos corpos. As dores e os júbilos efêmeros desta vida terão passado, nós estaremos no Céu por todo o sempre.
Alegria da Páscoa, prenúncio de nossa ressurreição
Para concluir, vem a propósito evocar uma vez mais o ensinamento de São Tomás de Aquino.
Ele se pergunta se a ressurreição dos homens tem como causa a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, e responde pela afirmativa.
Ou seja, até Nosso Senhor, ninguém havia entrado no Céu.
Somente depois da Paixão, Morte e Ressurreição do Cordeiro de Deus é que foram franqueadas para a humanidade as portas da bem-aventurança eterna.
E o dia da Páscoa é a festa por excelência da Ressurreição d’Ele, mas traz no seu cortejo a perspectiva da ressurreição de todos os homens no dia do magno Juízo.
Então, compreende-se que na alegria pascal, tão característica, temos um pouco do prenúncio de nossa própria ressurreição, e este sentimento se reflete no modo católico de viver o dia da festa da Ressurreição de Jesus.