Honk-Kong - China (Quarta-feira, 04-03-2020, Gaudium Press) Conforme informações distribuídas pela ACI Prensa, o Bispo Emérito de Hong Kong, Cardeal Joseph Zen Ze-kiun, opositor firme do acordo provisório entre o Vaticano e a China para a nomeação de Bispos naquele país da Ásia, respondeu uma carta do Cardeal Giovanni Battista Re, novo decano do Colégio de Cardeais, escrita sobre esta questão há alguns dias.

Nessa carta o Cardeal Ré destacou que a visão do Purpurado chinês difere da visão dos Papas São João Paulo II e Bento XVI.

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No que é que estou errado? Pergunta o Cardeal Zen.
Foto: Arquivo Gaudium Press

Carta do Cardeal Ré

Na carta datada de 26 de fevereiro, o Decano do Colégio Cardinalício destaca que o acordo entre o Vaticano e a China, assinado em setembro de 2018, representa com fidelidade as ideias de São João Paulo II e Bento XVI, e que o Cardeal Joseph Zen Ze-kiun se equivoca em sua oposição a este respeito.

Em sua carta publicada no site italiano La Nuova Bussola Quotidiana, o Cardeal Ré diz:

"O Cardeal Zen afirmou várias vezes que seria melhor não ter um acordo do que ter um 'mau acordo'.
Os três últimos Papas não compartilharam esta posição e apoiaram e acompanharam a redação do acordo que, no momento, parecia ser o único possível".

Continua o Cardeal Ré em sua carta-resposta:

"É particularmente surpreendente a afirmação do Purpurado (Zen) de que ‘o acordo assinado é o mesmo que o Papa Bento se negou a assinar naquela altura'. Essa afirmação não corresponde à verdade", disse o Cardeal Ré, acrescentando:

"Depois de ter tomado nota pessoalmente dos documentos existentes no atual arquivo da Secretaria de Estado, posso assegurar" que "o Papa Bento XVI aprovou o rascunho do acordo sobre a nomeação dos bispos na China, que só foi possível assinar em 2018".

"Igreja Independente"

Para o Cardeal decano do Colégio de Cardeais, "a expressão ‘Igreja Independente' já não pode interpretar-se de maneira absoluta, como 'separação' do Papa, como era o caso no passado".

Tréplica do Cardeal Zen

Através de seu Blog pessoal, no último domingo, 1º de março, o Cardeal Zen respondeu à carta do Cardeal Re através de uma carta aberta.

Em sua carta, o Cardeal Zen recordou uma passagem do livro de entrevistas do jornalista alemão Peter Seewald realizada com o Papa Bento XVI intitulado "Últimas Conversas".

Nesta entrevista Joseph Ratzinger fala da Ostpolitik de São João Paulo II, ou seja, das relações da Santa Sé com os países do bloco soviético:
"Conversávamos sobre isso. Era claro que a política do (Cardeal Agostino) Casaroli, apesar de ter sido realizada com as melhores intenções, havia fracassado", disse Bento XVI no livro citado pelo Cardeal Zen.

Recorde-se que o Cardeal Casaroli, que faleceu em 1998, foi quem desenvolveu inicialmente o Ostpolitik do Vaticano, durante os pontificados dos Papas João XXIII e Paulo VI.

João Paulo II e Bento XVI

Continuando, o Cardeal Zen comenta em sua tréplica que "As novas linhas seguidas por João Paulo II foram o resultado de sua experiência pessoal, do contato com esses poderes.

Naturalmente, então, não se podia esperar que esse regime caísse rápido, mas era claro que, em vez de ser conciliadores e aceitar compromissos, era necessário se opor fortemente.

Essa foi a visão de fundo de João Paulo II que eu compartilhava".

O Cardeal Zen também destacou em sua carta que, para provar que o acordo assinado entre o Vaticano e a China para a nomeação de bispos "já havia sido aprovado por Bento XVI, basta me mostrar o texto assinado, que até agora não me deixaram ver, assim como a evidência do arquivo que você pôde verificar.

Restaria apenas explicar por que não foi assinado então".

Cardeal Parolin, inteligência, manipulação e desejo

Com a mesma ênfase o Cardeal Zen destacou que "a mudança de época do significado da palavra 'independência', temo que exista apenas na cabeça do eminentíssimo Secretário de Estado", Cardeal Pietro Parolin, "induzido, talvez, por uma tradução errada do chinês feita por alguém da Congregação para a Evangelização dos Povos".

Para o Bispo Emérido de Hong Kong, essa pessoa foi "também responsável pelos ao menos 10 erros de tradução da carta do Papa Bento de 2007" aos fiéis da China, um texto que o governo comunista não permitiu que fosse divulgado, obrigando, inclusive, que fosse retirado dos diversos sites católicos.

Continuando, em sua tréplica ao Decano do Colégio Cardinalício, o cardeal Zen diz:

"No entanto, dada a inteligência de sua Eminência, é difícil para mim acreditar que tenha sido enganado. É mais provável que tenha querido ‘se deixar enganar'".

"Tenho evidências de que Parolin manipula o Santo Padre, o qual sempre me manifesta muito carinho, mas não responde minhas perguntas", acrescentou.

No que é que estou errado?

Essa pergunta surge depois de o Cardeal Chinês sublinhar que:

"Frente às posturas da Santa Sé que eu não consigo entender, a todos os irmãos desolados que vêm a mim, digo para não criticarem aqueles que seguem essas indicações.
No entanto, nelas ainda se deixa liberdade a quem tem objeção de consciência.
Exorto estes a se retirarem às catacumbas, sem se oporem a qualquer injustiça, pois de outro modo terminariam perdendo mais".

Dom Zen questionou:
"Sobre o que eu estou errado?" "Estou cem por cento de acordo com o convite a rezar", destacou ainda.

A situação é muito ruim...

Em recente entrevista à CNA, -agência em inglês do Grupo ACI-, o Cardeal Zen disse que "a situação é muito ruim e a fonte disso não é o Papa que não sabe muito sobre a China. O Santo Padre Francisco tem um carinho especial por mim".
..."estou lutando contra Parolin porque as coisas ruins vêm dele", afirmou o Cardeal.

E Cardeal Zen ainda acrescentou em sua entrevista:

"Você não pode se comprometer" com o Partido Comunista Chinês, porque eles são "perseguidores" da fé. "Eles querem a rendição total. Isso é comunismo".

Qual é a situação dos católicos da China?

A resposta da ACI é de que, em abril de 2019, o editor da agência de notícias ‘Asia News', Pe. Bernardo Cervellera, que é especialista em Igreja Católica na China e estudioso da situação que ali acontece, informou que, "em muitas dioceses, a Associação Patriótica e o Departamento de Assuntos Religiosos continuam exigindo que todos os sacerdotes se inscrevam na associação e mantenham a 'Igreja independente'".

Como é de conhecimento geral, na China, existe a denominada Associação Católica Patriótica Chinesa, que é controlada pelo governo comunista, e a Igreja que o Governo chinês considera clandestina ou subterrânea, que sempre permaneceu fiel à Santa Sé.

Para o Pe. Cervellera, ao invés de "reconciliação" entre a Associação Patriótica e a Igreja clandestina ou subterrânea, com o acordo provisório entre a China e o Vaticano para a nomeação de bispos, "há uma grande pressão sobre a comunidade subterrânea com forte interferência na vida da Igreja", uma pressão que cresce a cada dia e deixa os fiéis católicos no país sem opções.

A ACI recorda que quando voltava de sua viagem à Letônia, Lituânia e Estônia, no final de setembro de 2018, o Papa Francisco disse aos jornalistas na entrevista realizada a bordo do avião que o trazia de regresso a Roma:

"Eu sou responsável" pelo acordo entre Vaticano e China. Na ocasião, Francisco ainda disse que sobre os bispos chineses que não estavam em comunhão com a Igreja até antes do acordo: "foram estudados caso por caso. Para cada bispo fizeram um expediente e estes expedientes chegaram à minha escrivaninha. E eu fui o responsável por assinar cada caso dos bispos".

Quanto ao acordo assinado entre China e Vaticano, o Pontífice afirmou que "a coisa é feita em diálogo, mas nomeia Roma, nomeia o Papa. Isso está claro. E rezamos pelos sofrimentos de alguns que não entendem ou que têm nas costas muitos anos de clandestinidade". (ARM)

(Da Redação Gaudium Press, com informações ACI Prensa)