Ao Venerado Irmão, Senhor Cardeal William J. Levada, Presidente da Pontifícia Comissão Bíblica:
É com prazer que lhe transmito, bem como ao secretário e a todos os membros da Pontifícia Comissão Bíblica, a minha cordial saudação por ocasião da anual Assembleia Plenária.
Esta Comissão reuniu-se pela terceira vez, ocupando-se do tema que lhe foi confiado: Inspiração e Verdade da Bíblia.
Palavra de Deus em palavras humanas
Esta temática constitui um dos pontos principais da minha Exortação apostólica pós-sinodal Verbum Domini, que o aborda na parte inicial.[1]
“Um conceito-chave – escrevi neste documento – para receber o texto sagrado como Palavra de Deus em palavras humanas é, sem dúvida, o da inspiração”. [2]
Precisamente a inspiração, como atividade de Deus, faz com que nas palavras humanas se manifeste a Palavra de Deus.
Por conseguinte, o tema da inspiração é “decisivo para uma adequada abordagem das Escrituras e para a sua correta hermenêutica”.[3]
Com efeito, uma interpretação dos Escritos sagrados que descuida ou esquece a sua inspiração não tem em consideração a sua característica mais importante e preciosa, a sua proveniência de Deus.
Tal interpretação não acede e não faz aceder à Palavra de Deus com palavras humanas e, por conseguinte, perde o tesouro inestimável que a Sagrada Escritura contém para nós.
Este gênero de abordagem ocupa-se de palavras meramente humanas, embora possam ser, de modo diferenciado segundo os diversos escritos, palavras de uma profundidade e beleza extraordinárias.
No debate sobre a inspiração, trata-se da natureza íntima e do significado decisivo e distintivo da Sagrada Escritura, ou seja, precisamente da sua qualidade como Palavra de Deus.
Aprofundar na dinâmica da inspiração conduz a melhor compreender a verdade
Além disso, nessa mesma Exortação apostólica eu recordava que
os Padres sinodais puseram em evidência como ao tema da inspiração está ligado também o tema da verdade das Escrituras.
Por isso, um aprofundamento da dinâmica da inspiração levará, sem dúvida, também a uma maior compreensão da verdade contida nos livros sagrados.[4]
Em conformidade com a Constituição conciliar Dei Verbum, Deus dirige-nos a sua palavra para “Se revelar a Si mesmo e dar a conhecer o mistério da sua vontade (cf. Ef 1, 9)”.[5]
Mediante a sua Palavra, Deus quer comunicar-nos toda a verdade sobre Si mesmo e sobre o seu desígnio de salvação para a humanidade.
Por conseguinte, o compromisso de descobrir cada vez mais a verdade dos Livros sagrados equivale a procurar conhecer sempre melhor Deus e o mistério da sua vontade salvífica.
A reflexão teológica sempre considerou inspiração e verdade como dois conceitos-chave para uma hermenêutica eclesial das Sagradas Escrituras.
No entanto, deve-se reconhecer a necessidade hodierna de um aprofundamento adequado destas realidades, para se responder melhor às exigências relativas à interpretação dos textos sagrados, segundo a sua natureza.[6]
Ao abordar o tema Inspiração e Verdade da Bíblia, a Pontifícia Comissão Bíblica é chamada a oferecer a sua contribuição específica e qualificada para este aprofundamento necessário.
Com efeito, para a vida e a missão da Igreja é essencial e fundamental que os textos sagrados sejam interpretados segundo a sua natureza: a Inspiração e a Verdade são características constitutivas desta mesma natureza.
Por isso, o vosso compromisso terá uma verdadeira utilidade para a vida e a missão da Igreja.
Só é possível compreender a Sagrada Escritura como um todo
Enfim, só gostaria de mencionar que numa boa hermenêutica não é possível aplicar de modo mecânico o critério da inspiração ou da verdade absoluta, extrapolando uma simples frase ou expressão.
O plano em que é possível compreender a Sagrada Escritura como Palavra de Deus é o da unidade da história de Deus, numa totalidade em que os elementos individuais se iluminam reciprocamente e se abrem à compreensão.
Enquanto formulo a cada um de vós os votos de uma fecunda continuação dos vossos trabalhos, enfim, gostaria de manifestar o meu profundo apreço pela atividade desempenhada pela Pontifícia Comissão Bíblica para promover o conhecimento, o estudo e o acolhimento da Palavra de Deus no mundo.
Com estes sentimentos, confio cada um de vós à salvaguarda materna da Virgem Maria que, juntamente com toda a Igreja, invocamos como Sedes Sapientiæ, e é de coração que lhe concedo, Venerado Irmão, bem como a todos os membros da Pontifícia Comissão Bíblica, uma especial Bênção Apostólica.