Caros irmãos e irmãs, nossa reunião nesta tarde para encetar o caminho do Advento se enriquece com outro importante motivo: queremos, com toda a Igreja, celebrar solenemente uma vigília de orações pela vida nascente.
Desejo exprimir meus agradecimentos a todos quantos aceitaram esse convite e a todos que se dedicam especificamente a acolher e proteger a vida humana nas diversas situações de fragilidade, sobretudo no seu início e nos seus primeiros passos.
O começo do Ano Litúrgico leva-nos precisamente a viver de novo a espera de Deus que Se encarna no seio da Virgem Maria, de Deus que Se faz pequeno, torna-Se menino; fala-nos da vinda de um Deus próximo, que quis percorrer a vida do homem, desde o princípio, para salvá-la totalmente, em plenitude.
Assim, o mistério da Encarnação do Senhor e o início da vida humana estão íntima e harmonicamente conexos entre si no seio do único desígnio salvífico de Deus, Senhor da vida de todos e de cada um.
A Encarnação nos revela com intensa clareza e de modo surpreendente que toda vida humana tem uma dignidade altíssima, incomparável.
Deus nos faz partícipes de sua própria vida divina
O homem apresenta uma originalidade inconfundível em relação a todos os outros seres vivos existentes na Terra.
Apresenta-se como sujeito único e singular, dotado de inteligência e vontade livre, e composto de realidade material. Vive simultânea e indissoluvelmente na dimensão espiritual e na dimensão corpórea.
Sugere isto também o texto da Primeira Carta aos Tessalonicenses, aqui proclamado: “O Deus da paz” – escreve São Paulo – “vos conceda santidade perfeita. Que todo o vosso ser, espírito, alma e corpo, seja conservado irrepreensível para a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo!” (I Tes 5, 23).
Somos, pois, espírito, alma e corpo. Fazemos parte deste mundo, ligados às possibilidades e às limitações da condição material; somos ao mesmo tempo abertos a um horizonte infinito, capazes de dialogar com Deus e de acolhê-Lo em nós.
Agimos na realidade terrena e através dela podemos perceber a presença de Deus e tender para Ele, verdade, bondade e beleza absolutas. Saboreamos fragmentos de vida e de felicidade, e anelamos pela plenitude.
Deus nos ama de maneira profunda, total, sem distinções; convida-nos à amizade com Ele; faz-nos partícipes de uma realidade que ultrapassa toda imaginação, pensamento e palavra: a sua própria vida divina.
Dignidade incomparável da pessoa humana
Com emoção e gratidão, tomamos consciência do valor, da dignidade incomparável de toda pessoa humana e de nossa grande responsabilidade para com todos.
“Cristo, que é o novo Adão” – afirma o Concílio Vaticano II –,
na própria revelação do mistério do Pai e do seu amor, desvela também plenamente o homem a si mesmo e lhe manifesta sua altíssima vocação. [...] Com sua Encarnação, o Filho de Deus uniu-Se de certo modo a todo homem.[1]
A fé em Jesus Cristo comporta também um olhar novo a respeito do homem, um olhar de confiança, de esperança.
Aliás, a própria experiência e a reta razão atestam que o ser humano é um sujeito capaz de entender e de querer, autoconsciente e livre, irrepetível e insubstituível, vértice de todas as realidades terrenas, que exige ser reconhecido como valor em si mesmo e merece sempre ser acolhido com amor e respeito.
Tem ele o direito de não ser tratado como um objeto a ser possuído ou uma coisa que se pode manipular ao bel-prazer, de não ser reduzido a mero instrumento em benefício de outros e dos seus interesses.
A pessoa é um bem em si mesma e deve-se sempre procurar seu desenvolvimento integral. E o amor para com todos, se é sincero, tende espontaneamente a tornar-se atenção preferencial para os mais débeis e os mais pobres.
Sob esse ponto de vista se posiciona a solicitude da Igreja pela vida nascente, a mais frágil, a mais ameaçada pelo egoísmo dos adultos e pelo obscurecimento das consciências.
A Igreja reafirma sem cessar o que declarou o Concílio Vaticano II contra o aborto e qualquer violação da vida nascente: “A vida, uma vez concebida, deve ser protegida com o máximo cuidado”.[2]
Respeito à vida nascente: responsabilidade de todos
Há tendências culturais que procuram anestesiar as consciências com motivações baseadas em pretextos.
A propósito do embrião no ventre materno, a própria ciência põe em evidência sua autonomia capaz de interagir com a mãe, a coordenação dos processos biológicos, a continuidade do desenvolvimento, a crescente complexidade desse organismo.
Não se trata de uma acumulação de material biológico, mas de um novo ser vivente, dinâmico e maravilhosamente ordenado, um novo indivíduo da espécie humana.
Assim esteve Jesus no seio de Maria; assim esteve cada um nós no seio da respectiva mãe. Podemos afirmar com o antigo autor cristão Tertuliano: “É já um homem aquele que o será”;[3] não há razão alguma para não o considerar como uma pessoa desde sua concepção.
Infelizmente, mesmo após o nascimento, a vida das crianças continua a ser exposta ao abandono, à fome, à miséria, à doença, aos abusos, à violência, à exploração.
As múltiplas violações de seus direitos, que se cometem no mundo, ferem dolorosamente a consciência de todo homem de boa vontade.
Perante o triste panorama das injustiças cometidas contra a vida do homem, antes e depois do nascimento, faço meu o apaixonado apelo do Papa João Paulo II à responsabilidade de todos e de cada um: “Respeita, ama e serve a vida, toda vida humana! Somente neste caminho encontrarás justiça, progresso, verdadeira liberdade, paz e felicidade”.[4]
Exorto os protagonistas da política, da economia e das comunicações sociais a fazer o quanto estiver ao seu alcance para promover uma cultura sempre respeitosa da vida humana.
Para procurar condições favoráveis e redes de apoio à sua acolhida e ao seu desenvolvimento.
do Advento, o Santo Padre celebrou na Basílica de São Pedro a “Vigília pela vida nascente”