Beatíssimo Padre, sou o Pe. José Eduardo de Oliveira e Silva, e venho do Brasil.

Com toda a boa vontade, procuramos suprir as necessidades de uma sociedade muito mudada, já não inteiramente cristã, mas percebemos que nossa ação não é suficiente. Por onde ir, Santidade? Em qual direção?

[…] Penso ser importante, sobretudo, para os fiéis, ver que o sacerdote não é apenas um empregado, com algumas horas de trabalho e que depois fica livre e vive somente para si mesmo, mas que é um homem apaixonado por Cristo, portador do fogo do amor de Cristo.

Se os fiéis o virem cheio da alegria de Cristo, compreenderão também que ele não pode fazer tudo, aceitarão suas limitações e o ajudarão.

Os pilares do nosso sacerdócio

Isto me parece o ponto mais importante: poder perceber e experimentar que o pároco sente-se realmente um homem chamado pelo Senhor, cheio de amor a Deus e aos seus. Se houver isso, compreende-se que é impossível fazer tudo.

Portanto, a primeira condição é estar cheio da alegria do Evangelho, com todo o nosso ser. Depois se devem fazer as opções, definir as prioridades, ver o que é possível ou impossível.

Eu diria que conhecemos as três prioridades fundamentais: são os três pilares do nosso ser sacerdote.

Primeiro, a Eucaristia, os Sacramentos: tanto quanto possível, proporcionar a todos a Eucaristia, sobretudo a dominical, e celebrá-la de modo a tornar realmente visível o ato de amor de Deus por nós.

Segundo, o anúncio da Palavra em todas as dimensões: desde o diálogo pessoal até a homilia.

O terceiro ponto é a “caritas”, o amor de Cristo: estar junto aos sofredores, aos pequenos, aos meninos, às pessoas em dificuldades, aos marginalizados: tornar presente, de fato, o amor do Bom Pastor.

Não negligenciar a própria alma

Além disso, uma prioridade muito importante é o relacionamento pessoal com Cristo.

No Ofício Divino de 4 de novembro, lemos um belo texto de São Carlos Borromeo, grande pastor que realmente se deu por inteiro, e que nos diz a todos nós, sacerdotes: “Não descuides de tua própria alma; se descuidares de tua alma, não poderás dar aos outros o que deves dar. Portanto, também para ti mesmo, para tua alma, é preciso reservar um tempo”.

Em outras palavras, o relacionamento com Cristo, o colóquio pessoal com Cristo é uma prioridade fundamental, é condição para nosso trabalho em favor dos outros! 

E a oração não é algo secundário: rezar é propriamente a “profissão” do sacerdote, inclusive como representante das pessoas que não sabem ou não têm tempo de rezar.

A prece pessoal, sobretudo a Liturgia das Horas, é nutrição fundamental para nossa alma, para toda a nossa atuação.

Por fim, reconhecer nossas limitações, abrir-nos também a essa humildade.

Recordamos uma cena do Evangelho de Marcos na qual os discípulos estão “estressados”, querendo fazer tudo, e o Senhor lhes diz: “Vinde à parte, para algum lugar deserto, e descansai um pouco” (Mc 6, 31).

Até isso é um trabalho, diria eu, pastoral: encontrar e ter a humildade, a coragem de repousar. Penso, pois, que a paixão pelo Senhor, o amor ao Senhor, nos mostra as prioridades, as opções, ajuda-nos a encontrar o caminho. O Senhor nos ajudará.

A verdadeira Teologia provém do amor de Deus

Santidade, sou Mathias Agnero e venho da Costa do Marfim. Parece-nos que se criou uma ruptura entre teologia e doutrina, e mais ainda, entre teologia e espiritualidade.

A consequência é a proliferação de opiniões subjetivas que permitem a entrada, mesmo na Igreja, de um pensamento não católico.

Como fazer para não nos desorientarmos em nossa vida e em nosso ministério quando é o mundo que julga a Fé, e não vice-versa? 

O senhor toca num problema muito difícil e doloroso. Há realmente uma teologia que procura, sobretudo, ser acadêmica, parecer científica, e esquece a realidade vital, a presença de Deus, sua presença entre nós, sua maneira de falar nos dias de hoje, não somente no passado.

A arrogância da razão

Já São Boaventura distinguia no seu tempo duas formas de teologia. Disse ele: “Há uma teologia que provém da arrogância da razão, quer dominar tudo, faz Deus passar de sujeito ao objeto que estudamos, quando Ele deveria ser sujeito que nos fala e nos guia”.

Existe realmente esse abuso da teologia, que é arrogância da razão e não nutre a fé, mas obscurece a presença de Deus no mundo.

Há também uma teologia desejosa de conhecer mais, por amor ao amado, é estimulada pelo amor, guiada pelo amor, quer conhecer melhor o amado. Essa é a verdadeira teologia, que provém do amor de Deus e deseja entrar mais profundamente em comunhão com Cristo.

De fato, são grandes as tentações hoje; sobretudo, impõe-se a assim chamada “visão moderna do mundo” (Bultmann, “modernes Weltbild”), que se torna o critério de tudo quanto seria possível ou impossível.

E assim, com esse critério de que tudo é como sempre, de que todos os acontecimentos históricos são do mesmo gênero, exclui-se precisamente a novidade do Evangelho, exclui-se a irrupção de Deus, a verdadeira novidade que é a alegria da nossa Fé.

Insuficiência e debilidade do positivismo

O que fazer? Antes de tudo, eu diria aos teólogos: “Tenham coragem”. E gostaria de dizer também “muito obrigado” a tantos teólogos que fazem um bom trabalho.

Há abusos nessa matéria – nós o sabemos –, mas em todas as partes do mundo há muitos teólogos que vivem verdadeiramente da Palavra de Deus, nutrem-se da meditação, vivem a Fé da Igreja e querem colaborar para que a Fé esteja presente em nossos dias.

A esses teólogos, gostaria de dizer um grande “obrigado”.

Aos teólogos em geral, eu diria: “Não tenham medo desse fantasma da cientificidade!”. Eu comecei a estudar teologia em janeiro de 1946.

Vi, portanto, quase três gerações de teólogos e posso dizer: as hipóteses que naquele tempo, e depois nos anos 60 e 80, eram as mais novas, absolutamente científicas, quase dogmáticas, envelheceram nesse ínterim e não valem mais! Muitas delas parecem quase ridículas.

Tenham, portanto, a coragem de resistir à aparente cientificidade, de não submeter-se a todas as hipóteses do momento, mas de pensar realmente a partir da grande Fé da Igreja, que está presente em todos os tempos e nos dá acesso à verdade.

Sobretudo, não pensem que a razão positivista, a qual exclui o transcendente – que não pode ser acessível –, é a verdadeira razão. Essa razão débil que apresenta apenas as coisas experimentais é de fato uma razão insuficiente.

Nós, teólogos, devemos usar a razão ampla, aberta à grandeza de Deus. Devemos ter a coragem de ir para além do positivismo, até a questão das raízes do ser. Isto me parece de grande importância.

É necessário, portanto, ter a coragem da razão grande, ampla, ter a humildade de não submeter-se a todas as hipóteses do momento, de viver da grande Fé da Igreja de todos os tempos. Não existe uma maioria contra a maioria dos Santos: a autêntica maioria é a dos Santos na Igreja, e pelos Santos devemos nos orientar!

A Igreja garante a presença da Palavra de Deus

Digo o mesmo aos seminaristas e sacerdotes: tomem em consideração que a Sagrada Escritura não é um livro isolado: é vivente na comunidade viva da Igreja, que é o mesmo sujeito em todos os séculos e assegura a presença da Palavra de Deus.

O Senhor deu-nos a Igreja como sujeito vivo, com a estrutura dos Bispos em comunhão com o Papa, e essa grande realidade dos Bispos do mundo em comunhão com o Papa nos garante o testemunho da verdade permanente.

Temos confiança nesse Magistério permanente da comunhão dos Bispos com o Papa, que nos representa a presença da Palavra. Além disso, confiamos também na vida da Igreja e, sobretudo, devemos ser críticos.

Certamente a formação teológica – gostaria de dizer isso aos seminaristas – é muito importante.

Em nosso tempo, devemos conhecer bem a Sagrada Escritura, inclusive contra os ataques das seitas; precisamos ser, de fato, amigos da Palavra.

Devemos conhecer também as opiniões de nossa época, para poder responder racionalmente, para poder dar “razão da nossa Fé”, como diz São Pedro.

O Catecismo contém a síntese da nossa Fé

A formação é muito importante. Mas devemos ser igualmente críticos: o critério da Fé serve para ver também os teólogos e a teologia.

O Papa João Paulo II deu-nos um critério absolutamente seguro, no Catecismo da Igreja Católica: vemos ali a síntese da nossa Fé, e esse Catecismo é deveras o critério para observarmos aonde vai uma teologia aceitável ou não aceitável.

Recomendo, pois, a leitura, o estudo desse texto, e podemos assim avançar com uma teologia crítica no sentido positivo, isto é, crítica contra as tendências da moda e aberta às verdadeiras novidades, à profundidade inexaurível da Palavra de Deus, que se revela nova em todos os tempos, inclusive no nosso.

O celibato é um grande sinal da Fé

Santo Padre, sou Karol Miklosko, venho da Eslováquia e sou missionário na Rússia.

Com suas naturais dificuldades, o celibato parece-me óbvio, olhando para Cristo, mas sinto-me perturbado ao ler tantas críticas mundanas a esse dom.

Peço-lhe humildemente, Santo Padre, que nos ilumine sobre a profundidade e o autêntico significado do celibato eclesiástico.

[…] Nesse sentido, o celibato é uma antecipação. Transcendamos este tempo e avancemos, e nos “lancemos” assim, nós mesmos e o nosso tempo, rumo ao mundo da ressurreição, rumo à novidade de Cristo, rumo à nova e verdadeira vida.

O celibato é, pois, uma antecipação possibilitada pela graça do Senhor que nos “arrasta” para Si, rumo ao mundo da ressurreição; convida-nos sempre de novo a transcendermos a nós mesmos, a este presente, rumo ao verdadeiro presente do futuro, que se torna presente hoje.

E chegamos aqui a um ponto muito importante. Um grande problema da cristandade no mundo de hoje é que não se pensa mais no futuro de Deus: parece que é suficiente apenas o presente deste mundo.

Queremos ter apenas este mundo, viver apenas neste mundo. Assim, fechamos as portas à verdadeira grandeza de nossa existência.

O significado do celibato como antecipação do futuro é precisamente abrir essas portas, tornar maior o mundo, mostrar a realidade do futuro vivido por nós já como presente.

Viver assim, portanto, num testemunho da Fé: creio realmente que Deus existe, que entra na minha vida, que posso alicerçar minha vida em Cristo, na vida futura. 

O “sim” do celibato confirma o “sim” do matrimônio

E conheçamos agora as críticas mundanas, das quais o senhor falou. É verdade que, para o mundo agnóstico, o mundo sem Deus, o celibato é um grande escândalo, porque mostra que Deus é considerado e vivido como realidade.

Com a vida escatológica do celibato, o mundo futuro de Deus entra nas realidades do nosso tempo. E isso deveria desaparecer!

Em certo sentido, essa crítica permanente contra o celibato pode surpreender, numa época em que cada vez mais está na moda não casar-se.

Mas esse não casar-se é total e fundamentalmente diferente do celibato, porque baseia-se na vontade de viver só para si mesmo, de recusar qualquer vínculo definitivo, de levar uma vida de inteira autonomia, de decidir a todo instante como fazer, que coisa colher da vida.

É, portanto, um “não” ao vínculo, um “não” ao definitivo, um possuir a vida apenas para si mesmo.

O celibato é exatamente o contrário: é um “sim” definitivo, um deixar-se tomar nas mãos por Deus, entregar-se nas mãos do Senhor, no seu “eu”.

É, pois, um ato de fidelidade e de confiança, um ato que supõe também a fidelidade do matrimônio; é precisamente o contrário daquele “não”, daquela autonomia que não quer obrigar-se, que não quer aceitar um vínculo; é propriamente o “sim” definitivo que supõe e confirma o “sim” definitivo do matrimônio.

E esse matrimônio é a forma bíblica, a forma natural do ser homem e mulher, fundamento da grande cultura cristã, das grandes culturas do mundo.

E se isso desaparecer, estará destruída a raiz da nossa cultura. Desse modo, o celibato confirma o “sim” do matrimônio com o seu “sim” ao mundo futuro, e assim queremos avançar e tornar presente esse escândalo de uma Fé cuja existência inteira está baseada em Deus.

A força de nossa vida se alicerça em Cristo Jesus

Sabemos que, a par desse grande escândalo que o mundo não quer ver, há também os escândalos secundários das nossas insuficiências, dos nossos pecados, que obscurecem o verdadeiro e grande escândalo e fazem pensar: “Mas eles não vivem realmente com fundamento em Deus!”.

Mas há tanta fidelidade! O celibato – as próprias críticas o demonstram – é um grande sinal da Fé, da presença de Deus no mundo.

Roguemos ao Senhor que nos ajude a nos livrarmos dos escândalos secundários, para tornar presente o grande escândalo da nossa Fé: a confiança, a força da nossa vida, que se alicerça em Deus e em Cristo Jesus! 

 

Excertos do Colóquio do Santo Padre com os sacerdotes, 10/6/2010 – Tradução: Arautos do Evangelho.