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História da Igreja


Misteriosa pré-figura do Sacerdote Eterno
 
AUTOR: PE. MILLON BARROS DE ALMEIDA, EP
 
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Rei e sacerdote, Melquisedec desperta nossa curiosidade pela sua misteriosa história. Quem era este singular personagem que São Paulo evoca como pré-figura de Cristo?

Tu és sacerdote eternamente segundo a ordem de Melquisedec”. Estas palavras do Salmo 109 são proclamadas pela liturgia da Igreja durante a cerimônia de ordenação presbiteral, no momento em que os novos ministros são revestidos dos ornamentos sagrados para a celebração do Santo Sacrifício.

Não foi por mero acaso que assim dispôs a Esposa Mística de Cristo. Ao ressaltar a pessoa de Melquisedec, prefiguração do Eterno Sacerdote, quis ela ajudar os fiéis a melhor compreenderem a sublimidade desse ministério, que torna a quem o recebe capaz de agir in persona Christi Capitis.1 Analisemos, pois, com esse objetivo, alguns aspectos da misteriosa personagem que surge diante dos nossos olhos no início da História Sagrada.

No Antigo e no Novo Testamento

A figura de Melquisedec aparece na Sagrada Escritura em três lugares: no Livro do Gênesis, no mencionado Salmo 109 e na Epístola aos Hebreus. Este último escrito tem como objetivo mostrar a superioridade do sacerdócio de Jesus Cristo sobre o mosaico e, para tal, São Paulo vai apresentar Melquisedec como pré-figura de Nosso Senhor.

Comecemos por lembrar a história, tal como nos é narrada pelo Gênesis: “Voltando Abrão da derrota de Codorlaomor e seus reis aliados, o rei de Sodoma saiu-lhe ao encontro no vale de Savé, que é o vale do rei. Melquisedec, rei de Salém e sacerdote do Deus Altíssimo, mandou trazer pão e vinho, e abençoou Abrão, dizendo: ‘Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, que criou o céu e terra! Bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus inimigos em tuas mãos!’. E Abrão lhe deu o dízimo de tudo” (14, 17?20).

A descrição feita pelo Gênesis não podia ser mais sucinta e misteriosa. Um rei-sacerdote de Salém, que nunca mais aparecerá na História Sagrada, desperta nossa curiosidade e alimenta o desejo de procurarmos saber mais a respeito desse personagem.

Pré-figura do Rei da Justiça e da Paz

O principal dado fornecido pelo Gênesis para identificarmos Melquisedec é o nome da terra sobre a qual reinava: Salém, identificada pela tradição judaica e cristã com a cidade de Jerusalém.

O Salmo 76, explicam os professores de Salamanca na sua célebre Bíblia Comentada, “considera Salém e Sião como sinônimos. No Salmo 110 compara-se Melquisedec com o Rei que deve reinar em Sião, a antiga colina chamadaMelquisedec - Basílica de São Vital - Ravena (Itália).jpgJerusalém. […] Salém seria, pois, um diminutivo que conserva apenas a última parte do nome”.

Melquisedec era, portanto, rei da cidade da paz,4 e assim o considera São Paulo em sua Epístola aos Hebreus ao afirmar que ele era “rei de Salém, isto é, ‘rei de paz'” (7, 2b). Mas o Apóstolo desvenda uma nova e importante característica da singular personagem ao acrescentar que era, “conforme seu nome indica, primeiramente ‘rei de justiça'” (7, 2a).

Estes dois atributos, ensina o Doutor Angélico, aproximam a pré-figura do Figurado. O nome Melquisedec “significa rei de justiça e designa Jesus Cristo, que foi Rei: ‘Suscitarei a Davi um germe justo, e reinará um Rei que será sábio e praticará a equidade e a justiça na Terra’ (Jr 23, 5). Ele não é apenas chamado de justo, mas também de Rei de Justiça, porque Se tornou sabedoria e justiça para nós (cf. I Cor 1, 30)”.5 Além do mais, continua São Tomás,6 a Cristo pertence também o título de Rei da Paz, pois, conforme diz o Apóstolo: “Ele é a nossa paz” (Ef 2, 14), e o salmista: “Nos seus dias aparecerá a justiça e a abundância da paz” (Sl 71, 7).

Séculos depois, o Papa Bento XVI enriquecerá ainda mais estas reflexões ao lembrar que “a verdadeira Jerusalém, a Salém de Deus, é o Corpo de Cristo, a Eucaristia é a paz de Deus com o homem”.

Aspectos singulares desta misteriosa figura

No texto do Gênesis, acima mencionado, Melquisedec é qualificado de rei e sacerdote, usando para isso, pela primeira vez na Sagrada Escritura, a palavra hebraica Cristo, que foi Rei: ‘Suscitarei a Davi um germe será sábio e praticará a equidade e a justiça apenas chamado de justo, mas também de Rei sabedoria e justiça para nós (cf. I Cor 1, 30)”.Tomás,6 a Cristo pertence também o título de o Apóstolo: “Ele é a nossa paz” (Ef 2, 14), aparecerá a justiça e a abundância da paz” (Sl 71, Séculos depois, o Papa Bento XVI enriquecerá reflexões ao lembrar que “a verdadeira Jerusalém, Corpo de Cristo, a Eucaristia é a paz de Deus com a salvação.

Outro traço importante: contrariamente aos costumes mosaicos instituídos depois, este rei-sacerdote não oferece animais, mas sim pão e vinho, justamente as matérias escolhidas pelo Divino Salvador para operar a transubstanciação. Eis porque o Cânon Romano, depois da Consagração, na oração Supra quæ, menciona entre outras prefigurações de Cristo “Melquisedec, sumo sacerdote do Deus Altíssimo, que leva pão e vinho”.

São Paulo ressalta ainda outro aspecto misterioso do rei-sacerdote de Salém: “Sem pai, sem mãe, sem genealogia, a sua vida não tem começo nem fim” (Hb 7, 3). Por certo, não ignorava o Apóstolo que Melquisedec  teve um pai e uma mãe, e morrera. Entretanto, deseja ele ressaltar que, se tais pormenores foram omitidos no Gênesis, foi por permissão divina, a fim de mais aproximá-lo do Filho de Deus, nele prefigurado, e mostrar como a origem do sacerdócio de Nosso Senhor Jesus Cristo não é da ordem levítica.

Ordenação presbiteral realizada na Basílica de Nossa Senhora do Rosário em 22-8-2014.jpg
O Novo Testamento está latente no Antigo, e o Antigo está patente no
Novo, ensina-nos o Concílio Vaticano II

Neossacerdotes são revestidos com os paramentos durante a cerimônia
de ordenação presbiteral realizada na Basílica de Nossa Senhora
do Rosário, em 22/8/2014

Comentando este trecho da Epístola aos Hebreus, São Tomás ressalta a semelhança de Melquisedec com o Salvador: “Há para tudo isso uma razão, pois quando se diz ‘sem pai’, assinala-se o nascimento de Cristo de uma Virgem, sem concurso de homem. ‘O que n’Ela foi concebido, é obra do Espírito Santo’ (Mt 1, 20). […] No concernente à geração eterna, diz o Apóstolo: ‘sem mãe’, para não se imaginar que essa geração é material, assim como a mãe dá ao filho o ser material, mas é toda espiritual, assim como o esplendor procede do Sol. […] ‘Sem genealogia’. Por dois motivos não vem indicada na Escritura sua genealogia. Primeiro, para assinalar que a geração de Cristo é inefável: ‘Quem poderá relatar sua geração?’ (Is 53, 8). Segundo, para pôr em realce que Cristo, que é introduzido como sacerdote, não pertence à tribo de Levi nem à genealogia da Lei Antiga. Esta é a intenção do Apóstolo”.9

Segundo a ordem de Melquisedec

Vemos assim a relação entre Melquisedec e Nosso Senhor Jesus Cristo. O Novo Testamento está latente no Antigo, e o Antigo está patente no Novo, ensina-nos o Concílio Vaticano II,10 acrescentando que os livros do Antigo Testamento “iluminam e explicam” o Novo Testamento. Assim, depois de termos analisado a prefiguração, podemos observar a divina Figura de modo mais iluminado.

De todas essas verdades depreendem-se a grandeza e a beleza do sacerdócio de Cristo Senhor nosso. Considerando atentamente as características do tipo, temos mais elementos para de algum modo entrever a perfeição do Arquétipo. E, desta forma, podemos amar mais Aquele que é “Sacerdote segundo a ordem de Melquisedec” (Sl 109, 4). (Revista Arautos do Evangelho, Abril/2015, n. 160, pp. 22 a 24)

 
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