A primeira tarefa sobre a qual gostaria de falar hoje é o munus docendi, isto é, ensinar. Hoje, em plena emergência educativa, o munus docendi da Igreja, exercido concretamente através do ministério de cada sacerdote, resulta particularmente importante.
Vivemos numa grande confusão acerca das escolhas fundamentais da nossa vida e das interrogações sobre o que é o mundo, de onde viemos, para onde vamos, o que devemos fazer para praticar o bem, como devemos viver, quais são os valores realmente pertinentes.
Em relação a tudo isto existem muitas filosofias contrastantes, que nascem e desaparecem, criando confusão sobre as decisões fundamentais, como viver, porque já não sabemos, comumente, do que e para que somos feitos e para onde vamos.
Nesta situação realiza-se a palavra do Senhor, que teve compaixão da multidão porque eram como ovelhas sem pastor (cf. Mc 6, 34).
O Senhor tinha feito esta constatação quando viu os milhares de pessoas que O seguiam no deserto porque, na diversidade das correntes daquele tempo, já não sabiam qual fosse o verdadeiro sentido da Escritura, o que dizia Deus.
O Senhor, movido pela compaixão, interpretou a palavra de Deus – Ele mesmo é a palavra de Deus – e assim deu uma orientação.
Esta é a função in persona Christi do sacerdote: tornar presente, na confusão e na desorientação dos nossos tempos, a luz da palavra de Deus, a luz que é o próprio Cristo neste nosso mundo.
O sacerdote não fala de si mesmo, nem por si mesmo
Por conseguinte, o sacerdote não ensina as próprias ideias, uma filosofia que ele mesmo inventou, encontrou ou da qual gosta; o sacerdote não fala de si mesmo, não fala por si mesmo, talvez para criar admiradores ou um partido próprio.
O sacerdote não diz coisas próprias, invenções suas, mas, na confusão de todas as filosofias, o sacerdote ensina em nome de Cristo presente, propõe a verdade que é o próprio Cristo, a sua palavra, o seu modo de viver e de ir em frente.
Para o sacerdote vale o que Cristo disse sobre Si mesmo: “A minha doutrina não é minha” (Jo 7, 16); isto é, Cristo não se propõe a Si mesmo, mas, como Filho, é a voz, a palavra do Pai.
Também o sacerdote deve sempre dizer e agir assim: “A minha doutrina não é minha, não difundo as minhas ideias ou o que me agrada, mas sou boca e coração de Cristo e torno presente esta única e comum doutrina, que criou a Igreja universal e que cria vida eterna”.
Este fato, isto é, que o sacerdote não inventa, não cria e não proclama ideias próprias, porque a doutrina que anuncia não é sua, mas de Cristo, não significa, por outro lado, que ele seja neutro, quase como um porta-voz que lê um texto do qual, talvez, nem se apropria.
Também neste caso, vale o modelo de Cristo, que disse: Eu não sou para Mim e não vivo para Mim, mas venho do Pai e vivo para o Pai. Portanto, nesta identificação profunda, a doutrina de Cristo é a do Pai e Ele mesmo é um só com o Pai.
Profunda e interior comunhão com o próprio Cristo
O sacerdote que anuncia a palavra de Cristo, a Fé da Igreja e não as próprias ideias, deve dizer também: Eu não vivo por mim e para mim, mas vivo com Cristo e para Cristo, e, portanto, tudo aquilo que Cristo nos disse torna-se a minha palavra, não obstante não seja minha.
A vida do sacerdote deve identificar-se com Cristo e, deste modo, a palavra não própria torna-se, contudo, uma palavra profundamente pessoal.
Santo Agostinho, sobre este tema, falando acerca dos sacerdotes, disse: “E nós o que somos? Ministros (de Cristo), seus servidores; porque o que distribuímos a vós não é nosso, mas tiramo-lo da Sua despensa. E inclusive nós vivemos dela, porque somos servos como vós”.1
O ensinamento que o sacerdote é chamado a oferecer, as verdades da Fé, devem ser interiorizadas e vividas num intenso caminho espiritual pessoal, de forma que realmente o sacerdote entre numa profunda, interior comunhão com o próprio Cristo.
O sacerdote crê, acolhe e procura viver, antes de tudo como próprio, quanto o Senhor ensinou e a Igreja transmitiu, naquele percurso de identificação com o próprio ministério do qual São João Maria Vianney é testemunha exemplar.2 “Unidos na mesma caridade – afirma ainda Santo Agostinho – todos somos ouvintes d’Aquele que é para nós no Céu o único Mestre”.3
Por conseguinte, com frequência a voz do sacerdote poderia parecer “a de um que grita no deserto” (Mc 1, 3), mas exatamente nisto consiste a sua força profética: em nunca ser homologado, nem homologável, a alguma cultura ou mentalidade dominante.
Com efeito, deve mostrar a única novidade capaz de produzir uma autêntica e profunda renovação do homem, ou seja, que Cristo é o Vivente, é o Deus próximo, o Deus que age na vida e para a vida do mundo e nos doa a verdade, o modo de viver.
Na voz do autêntico sacerdote reconhece-se a do Bom Pastor
Na preparação atenta da pregação festiva, sem excluir a dos dias úteis, no esforço de formação catequética, nas escolas, nas instituições acadêmicas e, de modo especial, através daquele livro não escrito que é a própria vida, o sacerdote é sempre “professor”, ensina.
Mas não com a presunção de quem impõe as próprias verdades, mas com a humilde e jubilosa certeza de quem encontrou a Verdade, foi capturado e transformado por ela, e por conseguinte não pode deixar de a anunciar.
Com efeito, ninguém pode escolher o sacerdócio por si mesmo, não é um modo para alcançar a segurança na vida, para conquistar uma posição social: ninguém pode obtê-lo nem procurá-lo sozinho.
O sacerdócio é resposta ao chamamento do Senhor, à Sua vontade, para se tornar anunciadores, não de uma verdade pessoal, mas da sua verdade.
Queridos irmãos sacerdotes, o povo cristão pede para escutar nos nossos ensinamentos a genuína doutrina eclesial, através da qual se possa renovar o encontro com Cristo que doa a alegria, a paz e a salvação.
A Sagrada Escritura, os escritos dos Padres e dos Doutores da Igreja e o Catecismo da Igreja Católica constituem, a este propósito, pontos de referência imprescindíveis no exercício do munus docendi, tão essencial para a conversão, o caminho de Fé e a salvação dos homens.
“Ordenação sacerdotal significa: estar imersos (…) na Verdade”, 4 aquela Verdade que não é simplesmente um conceito ou um conjunto de ideias a transmitir e assimilar, mas que é a Pessoa de Cristo, com a qual, pela qual e na qual viver; assim, necessariamente, nasce também a atualidade e a compreensão do anúncio.
Só esta consciência de uma Verdade feita Pessoa na Encarnação do Filho justifica o mandato missionário: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda a humanidade” (Mc 15, 16). Somente sendo a Verdade, está destinado a toda criatura, não é uma imposição de algo, mas a abertura do coração àquilo pelo qual foi criado.
O exemplo de São João Maria Vianney
Queridos irmãos e irmãs, o Senhor confiou aos sacerdotes uma grande tarefa: ser anunciadores da sua Palavra, da Verdade que salva; ser a sua voz no mundo para levar aquilo que beneficia o bem verdadeiro das almas e o autêntico caminho de Fé (cf. I Cor 6, 12).
São João Maria Vianney seja exemplo para todos os sacerdotes.
Ele era homem de grande sabedoria e heroica força ao resistir às pressões culturais e sociais do seu tempo para poder guiar as almas para Deus: simplicidade, fidelidade e proximidade eram as características essenciais da sua pregação, transparência da sua fé e da sua santidade.
O povo cristão era edificado e, como acontece para os autênticos mestres de todos os tempos, reconhecia nele a luz da Verdade. Em resumo, reconhecia nele o que se deveria reconhecer sempre num sacerdote: a voz do Bom Pastor.