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Plinio Corrêa de Oliveira


Fonte de paz e serenidade
 
PUBLICADO POR ARAUTOS - 04/06/2019
 
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O ano de 1939 chegava ao fim, imerso nos dramas e tragédias da Segunda Grande Guerra. O desenrolar dos acontecimentos e convulsões que abalavam o mundo naquela conturbada época era acompanhado passo a passo por Dª Lucilia, pois ela bem percebia sua importância deles para o futuro da Igreja e da Civilização Cristã.

Tal como no primeiro conflito mundial, também desta vez a opinião pública brasileira estava dividida. Porém, não só por motivo de preferências culturais. Havia um fator ideológico do qual, em consciência, não se podia abstrair: estando em questão doutrinas condenadas pela Igreja, é vedado a um católico dar-lhes qualquer tipo de apoio.

Certo dia, uma pessoa dos círculos familiares de Dª Lucilia, ao visitá-la, declarou-se favorável ao nazismo, manifestando o desejo de sua vitória em todo o mundo. E, como se isso não bastasse, introduziu um tema de índole diversa, ao afirmar ser o divórcio medida indispensável para a solução dos casos extremos em que os cônjuges não conseguem mais levar vida em comum.

Essas afirmações contundiam de frente a doutrina católica. E Dª Lucilia, sempre tão afável, passou a defender com energia os bons princípios, dando origem a uma acalorada discussão. Ergueu a voz a ponto de ser ouvida na sala ao lado onde Dr. Plinio preparava uma aula a ser dada na Faculdade Sedes Sapientiae sem no entanto perder o aprumo e a dignidade. Era sempre o mesmo amor de Deus que, de um lado, a movia aos maiores extremos de bondade e, de outro, a uma não menor rejeição ao mal.

Demora preocupante

Os acontecimentos da Europa, convulsionada pela guerra, alimentavam o fervilhar das polêmicas no Brasil. Das páginas do Legionário Dr. Plinio fazia uma tribuna, do alto da qual denunciava os adversários da Igreja.

Dona Lucilia, que seguia com olhar atento as atividades de seu filho, bem avaliava os perigos pelos quais ele passava. Numa ocasião em que os ânimos estavam mais acirrados, Dr Plinio chegou a ser ameçado de morte. Por isso, à noite, Dª Lucilia nunca se deitava antes de seu filho ter chegado em casa. Quando ele demorava mais do que o habitual, com certa aflição despertava Dr. João
Paulo e, para movê-lo a tomar alguma medida, lhe perguntava:

– Plinio não está demorando?

Como bom nordestino, mais dado ao otimismo e à despreocupação, o marido procurava sossegá-la dizendo:

– Senhora! ele chega a qualquer momento.

Esse otimismo, graças certamente às fervorosas orações de Dª Lucilia, nunca foi desmentido pelos fatos, naquelas circunstâncias.

Porém, a bonomia de seu esposo não era suficiente para tranqüilizá-la, e ela replicava:

– Não!… Ninguém sabe o que pode acontecer…

E continuava a rezar, confiante na proteção da Providência. Às vezes, quando a saúde o exigia, recostava-se na cama e mantinha a luz acesa, esperando que o ruído dos passos firmes de seu filho anunciasse o fim da vigília. Depois que Dr. Plinio a cumprimentava e ela verificava com os próprios olhos a integridade física dele, se o tempo ainda o permitisse, iniciava uma pequena prosa para saber novidades do dia, como havia corrido o trabalho, o apostolado…

Dr. João Paulo, a fim de convencer seu filho a chegar mais cedo, contava-lhe, por vezes, os temores de Dª Lucilia com aquelas demoras. Porém, para Dr. Plinio as obrigações para com a Causa da Igreja tinham precedência, e em nada permitiam mudar seus horários. Dona Lucilia compreendia bem que isto não podia ser de outro modo e nunca se queixava, oferecendo pelo esposo e pelos filhos, ao Sagrado Coração de Jesus, o sacrifício que aquela situação representava.

Uma noite, porém, as horas foram escoando e Dr. Plinio não aparecia. Sempre que poderia ocorrer algum atraso, ele prevenia sua mãe. No entanto, naquela noite não recebera ela qualquer aviso. Bem podemos imaginar quantas e quão sombrias conjecturas passaram pela mente de Dª Lucilia. Teria ocorrido algum acidente com seu filho, ou sofrera ele algum atentado? Como sempre fazia nas ocasiões de angústia, recorreu ao Sagrado Coração de Jesus e, aos pés da imagem do Divino Redentor, ora sentada, ora em pé, lá foi desfiando com serenidade e confiança as contas do rosário.

Quando as primeiras claridades da aurora começaram a afugentar as trevas, cerca das cinco da manhã, Dr. Plinio afinal chegou. Ainda não terminara ele de dar a volta completa à chave na fechadura e já Dª Lucilia se dirigia ao hall de entrada para o receber. Às angústias da longa espera, sucederam-se as alegrias de o ver ali são e salvo. Por isso mesmo, antes de lhe fazer qualquer pergunta, recebeu-o com carinho. Após os primeiros instantes de evidente alívio, perguntou-lhe:

– Mas, meu filho, o que você fez até agora?

Dr. Plinio explicou-lhe o motivo de tão prolongada demora: dois religiosos para cuja Ordem advogava foram naquela noite ao seu escritório para tratar de alguns assuntos. A Ordem à qual pertenciam era um de seus melhores clientes. Como os padres apreciavam uma boa prosa, terminada a consulta, iniciaram uma conversa que se prolongou até as quatro e meia da manhã.

Dona Lucilia, ainda um pouco inconformada, replicou surpresa:

– Mas, padres, até essa hora na rua!?

– Sim, senhora. E era minha obrigação atendê-los.

Se não fosse por outras razões, boa parte de minha advocacia depende deles.

Tranquilizada pela explicação, Dª Lucilia resolveu ir se deitar, não sem antes agradecer ao Sagrado Coração de Jesus por nada de grave haver acontecido.

Magnanimidades de outrora

Entre os diversos fatinhos que, sem perder palavra, Dª Lucilia ouvia com gosto dos lábios de seu filho, vem aqui a propósito outro, também relacionado com o Conselheiro João Alfredo.

Tendo acabado de assistir à Missa, certo dia, na Catedral de São Paulo, Dr. Plinio se encontrava junto à porta de saída, quando dele se aproximou um senhor de idade, ainda robusto, modestamente trajado, com roupas muito gastas. Manifestou com amabilidade a Dr. Plinio o desejo de cumprimentá-lo e conhecê-lo pessoalmente, pois sabia ser ele sobrinho-neto do Conselheiro
João Alfredo.

Contou-lhe que este causara seu empobrecimento, ao fazer aprovar a Lei Áurea. Explicou que naquela ocasião ele era fazendeiro e dono de escravos, e com a libertação destes justamente na época da colheita do café, perdera a mão-de-obra e nunca mais conseguira recuperar-se do prejuízo sofrido.

O senhor veja como estou vestido disse ele. Apesar de tudo, gostaria de cumprimentá-lo e expressar-lhe minha admiração pelo João Alfredo, pelo bem que ele fez aos escravos.

Dr. Plinio o saudou efusivamente. Ao voltar para casa, relatou o ocorrido a uma ouvinte que, como ninguém, sabia avaliar os belos e virtuosos gestos… Ela, muito agradada com aquela atitude, teceu elogios à rara magnanimidade do fazendeiro empobrecido, o qual, sem dúvida, foi beneficiado por suas orações.

A presença repousante de Dª Lucilia

Os encargos do escritório de advocacia somavam-se às diversas outras tarefas que Dr. Plinio já desempenhava. Com efeito, além de exercer o magistério e de ser diretor de uma imobiliária, entregara-se de alma inteira à atividade apostólica, que muito o absorvia.

A justa nomeada que alcançara como líder católico obrigava-o a comparecer a grande número de atos públicos nos meios religiosos, sendo com freqüência convidado a fazer discursos e conferências nos mais variados ambientes.

Apesar de tão intensos trabalhos, nunca saía de casa sem antes se despedir de Dª Lucilia e de lhe dizer aonde ia. Ela o abraçava, beijava e depois lhe dava a bênção. Certo dia, porém, Dª Lucilia notou que Dr. Plinio saíra sem dela se despedir. Apenas encontrou, em local visível, um bilhete, encimado por uma pequena cruz sob a qual se liam as iniciais do lema de Santo Inácio: Ad Majorem Dei Gloriam.

Mãezinha de meu coração,

Há perto de três semanas, marquei para hoje à noite, às oito e meia, uma conferência na Escola Paulista de Medicina, na Vila Clementino.

Depois esqueci-me da data. Ontem me telefonaram lembrando. E eu lá vou com grande antecedência (…).

Por isto, meu amorzinho, lhe deixo mil e mil dos mais saudosos beijos, pedindo-lhe desculpas, e prometendo voltar logo que termine, para matar as saudades.

Em outro dia ocorreu o contrário. Dr. Plinio não aparecera de manhã, à hora habitual, para dizer a ela bom dia. O tempo passava e ele não dava qualquer sinal de vida. Dona Lucilia mandou a empregada verificar o que ocorria não demorou: a porta do quarto estava fechada e tudo permanecia em silêncio. Desta vez, não era nenhuma doença que o prostrara na cama, mas o cansaço por uma vida muito atarefada. Ela disse então à criada que batesse na porta e passasse por baixo um bilhete, que escreveu, com o seguinte apelo:

Plinio, você já perdeu a aula, vê se não perde também o emprego! Levanta-te já, peço-te.

Na verdade, a fadiga que alquebrava Dr. Plinio não era só, nem principalmente, fruto dos muitos trabalhos, mas sim das incontáveis batalhas em defesa da Fé. Porém, se o combate levado a cabo com entusiasmo lhe pesava nos ombros, a simples presença de sua mãe compensava tudo, constituindo um bálsamo de suavidade. Sentia-o de modo especial quando chegava a casa, vindo do escritório, ocasião em que lhe era mais patente o choque entre o frenesi da rua e as bênçãos do lar.

Passava Dª Lucilia boa parte do dia rezando ou lendo, sentada na cadeira de balanço outrora pertencente a Dª Gabriela. Ao seu redor se criava uma atmosfera de indizível tranqüilidade, o oposto do mundo agitado e tormentoso que se movia fora de casa. Era como se uma campânula invisível, colocada por um anjo, protegesse aquele ambiente do conturbado torvelinho da vida. Quem nele penetrasse, sentia a alma pervadida pela paz. Uma paz mais repousante que duas ou três horas de descanso… (Transcrito, com adaptações, da obra Dona Lucilia, de Mons. João S. Clá Dias)(Revista Dr. Plinio, Maio/2002, n. 50, pp. 10 a 13).

 
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