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Catecismo


Como educar a geração digital?
 
AUTOR: PE. FERNANDO NÉSTOR GIOIA OTERO, EP
 
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Uma corrente de educadores propõe aproveitar ao máximo os recursos da tecnologia digital no ensino, para aprimorar a formação dos jovens. Defrontam-se eles, entretanto, com um sério problema...

Certo dia, recebi de um amigo uma charge representando um adolescente com seu avô, que se encontrava lendo o jornal. O jovem perguntava-lhe:

   — O que usava o senhor quando não existiam as modernas máquinas de calcular?

   — Ora essa!… A cabeça – respondeu o avô, fixando no neto um olhar benevolente.

   Esta graciosa resposta de um homem que viveu na época do ábaco, das máquinas de escrever Remington, dos quadros-negros rabiscados de giz e das penas de aço mergulhadas no tinteiro, ilustra bem um tema muito discutido hoje no mundo da educação.

   Ampliando um pouco as vistas, a charge nos introduz no problema das gerações atuais, “submersas” desde tenra idade nos aparelhos digitais de comunicação, a ponto de quase podermos dizer que eles fazem parte indispensável de suas vidas. São os chamados “nativos digitais”.

Surge uma nova “civilização digital”

   Na Exortação apostólica Evangelii nuntiandi, Paulo VI ressaltou que, com frequência, o homem hodierno se mostra saturado de discursos, cansado de ouvir e até mesmo imunizado contra a palavra. Isto era dito há mais de quarenta anos! Segundo ele, numerosos psicólogos e sociólogos “afirmam ter o homem moderno ultrapassado já a civilização da palavra, a qual se tornou praticamente ineficaz e inútil, e estar a viver, hoje em dia, na civilização da imagem”.1

   E a cada dia o quadro fica mais complexo. Não poucos educadores, nascidos e formados quando a tecnologia não havia ainda atingido seu desenvolvimento atual, são qualificados desdenhosamente de “imigrantes digitais” ou “transplantados digitais”. Encontram-se, assim, numa situação nova e difícil, cheia de perplexidades, numa verdadeira encruzilhada educacional e até vivencial.

   Eles foram acostumados a ensinar com base na teoria, mas se defrontam com jovens que perderam o costume de raciocinar e se sentem asfixiados num mundo que não atende a seus anelos. Se os professores das novas gerações se limitarem a aplicar os métodos habituais de ensino, jamais conseguirão resolver o intrincado problema em que eles vivem. O mundo mudou, o homem mudou… É preciso irmos à procura de novos métodos, adaptados às realidades atuais.

   A isso se soma que, como observou João Paulo II, “as modernas tecnologias aumentam de maneira impressionante a velocidade, a quantidade e o alcance da comunicação, mas não favorecem de igual modo aquele intercâmbio frágil entre uma mente e outra, entre um coração e outro”.2

   Vivemos, em consequência, na era do domínio dos tablets, dos computadores e outros modernos aparelhos digitais. Neste campo, o progresso da tecnologia é tão acelerado que, pouco tempo depois de ser posto à venda nas lojas, o produto “supernovo” já estará ultrapassado por outro “mais atualizado”.

Os educadores devem entrar em diálogo com os jovens,
conhecer suas preocupações e problemas, discernir suas
apetências de alma
Curso de férias na Casa Monte Carmelo, Caieiras

   Surge assim uma “civilização digital”, constituída por gerações cada vez mais influenciadas pela pura sensação, em entrechoque com o pensamento e os valores morais de outrora. Nesta nova conjuntura, uma educação meramente doutrinária, teórica, estará fadada ao fracasso. Torna-se necessária uma urgente atualização dos métodos de formação, de ensino, para os “nativos digitais”, ou seja, os jovens nascidos na era digital em que vivemos.

Predominância dos sentidos e das impressões

  Uma corrente de educadores propõe aproveitar ao máximo os recursos da “civilização digital” para aprimorar a formação dos jovens. Defrontam-se eles, entretanto, com o problema de que adolescentes e até crianças acabam sendo influenciados, para não dizer hipnotizados, pelos modernos aparelhos de comunicação e com frequência os utilizam em prejuízo de terceiros, ou para ver coisas indevidas que por eles circulam. Chega-se à alarmante situação de uma verdadeira “dependência digital”, que parece irrefreável e exerce efeitos psicológicos preocupantes. Calcula-se que cerca de 50% dos adolescentes têm alguma dependência do telefone celular.

   Acontece, assim, que o uso indiscriminado de tais aparelhos vai transformando as pessoas em meros robôs. Intoxicadas pelo uso constante, acabam por se tornar viciadas. Lentamente, vão perdendo o que poderíamos chamar de identidade própria e se deixando dirigir por outrem, à maneira de robôs. Não é mais preciso memorizar ou pensar. Basta digitar algumas palavras e pressionar uma tecla para obter resposta imediata às perguntas. Os livros físicos, antes um bem precioso, tornaram-se supérfluos. O “uso da cabeça” – como dizia o avô da caricatura acima mencionada – fica completamente obsoleto. Decorre daí uma séria dificuldade para o estudo, a leitura, o raciocínio.

   Sintetizando magistralmente essa situação, Mons. João Scognamiglio Clá Dias escrevia: “essa tendência à predominância dos sentidos e das impressões sobre o raciocínio foi sendo alimentada pela difusão universal da televisão e dos aparelhos eletrônicos de todo tipo, que favorecem unicamente a sede de novidade, de novas impressões, sem o concurso do pensamento. A sucessão veloz de imagens e dos fatos nem permite a devida análise da razão. O homem contemporâneo vive, assim, de sensações”.3

O que move são os tipos humanos

   Que métodos de ensino usar, então, com as gerações dos “nativos digitais”?

   Se voltarmos os olhos para os Santos Evangelhos encontraremos neles a divina pedagogia usada por Nosso Senhor Jesus Cristo. Sendo Ele “o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14, 6) podia apresentar- -Se como modelo perfeito a ser seguido, a personificação daquilo que Ele ensinava a seus discípulos e às multidões que O seguiam. E assim o fazia. Doutrinava sempre através de parábolas, de exemplos tirados da vida diária. E seus ensinamentos eram em forma de conversa, coisa que vai desaparecendo em nossos dias, precisamente pela irrupção dos aparelhos digitais.

   Os educadores devem, portanto, ilustrar suas exposições teóricas com vídeos, projeções de fotos, representações teatrais, etc., de forma a mostrar exemplos concretos, em uma linguagem compreensível aos jovens atuais. Devem entrar em diálogo com eles, conhecer suas preocupações e problemas, discernir suas apetências de alma. Na “civilização digital” a formação consiste, mais do que tudo, na apresentação de modelos a imitar.

   Afirmava Paulo VI: “O homem contemporâneo escuta com mais boa vontade as testemunhas do que os mestres, ou então, se escuta os mestres, é porque eles são testemunhas”. 4

   O que move as pessoas são os tipos humanos, os testemunhos de vida. Eis a chave para a educação da juventude atolada nos instrumentos de comunicação digitais. (Revista Arautos do Evangelho, Setembro/2016, n. 178, pp. 40 à 41)

1 BEATO PAULO VI. Evangelii nuntiandi, n.42. 2 SÃO JOÃO PAULO II. Carta apostólica O rápido desenvolvimento, n.13. 3 CLÁ DIAS, EP, João Scognamiglio. Por ocasião do Ano Sacerdotal, sugestões dos Arautos do Evangelho à Congregação para o Clero, 24/6/2009. 4 BEATO PAULO VI. Discurso aos membros do Conselho dos Leigos, 2/10/1974: AAS 66 (1974), 568.

 
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