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A Fé e a razão no mistério da Santíssima Trindade
 
AUTOR: LUCAS ALVES GRAMISCELLI
 
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A Revelação feita por Deus contém verdades que os homens, com sua razão limitada apenas, jamais alcançarão. Uma delas é o mistério da Santíssima Trindade.

Sabemos que “a Fé e a razão constituem como que as duas asas pelos quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade” [1]. Entretanto, qual é o papel da razão sobre os mistérios? Não é somente através da Fé que devemos acreditar neles, visto que são verdades que estão além de nossa inteligência? Apesar dos mistérios serem tão grandiosos às vistas humanas, estas verdades não são contrárias à nossa razão, visto que nada é mais razoável do que crer nos mistérios Revelados por meio daquele que é a Verdade. Por isso explicitou São Justino: “a fé e a razão não podem se contradizer, pois a verdade é uma, tendo sua fonte única em Deus e em seu Logos, seu Verbo, que ele comunica aos homens desde a origem”. [2]

Antes do bispo de Hipona começar a tecer suas considerações sobre a Trindade, ele nos dá uma advertência importantíssima acerca dos que não possuem um equilíbrio entre Fé e a razão; vejamos o que nos diz o santo:

Quem se entregar à leitura do que escrevemos sobre a Trindade, deve ter em conta, primeiramente, que nossa pena está atenta para repelir as falsas afirmações daqueles que, desprezando os princípios da fé, deixam-se enganar por um imaturo e desordenado amor pela razão. [3]

Depois de enunciar tais pensamentos, o santo prossegue de uma maneira categórica afirmando que há pessoas que pensam – pelo menos, aparentemente – apoiados na natureza da alma humana ou em seus sentimentos, e em consequência são levados a fixar regras falsas e falazes em suas doutrinas, ao discorrerem sobre Deus.[4]

Vestígios da Trindade, pequeno auxílio para a razão

Santo Agostinho utiliza uma passagem do Livro da Sabedoria para mostrar que através das coisas criadas podemos chegar até Deus:

São insensatos por natureza todos os que desconheceram a Deus, e, através dos bens visíveis, não souberam conhecer Aquele que é, nem reconhecer o Artista, considerando suas obras. […] pois é a partir da grandeza e da beleza das criaturas que, por analogia, se conhece o seu autor (Sb 13, 1.5).

Portanto, podemos dizer que nas coisas criadas por Deus existe uma espécie de auxílios dados por Ele, que por assim dizer, facilitam a nossa Fé. Para exemplificar isto, ele indicará uma analogia que pode ser feita para chegarmos a certo conhecimento da Trindade, é o que ele chama de vestígios. Desde modo, o Bispo de Hipona afirma que existe certa trindade inclusive na visão:

São três as realidades a serem consideradas e distinguidas, e isso com muita facilidade, na visão de qualquer corpo que seja. Primeiramente, o objeto que vemos. […] Em segundo lugar, deve ser considerada a visão, a qual não existia antes de o sentido ter percebido o objeto. Em terceiro lugar, a atenção da alma que mantém o sentido da vista alerta, enquanto a visão se ocupa daquele objeto. Ora, não se dá apenas clara diferença exterior entre as três realidades, mas também diversidade de natureza entre elas.[5]

Esta diferença, segundo ele, se dá primeiramente porque o objeto visível é de natureza bem diversa do sentido da vista, a qual, encontrando-se com ele, produz a visão. O objeto visto pode subsistir à parte, em sua natureza própria. Quanto ao sentido, porém, já existia no vidente mesmo antes de ele ver o que podia ver. O sentido, pois, ou a visão, isto é, o sentido informado pelo objeto exterior pertence à natureza do ser vivo dotado de alma, natureza essa totalmente diversa do objeto percebido pela visão. Pois informando o sentido, esse objeto produz não o sentido, mas a visão.[6] E continua: “a atenção também é diversa do próprio sentido e da visão. Pois a atenção é função apenas da alma”.[7]

Temos aí, pois, um exemplo de três termos ao mesmo tempo distintos e extremamente unidos. O objeto visível, a vista e a atenção, formam assim um vestígio da Santíssima Trindade.

Notas:

[1] JOÃO PAULO II. Fides et ratio: Carta encíclica. Disponível em: . Acesso em 18 abr. 2010. Introdução.
[2] Apud. LIÉBAERT, Jacques. Os Padres da Igreja. São Paulo: Loyola, 2000. p. 48.
[3] AGOSTINHO. A Trindade. Tradução de Agustino BELMONTE. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2005. p. 23-27.
[4] Cf Idem. p. 23.
[5] AGOSTINHO. A Trindade. Tradução de Agustino BELMONTE. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2005. p. 337.
[6] Cf. Idem.
[7] AGOSTINHO. A Trindade. Tradução de Agustino BELMONTE. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2005. p. 337-338.

 
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