O congresso de Rocca di Papa - 2006
Fundadores e dirigentes de cerca de 100 Movimentos e Comunidades, membros de vários dicastérios e dezenas de bispos participaram do Congressso de Rocca di Papa, em 2006.
Juan Carlos Casté
O encontro com o Papa foi o ápice do II Congresso Mundial dos Movimentos Eclesiais e Novas Comunidades, promovido pelo Pontifício Conselho para os Leigos, realizado de 31 de maio a 2 de junho. O local foi o Centro "Mondo Migliore", na pitoresca cidade de Rocca di Papa, situada numa bela paisagem diante do Lago Lugano, nas cercanias de Roma.
Esse Centro está sob os cuidados da Congregação dos Oblatos de Maria Virgem, fundada em 1826 pelo Venerável Pio Bruno Lanteri, cujo sapiencial discernimento levou à organização das "Amicizie" - associações de sacerdotes e leigos para defender os princípios e direitos da Igreja, ameaçados no período das invasões napoleônicas na Itália. O Congresso teve como tema "A beleza de ser cristão e a alegria de comunicá-la", inspirado nas palavras do Papa Bento
Vista geral do auditório durante uma das sessões do Congresso Victor Toniolo |
XVI na homilia de 24 de abril de 2005, quando iniciava seu pontificado: "Nada há mais belo do que ter sido alcançados, surpreendidos pelo Evangelho, por Cristo. Nada há mais belo do que conhecê- Lo e comunicar aos outros a amizade com Ele". Participaram cerca de 300 fundadores e dirigentes de aproximadamente 100 Movimentos e Comunidades, membros de vários dicastérios da Cúria Romana e dezenas de bispos. Notavam-se também delegados de várias confissões cristãs, presença que se insere no esforço do Papa para reconstituir a unidade eclesial entre todos os batizados. O ambiente reinante era de alegria, de certeza de sucesso na nova evangelização, e de amizade fraterna entre os representantes dos diversos grupos, todos abertos a se conhecerem melhor e colaborarem nesse grande empreendimento conjunto, que consiste em fazer do terceiro milênio uma era verdadeiramente cristã. É sempre uma experiência animadora tomar parte em reuniões nas quais, no meio dos mais diversos carismas, formas de ser e missões, há um forte senso de comunhão eclesial.
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Excertos da conferência do Cardeal Christoph Schönborn OP, Arcebispo de Viena
Cristo, fonte viva de toda beleza
Toda beleza criada é uma participação na beleza infinita do ser de Deus. Se isso é verdadeiro, precisamos ir adiante e dizer que o Verbo, fazendo-Se carne, por assim dizer "encarnou" a bondade e o amor, a verdade e a beleza infinitas de Deus. Cristo é "o mais belo dos filhos do homem" não por causa de suas qualidades estéticas particulares, mas porque é a beleza encarnada de Deus. Todo o seu ser é amor e verdade, bondade e beleza.
Assim, se é verdade que Cristo pode dizer de Si mesmo: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida", pode com toda a razão dizer "Eu sou a Beleza". Cristo pode dizer de Si próprio o que só Deus pode dizer: "Eu sou". O Ser, a Verdade e o Bem são, segundo o termo escolástico, "convertíveis". Se Cristo é a Verdade e a Bondade, é também aquilo que é seu esplendor, a Beleza: Splendor Veritatis, Splendor Boni!
As sementes de beleza que Cristo semeia crescem e dão fruto
Ouso vos exprimir uma convicção que é uma intuição a qual, creio, verifica-se de mil modos: "Ali onde está Cristo, ali está a beleza". Onde os corações, os espíritos, as vidas se abrem a Cristo, ali as comportas da beleza se abrem e se derramam como torrentes vivificantes sobre um mundo aviltado pelo pecado, desfigurado pela feiúra do mal.
Todas as belezas do mundo, sejam as da natureza, sejam as da virtude ou da arte, são irradiações da beleza de Cristo |
Há dois mil anos que isso se verifica, e acho que todo o sentido de nosso simpósio preparatório para o encontro de Pentecostes consiste no seguinte: olhar como as sementes de beleza que Cristo semeia crescem e dão fruto.
Beleza e arte sagrada
Paro por aqui, com duas questões que me deixam inquieto.
Primeira: Por que tanta arte sagrada em nossos dias é tão feia? O Museu do Vaticano, no tocante à arte sagrada moderna, deixa-me perplexo e até estupefato. Que aconteceu para que a arte sacra esteja tão longe das grandes expressões do passado? Será o resultado da crise geral da arte, da cultura de nosso tempo? Será necessário reaprender a encontrar as expressões do Mistério de Cristo em artistas que podem parecer distantes da fé? Haverá sinais de uma retomada autêntica da arte inspirada pelo Mistério de Cristo?
Segunda: Por que a liturgia perdeu tanto o senso da beleza? Por que tanto mau gosto em tudo o que cerca a celebração do Mistério da Fé? Não deveria ela dar origem à mais bela das belezas? De onde vem esse "pauperismo", esse "miserabilismo" em tantas de nossas expressões litúrgicas? É a perda do senso do sagrado? Ou é, mais profundamente, um enfraquecimento da presença, da percepção do Mistério de Cristo? Falta-nos o enraizamento em Cristo, fonte da Beleza, e a própria Beleza
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Excerto da conferência do Cardeal Marc Ouellet, Arcebispo de Québec
Beleza de ser cristãos, em união com Maria
Repleta de Graças, gratia plena, em latim. Por que ter escolhido este nome na parte mais central de nossa reflexão? Porque n'Ela encontramos a beleza do "todo no fragmento", retomando outro título do grande mestre suíço (Hans Urs von Balthasar). O todo - ou seja, Deus, a Igreja, a família - numa mulher preservada de toda mancha original, perfeitamente transparente do amor divino, coroada de estrelas em meio às dores do parto da vida eterna em nós. Uma mulher, Maria de Nazaré, Mãe de Deus e Mãe da Igreja, que vive em nós, seus filhos, e derrama em nós sua beleza incomparável.
Beleza de Maria, beleza de ser cristãos na união com Ela, porque aquilo que Ela possui como privilégio único, Ela esparge integralmente sobre nós, por sua perfeita correspondência ao Espírito trinitário que A habita. O Espírito Santo é em Deus a Glória do Amor (São Gregório de Nissa). Ele Se dá e Se eclipsa entre o Pai e o Filho para glorificar seu mútuo amor. Assim Maria, a Filha de Sion, vive na unidade da Igreja, em pericorese com o povo de Deus, desde que Ela foi elevada à categoria de Esposa do Cordeiro por sua permanência de pé junto à Cruz. Maria compartilhou então profundamente, na noite da Fé, o abandono do Filho de Deus, tornando-se, assim, associada a esse abandono e, em conseqüência, fecunda n'Ele e por Ele de todas as graças que procedem da Cruz e se derramam sobre as almas.
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Excertos da conferência do Cardeal Angelo Scola, Patriarca de Veneza
Respeito à diversidade
O cristão é chamado a dar testemunho do evento encontrado, isto é, a auto- expor- se no seguimento de Jesus Cristo no rastro do carisma participado e objetivamente garantido pela autoridade. (...)
Essa urgência de auto-exposição pessoal se jogará inevitavelmente a partir do específico estado de vida. O modo pelo qual um fiel casado, participando do carisma encontrado, se exprimirá concretamente na vida da Igreja e na sociedade não será idêntico ao dos que seguem Jesus na virgindade consagrada. O de um sacerdote pertencente a uma sociedade de vida apostólica, ou a formas análogas nascidas da experiência de um Movimento, não será o mesmo daquele de um sacerdote diocesano que também participa do mesmo carisma. (...) Falando de prioridades e perspectivas, é preciso evitar o grave risco de aprovações indevidas. Para a missão dos movimentos e das Novas Comunidades, não existe um caminho único que deva ser percorrido por todas essas realidades. Sem essa advertência, recairíamos na tentação de querer emaranhar Movimentos e Novas Comunidades nas malhas do "já sabido", fazendo-lhes perder a providencial e provocativa diversidade para a qual o Espírito os chama. Como princípio, não se deve impedir ao Espírito a maior variedade de configurações testemunhais, desde que se fique dentro do objetivo fulcral do regimen communionis da Igreja. Isso indica, entre outras coisas, que o tempo está maduro para reconhecer que a ação e a reflexão sobre a missão dos novos Movimentos na Igreja não pode mais ser considerada um capítulo estável em si mesmo, mas deve necessariamente desenvolver-se no interior da Igreja universal e das Igrejas particulares, na comum sinfonia de todas as agrupações de fiéis, inclusive as clássicas. Isso - e é o segundo ponto de relevo - impõe a coragem e a paciência de saber descobrir novas formas.
(Revista Arautos do Evangelho, Julho/2006, n. 55, p. 19 à 21)