Era domingo, terminara a Missa. O zeloso sacerdote, muito estimado pelos seus paroquianos, convidou para vir à frente um ancião de aspecto venerável.

Depois de apresentá-lo como o mais querido amigo de sua já remota mocidade, manifestou o desejo de que ele saudasse os presentes e lhes dirigisse algumas palavras que julgasse proveitosas para uma piedosa reflexão.

Os fiéis fitavam com curiosidade o idoso senhor, que se mostrava pensativo, simples e despretensioso. Este, após os costumeiros cumprimentos iniciais, disse-lhes:

Eu quero contar-lhes um fato ocorrido há vários anos, a fim de tirarmos uma lição. Tenho certeza de que todos gostarão de ouvir esta narração.

Um pai de família, seu filho adolescente e um amigo deste navegavam num barco pelo mar quando foram surpreendidos por violenta tempestade.

Marinheiro experimentado, o pai tratou de regressar logo à praia. Mas era tarde… As ondas eram tão violentas que em pouco tempo ele perdeu o controle da embarcação. 

 Depois de quatro horas de intensa luta para se manter à tona, uma gigantesca onda varreu o frágil barco, arrastando para o mar os dois jovens. Já era noite. 

Sem tardança, o pai pegou a única boia de resgate que havia e teve de tomar a mais difícil decisão de sua vida: a qual dos dois jovens deveria ele lançar a boia?

Não tinha mais que alguns instantes para decidir. Sabia ele que seu filho era católico praticante, sério cumpridor dos Mandamentos; mas que seu amigo, infelizmente, não o era. 

Maior que o ímpeto das ondas no mar era a angústia da decisão a tomar, no coração desse pai.

Ele via os dois jovens a poucos metros um do outro e sabia bem que só conseguiria salvar um. Qual dos dois?! 

Foi, porém, curta sua hesitação. Com voz lancinante, bradou: “Ouça-me, meu filho, você conhece o imenso amor que lhe tenho. Ponha-se nas mãos de Deus e recomende-se a Maria Santíssima!”

E atirou a boia para o outro, salvando-o. Quanto ao filho, em poucos instantes desapareceu de sua vista, arrastado pelas ondas. Não se encontrou sequer seu cadáver.

Considerando com serenidade a ansiosa expectativa de seus ouvintes, o ancião tirou a seguinte conclusão do comovente drama narrado:

O pai sabia que seu filho, morrendo, iria para a eterna Bem-Aventurança com Nosso Senhor.

Mas temia pelo destino do seu amigo, pois este trilhava na vida o mau caminho. Foi por isso que decidiu abandonar seu filho ao sabor das ondas, para salvar a vida do outro.

Quão grande é o amor de Deus, que fez exatamente o mesmo por nós! Ele sacrificou seu Filho único para nossa salvação. 

Então, eu lhes suplico que façam sempre esta reflexão, sobre a oferta de resgate que Nosso Salvador oferece por todos os homens, todos os dias, no Sacramento da Eucaristia. Agarrem-se a essa divina boia!

Os assistentes retiraram-se aos poucos, em profundo silêncio. 

Na saída, um jovem que havia observado com especial atenção o velho homem ao longo de sua emocionante narrativa, aproximou-se dele e lhe perguntou:

— Foi uma bonita história que o senhor nos contou, e ela nos ajuda a compreender melhor o amor que Deus provou ter aos homens, entregando seu Divino Filho pela salvação de cada um de nós. Mas será que esse pai viu bem a realidade naquele trágico instante em que decidiu deixar morrer afogado seu filho, com a esperança de que o outro se convertesse? E o outro se converteu?

Expressando em sua fisionomia dor e, ao mesmo tempo, alegria, o homem respondeu com doçura:

— Compreendo o que você diz, meu caro jovem. Pode ser que ele não tivesse visto bem a realidade no angustiante momento de tomar aquela terrível decisão. É bem possível. Mas tenho algo mais a lhe dizer: é que esse pai sou eu, e o amigo de meu filho é o seu pá­roco…