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Plinio Corrêa de Oliveira


Reencontro transbordante de afeto
 
PUBLICADO POR ARAUTOS - 02/08/2019
 
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A viagem de Dr. Plinio à Europa, em 1950, caminhava para seu termo. Dirigira-se ele para a Cidade Eterna, onde o aguardava o mais importante de seus compromissos nessa passagem pelo Velho Continente.

Audiência com o Santo Padre

Conhecedora da profunda devoção de seu filho ao Papado, Dª Lucilia rezara confiantemente ao Sagrado Coração de Jesus para que ele obtivesse uma audiência com o Sumo Pontífice, no que foi atendida. Ao ler a extensa carta de Dr. Plinio sobre esse encontro, seu coração maternal exultou, e à medida que corria os olhos pela narração, ela o acompanhava em espírito, meditando nas conseqüências do fato. Em ação de graças, mandou celebrar uma Santa Missa, além de elevar redobradas preces a Nosso Senhor, a fim de Lhe exprimir seu reconhecimento pelo favor alcançado.
Eis a missiva de Dr. Plinio:

Roma, 13-VI
Mãezinha queridíssima do coração
Querido Papai

Escrevo-lhes a 1,30 da noite, depois de ter tomado apontamentos (jornais falados, diríamos na gíria do 6º andar) desde 11 horas da noite até agora. Estou com todas as minhas orações para fazer. Tenho tido um mundo de contatos, tipo marquês Pallavicino, Príncipe Lancelotti, Príncipe Ruffo, Príncipe Chigi, Embaixador da Espanha junto ao Vaticano, etc. Mas o mais formidável foi o Papa. É favor entregar esta carta para o pessoal do 6º andar ver logo. Estávamos [um prelado amigo] e eu preparando o longo relatório para o Papa, e íamos telegrafar para aí pedindo orações, quando veio — com uma rapidez inusitada — a notícia de que o Papa nos receberia em audiência especial no dia seguinte.

Corre-corre tremendo para aprontar o relatório, que ficou concluído à ultimíssima hora, datilografado com o auxílio do Adolphinho. Fomos [o prelado], eu, e um Padre cubano, ex-colega [do primeiro] que servia de secretário a este. Atravessamos salões e salões, [o prelado] de grande gala, eu de roupa azul clara (….), o cubano com uma capa soleníssima. Na passagem, os Suíços e os “gendarmes” pontifícios apresentavam armas. Os salões cheios de diplomatas e de peregrinos. Afinal chegamos ao salão do Papa.

A audiência fora pedida em nome [do prelado] e meu. [Ele] entrou primeiro, e teve uma conversa de uns 10 minutos, ou pouco menos. Em seguida entrei eu e o Cubano. O Papa foi muito amável comigo. Pedi bênção especial para a Senhora e Papai, e tinha intenção de pedir para a família toda, pelo que traduzindo mal disse “mes parents”, o que quer dizer propriamente só os pais. Pedi também bênção especial para meus com panheiros de trabalho. O Papa concedeu tudo muito afetuosamente, e benzeu os objetos de piedade que lhe levei. [O prelado amigo] disse ao Papa que eu tenho uma mãe que me quer um bem louco, e pediu mais uma bênção para a Sra. Como ousa [ele] mentir ao Papa por esta forma? (…) Agora quanto ao regresso:

1 – Não sei como podem ter achado que eu estaria de volta dia 10. Só poderei sair daqui por volta de 15 ou 16. Quero visitar Veneza, depois ir à Suíça, onde tenho gente com quem falar. Da Suíça, França, onde pretendo tomar avião para Lourdes, e se possível interrupção em Portugal para tentar falar com a Irmã Lúcia de Fátima.
2 – Assim, correndo muito, estarei de volta em fins de junho, como disse no telegrama. “Cela vá de soi” que estarei presente para o casamento de Maria Alice.
3 – Quando eu marcar o regresso, telegrafarei. (…)
4 – Terei que ficar no Rio 24 horas. Assim, chegarei a São Paulo no dia seguinte ao de minha chegada ao Rio.
5- Ficarei no Glória. Quero que uma hora depois de o avião ter chegado Mamãe me telefone. 
6 – Logo depois de ter falado com Mamãe e Papai, falarei também com Rosée e Maria Alice, se estas puderem estar perto. (…)
7 – Logo depois de ter falado com Papai e Mamãe, (…) quero falar com o pessoal do 6º ao menos os que estiverem disponíveis a esta hora.
8 – Daqui por diante, escrever-me ao Regina Hotel, Paris. Para Papai um longo e afetuoso abraço. Para Mamãe, milhões e milhões de beijos. A ambos peço a bênção, Plinio

Meus carissimos do 6º. andar
Como vêem, esta carta é tanto para vocês quanto para Papai e Mamãe. Acrescento que por deferência especial de Mons. Montini¹, assisti ontem a canonização de São Vicente Strambi na tribuna dos diplomatas, ao lado do embaixador e secretário do embaixador do Egipto! Sei que gostariam de mais notícias sobre a audiência. Esperem jornal falado. Mil e mil abraços, Plinio

Saudades e ansiosa espera

Esses pequenos e grandes fatos alimentaram, após a volta de Dr. Plinio, as abençoadas “prosinhas” noturnas de Dª Lucilia com ele. A cerimônia de canonização de São Vicente Strambi, por exemplo, terá sido, sem dúvida, tema de algumas delas.

Com efeito, Dª Lucilia, que tanto amava o protocolo e o cerimonial, ter-se-á encantado ao ouvir, dos lábios de seu próprio filho, a descrição de uma das mais belas pompas da Cristandade.

Quanto e com que brilho marcaram a História as gloriosas vitórias dos guerreiros romanos! Entretanto, as celebrações destas nada foram em comparação às preparadas pela Santa Igreja para elevar à honra dos altares e louvar seus heróis. Estes últimos terão seus feitos lembrados até o fim do mundo, em todos os recantos da Terra.

Para o augusto ato da canonização de São Vicente Strambi, compareceram as mais insignes autoridades da Igreja presentes em Roma, todo o corpo diplomático acreditado no Vaticano, além de grande número de personalidades eminentes da nobreza romana, do mundo da cultura e da política. Por assim dizer, estava representado simbolicamente, na Basílica de São Pedro, o que de mais seleto há nas sociedades espiritual e temporal. Tudo para glorificar a heroicidade das virtudes de uma pessoa que talvez tenha levado uma vida obscura e apagada, entre as paredes de um mosteiro.

Esses e outros pensamentos terão passado pela mente de Dª Lucilia, enquanto aguardava a volta de Dr. Plinio para se deliciar com os pormenores do evento.

Embora não tivesse a certeza de que uma carta ainda o fosse encontrar em Paris — para onde ele seguiria de Roma —, e apesar de já estar se ocupando muito com os preparativos para o casamento de sua neta, não quis deixar de enviar-lhe um comentário a propósito da audiência dele com o Sumo Pontífice:

São Paulo 21-VI-950
Filho querido de meu coração!

Segue mais esta, “pour un en cas”², como dizem os franceses teus amigos, pois asseguram-me os do sexto andar e teu pai, que ao chegar esta a Paris, já estarás de volta, ou melhor, em casa. Será possível?

Estou escrevendo com uma pena de bico torcido, e muito tarde, e já cansada, ainda vou começar as orações, por quem está tão longe! Não sei dizer-te quanto alegrou-me tua visita ao Papa! Pedi tanto a Deus para que te desse esta graça, pelo que vou mandar dizer uma missa em ação de graças, por isso, e pelo bom resultado de tua viagem.

Até quando, querido? As saudades crescem, e são tantas, tantas,…. agora, na hora do nosso rosário, andando no salão!… Venha logo!

Bênçãos, beijos e abraços de tua mãe extremosa,
Lucilia

Reze por tua sobrinha e por nós, em Lourdes e Fátima!

Aspecto da cerimônia de canonização de São Vicente Strambi onde se pode ver Dr. Plinio na tribuna do Corpo Diplomático

De fato Dr. Plinio rezaria em Fátima, no local onde Nossa Senhora aparecera aos três pastorinhos, Lúcia, Francisco e Jacinta. Da primitiva azinheira, do cimo da qual a Santíssima Virgem lhes falara, nada mais restava, pois a devoção do povo a fizera desaparecer em pouco tempo, levando cada um seu pedacinho de lembrança…

Apenas uma singela capelinha, que a Mãe do Céu mandara construir, recordava o ponto exato das aparições na Cova da Iria.

“Filhão, graças a Deus você é o  mesmo!”

Às dez horas da manhã do dia 29 de junho, Dr. Plinio embarcou em Paris com destino ao Brasil. Em suas cartas não definira a data de seu regresso, com o objetivo de poupar a Dª Lucilia “a angústia da travessia”. No entanto, logo ao chegar ao Rio, pediu que fosse avisada, a fim de com ela poder falar pelo telefone. Após dois longos meses de ausência, contados dia por dia, minuto a minuto, pôde ela ter uma longa prosinha com seu “queridão”.

Na manhã seguinte, com o intuito de deixar tudo pronto para receber seu filho, Dª Lucilia não seguiu a recomendação médica de repousar até mais tarde. Mandou preparar um farto lanche a ser servido quando Dr. Plinio chegasse, pois certamente viria cansado da viagem e precisaria recompor as forças.

Uma vez tudo pronto, foi para o hall do apartamento e sentou-se à espera dele. Imenso foi o júbilo que lhe inundou a alma ao vê-lo assomar à porta. Abraços, beijos e bênçãos foram as primeiras manifestações de gáudio. Dona Lucilia, sempre idêntica a si própria, não poderia deixar de aliar, aos extremos de alegria, uma infatigável vigilância. Após os afetuosíssimos cumprimentos, afastou-se um pouco de seu filho e o fitou atentamente, com seu tranqüilo, sereno e penetrante olhar. Dr. Plinio não entendeu logo qual a intenção de sua mãe, mas, na expectativa, nada lhe disse. Ao cabo de alguns instantes de observação, concluiu ela, contente:

— Filhão, graças a Deus você é sempre o mesmo!

Em seguida, levou todos à sala de jantar, onde Dr. Plinio contou as primeiras impressões de viagem, enquanto tomava o saboroso lanche.

Essa tocante atitude de Dª Lucilia revela como a virtuosa preocupação pela perseverança de seu filho não só não esmorecia com o passar dos anos, mas crescia tanto quanto a estima que lhe devotava. Apesar de conhecê-lo bastante bem e ter plena certeza de ser ele “o melhor dos filhos”, não se fazia ilusão alguma acerca da natureza humana. Ela jamais faria o seguinte raciocínio: “Plinio é muito bom filho, católico exemplar e, portanto, na Europa não corre risco algum! Posso ficar inteiramente tranqüila”. Seu modo de ver a realidade era bem diverso, e ela deve ter pensado o contrário: “É bem verdade que ele é um bom filho, mas, como todo homem, pode cair. A Europa é um continente de sedução e de prazeres. Ele vai com razoável quantia de dinheiro para gastar, levará uma vida bem diferente da que tem no Brasil. Irá a grandes restaurantes, estará em hotéis excelentes, de vida social intensa, freqüentará a sociedade. O que passará por seus olhos e por sua imaginação durante a viagem? Essa velha Europa, eu e ele a admiramos tanto, mas… devolver-me-á ela meu filho tal qual ele é, ou com o espírito desfavoravelmente marcado?”

Como vimos, essas apreensões, acumuladas nos dois meses de ausência, foram logo dissipadas após os primeiros instantes de análise, feita, aliás, muito mais com o coração do que com a vista. (Transcrito, com adaptações, da obra “Dona Lucilia”, de  Mons. João S. Clá Dias)(Revista Dr. Plinio, Abril/2003, n. 61, p. 12 a 15).

Notas:

1) Mons. João Batista Montini, futuro Papa Paulo VI, na época Substituto da Secretaria de Estado de S. S. Pio XII.
2) “Por via das dúvidas”

 
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