Desde os primeiros séculos, a mãe da Santíssima Virgem Maria, Santa Ana, foi venerada na Igreja Oriental.

Na Liturgia Romana, a festa foi introduzida no século XII, propagada pelas cruzadas, e teve o apogeu nos séculos XIV e XV, em correlação com a devoção à Imaculada Conceição de Maria.

Sobre os pais de Maria, não nos dizem nada os Evangelhos Canônicos.

Sobre tal questão, diz muito sutilmente o Padre Luís Francisco de Argentan, capuchinho do século XVII:

"Se as grandezas de Maria tiveram o pai e a mãe como fontes, era necessário que aparecessem como primeiros, a fim de que espalhassem os raios da própria glória sobre Ela, como o Sol comunica a luz aos astros que o rodeiam.

Todavia, esta ordem é invertida, porque a Santa Virgem recebeu toda a glória de Jesus Cristo, seu Filho, e, pois, São Joaquim e Santa Ana receberam muito maior glória da Filha, pela qual levam esta incomparável vantagem sobre o resto dos Santos, de ser os mais próximos parentes, segundo a carne, do Salvador do mundo, uma vez que são verdadeiramente pai e mãe da Virgem Maria."

Vida de Santa Ana e São Joaquim

Se os quatro inspirados Evangelistas não se referiram a Santa Ana e a São Joaquim, não ficaram os pais de Maria, entretanto, totalmente apagados: três Evangelhos apócrifos falam dos dois Bem-aventurados Santos: o Proto-Evangelho de Tiago, o Evangelho do pseudo-Mateus e o Evangelho da Infância.

Segundo o primeiro deles, cuja composição é olhada como muitíssimo antiga, Joaquim e Ana eram piedosos e ricos israelitas da Tribo de Judá, possuidores de grandes rebanhos.

Não tinham filhos, e isto, para os judeus, era motivo de ignomínia.

Um dia, Joaquim, que foi ao Templo apresentar uma oferenda, viu-a, tristíssimo, ser recusada pelo sacerdote, justamente por causa da esterilidade da esposa.

Arrasado pelo sucedido, o bom homem, ao invés de voltar para casa, buscou a montanha com seus rebanhos, desesperado.

Durante cinco meses, ninguém, nem mesmo a esposa, ouviu falar de Joaquim.

Desaparecera, e dele, notícia alguma chegava ao lugar em que vivia.

A dor de Ana foi imensa.

Dir-se-ia que enviuvara.

Mas um dia, quando, como de costume, fazia suas preces, um Anjo apareceu-lhe para enchê-la de alegria: Joaquim, muito breve, tornaria, e ambos, novamente juntos, haveriam de ter o que tanto desejavam: um filho.

Joaquim, na montanha, também recebeu aquele enviado de Deus, que lhe prometeu a mesma alegria, e lhe ordenou que descesse e voltasse para a esposa.

Quando o Santo se aproximava, tornou o Anjo a visitar Ana, dizendo-lhe que o marido se avizinhava e, pois, fosse-lhe ao encontro, na Porta Dourada.

Ana, deslumbrada, toda numa alegria sem par, deixou a casa correndo e se precipitou nos braços do esposo.

Assim, exultando, voltaram para o lar, a bendizer a Deus incessantemente.

Nove meses mais tarde, nasceu-lhes uma filha, a qual deram o nome de Maria.

Com Maria, o início da realização da promessa divina

Nasceu-lhes aquela Maria sublime, pela qual "grandes coisas fez Aquele que é poderoso", aquela Maria sublime que

"resplandeceu de tal abundância de dons celestes, de tal plenitude de graça e de tal inocência, que Se tornou como que o milagre de Deus por excelência ante a culminância de todos os seus milagres, e digna Mãe de Deus, de modo que, colocada tanto quanto é possível a uma criatura, como a mais próxima de Deus, Ela Se tornou superior a todos os louvores dos homens e dos Anjos",

a Maria sublime que, com o auxílio divino, quebrou, inutilizou a violência e o poder da serpente.

Nasceu-lhes o Lírio entre os espinhos, a Terra absolutamente intacta, virginal, ilibada, imaculada, sempre abençoada e livre de todo contágio de pecado, "da qual foi formado o novo Adão".

Nasceu-lhes o Jardim

"ordenadíssimo, esplêndido, ameníssimo, de inocência e de imortalidade, delicioso, plantado por Deus mesmo e defendido de todas as insídias da serpente venenosa".

Nasceu-lhes o Lenho "que o verme do pecado jamais corroeu".

Nasceu-lhes a Fonte sempre límpida, o Templo diviníssimo, o Escrínio da imortalidade.

Nasceu-lhes a Corredentora dos homens, a Medianeira poderosíssima, o Caminho mais seguro e mais fácil para Jesus, a que sofre por nossa causa, a Mulher vestida do sol, que tinha a Lua debaixo dos seus pés e uma coroa de doze estrelas sobre a cabeça, a qual, estando grávida, clamava com dores de parto e sofria tormentos para dar à luz (Ap 12, 1-2).

Que parto?

Por certo o nosso, pois que, retidos neste degredo, carecemos de nascer para o perfeito amor de Deus e felicidade eterna.

As dores do parto que nos estão a demonstrar o amor ardente com que Maria zela e trabalha, lá no Céu, por suas preces incessantes para levar o número dos eleitos à sua plenitude.

Glória de ser avó de Jesus

Quando a Menina completou dois anos, Joaquim disse a Ana:

— Conduzamo-La ao Templo do Senhor, a fim de cumprir o voto que formulamos. 

Ana respondeu:

— Esperemos até o terceiro ano, porque talvez a Menina venha a procurar o pai e a mãe.

Joaquim concordou, dizendo:

— Esperemos.

Quando Maria entrou nos três anos de vida, foi desmamada, e Joaquim disse:

— Chamai as jovens virgens Santas de Israel. Que cada qual tome uma lâmpada e a tenha acesa, para que a Menina não volte atrás e seu coração não se apegue às coisas de fora do Templo do Senhor.

E assim foi feito.

A glória maior de Santa Ana reside no fato de ter sido mãe da Imaculada.

Foi esposa modelo, humilde, casta, submissa a Deus em tudo, e ao marido.

Devotadíssima à Filha, colaborou com a obra do Espírito Santo para fazer frutificar os dons maravilhosos daquela alma.

Avó de Jesus!

Eis uma nova, imensa glória, porque de Santa Ana veio o ser humano de Maria, e de Maria todo o ser humano de Jesus.

E não foi no seio de Santa Ana que se cumpriu o mistério da Imaculada Conceição, que se deu o prelúdio da Encarnação e da Redenção?

Maria, por uma aplicação antecipada do Sacrifício de Jesus, não foi a primeira alma resgatada e, assim, a primeira vitória de seu Filho?

Tudo se cumpriu no seio de Santa Ana. E

"tudo o que podia ficar profanado, maculado na herança carnal dos reis de Judá, escreveu Osbert de Clare, beneditino inglês, foi inteiramente purificado na carne Santa da gloriosa e Bem-aventurada Ana".

Representação de Santa Ana

A iconografia da Santa Mãe de Deus seguiu fielmente os progressos da ciência teológica.

Até o século XIII, os artistas representaram-na naquela cena comovente que se efetuou na Porta Dourada.

A partir daquele século, com o avanço da crença na Imaculada Conceição, novos temas surgiram.

No fim da Idade Média, tendo aprendido dos místicos que Jesus conhecera a avó aqui na terra, os artistas entraram a representá-Lo entre ela e Maria.

Assim apareceram as mais belas obras em que figura Santa Ana.

Curiosas esculturas que representam Santa Ana levando ao colo Maria, que, por sua vez, traz consigo, nos braços, o Divino Filho.

A mais comum das representações, todavia, é a da Santa tendo a Filha pela mãe, mostrando-lhe o Livro da Lei, sempre sóbria, de rosto grave, mas sereno, doce e benfazejo rosto das avós.