Para realizar a tarefa da nova evangelização na América Latina, segundo um processo que impregna todo o ser e o agir do cristão, não se pode pôr de lado as múltiplas demonstrações da piedade popular.

Todas, bem focalizadas e oportunamente acompanhadas, propiciam um encontro fecundo com Deus, uma intensa veneração do Santíssimo Sacramento, uma profunda devoção à Virgem Maria, um alimentar o afeto pelo Sucessor de Pedro e uma tomada de consciência de pertença à Igreja.

Que tudo sirva também para evangelizar, comunicar a fé, aproximar os fiéis aos Sacramentos, reforçar os vínculos de amizade e de união familiar e comunitário, assim como para incrementar a solidariedade e o exercício da caridade.

A fé tem que ser a fonte principal da piedade popular

Por conseguinte, a fé tem que ser a fonte principal da piedade popular, para que esta não se reduza a uma simples expressão cultural de uma determinada região.

Além disso, deve estar em estrita relação com a sagrada Liturgia, que não pode ser substituída por expressão religiosa alguma.

Neste sentido, não se pode esquecer – como afirma o Diretório sobre a piedade popular e a Liturgia, publicado pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos – que

Liturgia e piedade popular são expressões cultuais que devem ser postas em recíproca e fecunda relação: porém, a Liturgia deverá constituir o ponto de referência para “focalizar com lucidez e prudência os anseios de oração e de vida carismática” que se encontram na piedade popular.

Por sua vez a piedade popular, com os seu valores simbólicos e expressivos, poderá proporcionar à Liturgia algumas coordenadas para uma válida inculturação e estímulos para um eficaz dinamismo criador. [1]

Devoção pela Virgem Maria, fonte de inesgotável esperança

Na piedade popular encontram-se muitas expressões de fé ligadas às grandes celebrações do ano litúrgico, em que a população simples da América Latina reafirma o amor que sente por Jesus Cristo, no qual encontra a manifestação da proximidade de Deus, da sua compaixão e misericórdia.

São numerosos os santuários dedicados à contemplação dos mistérios da infância, Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor, e a Ele se dirigem multidões de pessoas para colocar nas suas mãos divinas os seus sofrimentos e alegrias, pedindo ao mesmo tempo abundantes graças e implorando o perdão dos seus pecados.

Intimamente unida a Jesus está também a devoção dos povos da América Latina e do Caribe pela Santíssima Virgem Maria. Ela, desde os alvores da evangelização, acompanha os filhos deste continente e é para eles fonte de inesgotável esperança.

Por isso, recorre-se a Maria como Mãe do Salvador, para sentir constantemente a sua proteção amorosa, sob muitas devoções.

Da mesma forma, os Santos são considerados como estrelas luminosas que constelam o coração de numerosos fiéis daqueles países, edificando-os com o seu exemplo e protegendo-os com a sua intercessão.

A piedade popular deve ser sempre purificada

Todavia, não se pode negar que existem algumas formas desviadas de religiosidade popular que, em vez de promover uma participação ativa na Igreja, pelo contrário criam mais confusão e podem favorecer uma prática religiosa meramente exterior e desvinculada de uma fé bem enraizada e interiormente viva.

Neste sentido, quero recordar aqui o que escrevi aos seminaristas no ano passado:

A piedade popular tende para a irracionalidade e, às vezes, talvez mesmo para a exterioridade.

No entanto, excluí-la, é completamente errado.

Através dela, a fé entrou no coração dos homens, tornou-se parte dos seus sentimentos, dos seus costumes, do seu sentir e viver comum. Por isso a piedade popular é um grande patrimônio da Igreja. A fé fez-se carne e sangue.

Sem dúvida a piedade popular deve ser sempre purificada, referida ao centro, mas merece a nossa estima; de modo plenamente real, ela faz de nós mesmos “Povo de Deus”.[2]

 

Excerto do Discurso aos participantes na Assembleia Plenária da Pontifícia Comissão para a América Latina, 8/4/2011.

[1]  CONGREGAÇÃO para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Diretório sobre a piedade popular e a Liturgia, n.58.
[2] Carta aos seminaristas, 18 de outubro de 2010, n.4.