Os primeiros habitantes do vasto Vale do Paraíba, entre a Serra do Mar e a Serra da Mantiqueira, vale banhado pelo famoso Rio Paraíba do Sul, eram, sem dúvida, os tamoios, pertencentes à grande família tupi.

Os nomes das cidades que pelo vale surgiram – Mogi ou “rio das cobras”, Jacareí ou “rio dos jacarés”, Caçapava ou “clareira na mata”, Taubaté ou “aldeia grande” – estão indicando que os primeiros povoadores foram os indígenas.

Mais de duzentos anos depois da descoberta do Brasil, as viagens entre São Paulo dos Campos de Piratininga e São Sebastião do Rio de Janeiro, bem como as idas e vindas que viajantes, mascates e mercadores empreendiam daquelas cidades a Minas, eram viagens que se faziam de modo irregularíssimo, penosas e grandemente demoradas.

O achado da prodigiosa imagem de Maria no Rio Paraíba, em 1717 – é fato histórico – prendeu-se a uma viagem, feita por Dom Pedro de Almeida, conde de Assumar, governador e capitão-general de São Paulo e Minas Gerais.

Sucesso inesperado

O local, onde hoje está a Basílica de Nossa Senhora Aparecida, distante de Guaratinguetá (ou Garças) alguns quilômetros, chamava-se simplesmente Morro dos Coqueiros.

Havia por ali pouquíssimos moradores, dentre os quais podem-se nomear Domingos Martins Garcia, João Alves e Filipe Pedroso, os afortunados pescadores que encontraram a prodigiosa imagem.

O fato se deu do seguinte modo:

Em outubro de 1717, por ali tinha de passar, de São Paulo para Minas Gerais, Dom Pedro de Almeida, conde de Assumar, nomeado pela Corte governador dessas províncias.

Sabendo que o ilustre hóspede e sua comitiva se deliciariam com uma mesa bem servida de saborosos peixes, a Câmara de Guaratinguetá ordenou aos pescadores da redondeza que saíssem a pescar e trouxessem todo o peixe que conseguissem apanhar.

Os três pescadores começaram a lançar suas redes no Porto de José Correia Leite, continuando até o Porto de Itaguaçu, bem distante, sem tirar peixe algum.

Foi quando João Alves lançou sua rede e “tirou o corpo da Senhora, sem a cabeça; lançando mais abaixo outra vez a rede, tirou a cabeça da mesma Senhora”.

João Alves, homem, sem dúvida, religioso, envolveu-a respeitosamente num pano, depositou-a na sua canoa e continuou a lançar a rede.

Daquele momento em diante, a pesca foi de tal modo abundante que ele e os companheiros, receosos de naufragar, devido à enorme quantidade de peixes, retiraram-se para suas casas, narrando a todos, cheios de espanto, o que lhes acontecera.

Filipe Pedroso, ao que parece, o mais afeiçoado à pequena imagem, conservou-a em sua casa durante uns quinze anos.

Indo, mais tarde, morar no Itaguaçu, deu a imagem a seu filho Atanásio Pedroso, o qual lhe fez um altarzinho ou oratório de madeira. E ali, todos os sábados, se reuniam os vizinhos para “cantar o Terço e mais devoções”.

Foi também ali que se deu o prodígio, várias vezes repetido, das velas que se apagavam e, sem intervenção de ninguém, de novo se acendiam.

Construção da igreja

No lugar histórico onde apareceu milagrosamente a imagem de Nossa Senhora Aparecida, foi, mais tarde, erigida uma cruz comemorativa e, num ponto um pouco mais elevado, uma capela em cujas paredes externas se liam os nomes dos três felizes pescadores que encontraram a imagem da Imaculada, hoje venerada como Padroeira do Brasil.

Passados alguns anos, como era grande o número de visitantes, tornou-se imperiosa a construção de uma igreja.

A capela, visitadíssima, não mais comportava as multidões que vinham visitar a Virgem.

Era então vigário de Guaratinguetá o Pe. José Alves de Vilela, que dirigiu um requerimento ao Bispo do Rio de Janeiro, Dom Frei João da Cruz, no qual solicitava licença para erguer uma igreja sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição Aparecida.

Era 1743. Aos 5 de maio daquele mesmo ano, a licença era concedida.

O local escolhido para a construção da igreja foi o Morro dos Coqueiros.

Com prazer, os proprietários fizeram a doação do terreno necessário para o patrimônio e, em 1744, foram iniciadas as obras com tão grande animação que, aos 26 de julho de 1745, festa de Sant’Ana, o vigário, Pe. José Alves de Vilela, pôde abençoar a igreja e inaugurá-la, celebrando a Santa Missa.

Conforme o costume daquele tempo, logo que foi construída a igreja, constituiu-se uma irmandade leiga para zelar por ela.

Durante quase cem anos, não se fizeram na igreja melhoramentos de fisionomia.

Em março do ano de 1842, Aparecida foi elevada à freguesia pela Assembleia Legislativa de São Paulo. Contudo, não se encontraram no local pessoas competentes para os cargos de juiz de paz, escrivão, etc.; por isso, em março de 1844 a mesma Assembleia, por nova lei, suprimiu a freguesia.

Durante cem anos, o pátio da igreja serviu de cemitério; em 1843, porém, resolveu-se localizar o cemitério atrás da igreja, no terreno onde hoje se acha a Casa de Noviciado São Carlos.

Naquele tempo, não havia por ali habitações, a não ser o casarão para romeiros, e a menos de cinquenta metros começava a vegetação.

Ruas não havia, mas somente alguns caminhos mal conservados em direção à Capela de Santa Rita.

A igreja, todavia, não era de construção sólida, não fora levantada, como muitas, para desafiar os tempos, de modo que, em menos de um século, as torres e o frontispício ameaçavam ruir.

Ficou assim resolvido que haviam de construir de novo as torres e o frontispício.

Iniciados os trabalhos em julho de 1843, por morosidade e em virtude de falta de recursos e materiais, as duas torres foram concluídas, uma no ano de 1846 e a outra em 1848.

No ano de 1877, chegava a Aparecida Frei Joaquim do Monte Carmelo, nascido na Bahia.

Em janeiro do ano seguinte, apresentou Frei Joaquim à Mesa Administrativa uma proposta de construção do corpo da igreja. A planta, examinada pela Mesa, foi aceita e, assim, aprovada a proposta.

As obras foram iniciadas quase que imediatamente e, pelo fim do ano, o padre construtor demonstrou que era imprescindível construir também a capela-mor com suas dependências. A Mesa concordou.

A construção foi concluída em fevereiro de 1888.

As despesas elevaram-se a cento e noventa e cinco contos de réis, moeda corrente naquela época.

No dia 8 de dezembro de 1888, Dom Lino Deodato de Carvalho, Bispo de São Paulo, abençoou e inaugurou solenemente a Igreja de Nossa Senhora Aparecida.

Frei Joaquim do Monte Carmelo, terminadas as obras da igreja, regressou ao seu mosteiro na Bahia.

Mais tarde, ou seja, em 1893, Dom Lino concedeu ao curato o título de Episcopal Santuário de Nossa Senhora da Conceição Aparecida.

Em novembro, no dia 18 do mesmo ano, foi nomeado capelão o Pe. Claro Monteiro do Amaral. Tendo tomado posse aos 23 daquele mês, permaneceu no curato até 1895.

E o santuário, em virtude das graças e favores que os fiéis, constantemente, alcançavam, ia-se tornando mais conhecido, mais procurado.

Chegada dos redentoristas

Desta maneira, como não havia sacerdotes que cuidassem do bem espiritual dos romeiros, o Bispo de São Paulo, Dom Lino, amoroso, filho da Senhora Aparecida, desejando para o serviço religioso do santuário um número mais elevado de padres, teve a ideia de ali formar uma comunidade de religiosos missionários.

Naquele tempo, era Bispo coadjutor de São Paulo o Dom Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti.

Em 1894, durante uma viagem a Roma, recebeu de Dom Lino a incumbência de obter uma comunidade de verdadeiros missionários para Aparecida.

O Bispo coadjutor, vencendo todas as barreiras, acabou por conseguir que o superior-geral dos redentoristas aceitasse a nova fundação.

A 28 de outubro do mesmo ano de 1894, chegavam os primeiros redentoristas.

O bom Bispo, Dom Lino Deodato, não pode ver aqueles que iriam, por primeiro, reger o santuário. Assim, o último capelão secular de Aparecida foi o já citado Pe. Claro Monteiro do Amaral.

O primeiro, capelão-cura redentorista, foi o Padre Wendel, que exerceu as funções durante dez meses, tendo como sucessor o Pe. Gebardo Wiggermann, que foi nomeado superior da comunidade religiosa e visitador.

E Aparecida, de pouco em pouco, ia se transformando, tornando-se, tanto para os moradores do lugar como para os romeiros, um centro excepcional de piedade e reflorescimento espiritual.

Romarias

De 1817 a 1894, a devoção a Nossa Senhora Aparecida transpusera, mais ou menos, as fronteiras paulistas.

Com a chegada dos redentoristas, porém, um grande impulso material, principalmente espiritual, entrou a engrandecer a cidadezinha.

É que as notícias do lugar, antes levadas por este ou aquele que vinha visitar Nossa Senhora, eram agora propagadas pelo jornal Maria – o Santuário de Aparecida – fundado em 1900.

Em 1895, no livro do tombo, houve em Aparecida cerca de três mil Comunhões. Oito anos mais tarde, ou seja, em 1903, aquele número elevou-se para dezesseis mil.

Com as viagens cada vez mais fáceis, não havia quem não desejasse visitar a Senhora.

E os atos religiosos mais regulares e atraentes e as maiores comodidades de que os romeiros podiam desfrutar iam concorrendo admiravelmente para que as pessoas de São Paulo e de outros estados fossem levadas às visitas e ao cumprimento de promessas – promessas que, até então, iam se contemporizando, o que não convinha.

Em 1904, surgiu o Manual do Devoto de Nossa Senhora Aparecida, grande devocionário que os redentoristas publicaram carinhosamente.

As grandes romarias tiveram início em 1900.

Dom Alvarenga, Bispo de São Paulo, no dia 8 de setembro, compareceu a Aparecida com mil e duzentos peregrinos. Doutra feita, de Guaratinguetá, foram visitar o santuário quase cinco mil pessoas.

Dom Joaquim Arcoverde, deixando o Rio de Janeiro com mil romeiros, pessoas da alta sociedade, chegou alegremente a Aparecida em 16 de dezembro de 1900.

Desde então, as romarias tornaram-se frequentes e quase ininterruptas.

Várias cidades dos estados de São Paulo e Minas Gerais organizam romarias a Aparecida todos os anos.

Na capital bandeirante, há igrejas matrizes que, reunindo anualmente os paroquianos, dirigem-se ao santuário em visita a Maria.

Atualmente, é comum encontrar-se na cidade ladeirenta, à moda antiga, de Aparecida, romeiros vindos dos pontos mais distantes do país, tais como o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Bahia e outros estados.

Essas peregrinações se davam em caminhões, de trem, de automóvel, nas antiquíssimas, desconfortáveis e sacolejantes jardineiras, que ainda as há por este Brasil afora, e em grande quantidade.

8 de setembro de 1904: coroação da imagem de Nossa Senhora Aparecida

Que sacrifícios não fazem os devotos de Nossa Senhora Aparecida para chegar a um lugar tão privilegiado!

A solene coração da imagem de Nossa Senhora Aparecida, em 1904, é um desses acontecimentos.

Em 1903, os senhores Bispos pediram ao Santo Padre Pio X a faculdade de coroar solenemente a imagem milagrosa de Nossa Senhora Aparecida, comemorando o quinquagésimo aniversário da definição dogmática da Imaculada Conceição.

A faculdade foi concedida e a solenidade foi marcada para 8 de setembro de 1904.

Naquele dia, que foi um dos mais notáveis para Aparecida, achavam-se presentes o Núncio Apostólico, o Arcebispo do Rio de Janeiro, onze Bispos, um representante do presidente da República, muitos dignatários, sacerdotes, religiosos e uma enorme multidão de povo.

O Senhor Núncio celebrou a Missa Pontifical. Dom João Braga fez o sermão e rezou com o povo o ato de consagração.

Dom José de Camargo Barros abençoou a coroa, entoou o Regina Cæli e depositou a coroa sobre a fronte da veneranda imagem.

Aparecida, então, estava ornada.

De todas as casas, dos antigos casarões, dos quais ainda existem vários, flutuavam bandeiras, sobressaiam-se buquês maravilhosos, e dos balcões dos velhos sobradões do tempo do império pendiam adamascados magníficos. E as ruas todas, enfeitadas, eram uma festa para os olhos.

Foi cantado o Te Deum.

Inaugurou-se o belíssimo monumento da Imaculada, erguido na praça do santuário.

À tarde, saiu soleníssima procissão com assistência do Senhor Núncio Apostólico e de todos os Bispos, sendo a imagem carregada por monsenhores e cônegos.

À entrada da procissão, fez eloquente oração Dom João B. Correia Nery, então Bispo de Pouso Alegre.

O dia 8 de setembro, aniversário da coroação, vem sendo celebrado todos os anos com grande pompa e numeroso concurso de fiéis.

Padroeira do Brasil

A 29 de abril de 1908, o Santo Padre Pio X, agora elevado à honra dos altares, concedeu ao Santuário de Nossa Senhora Aparecida o título e a dignidade de Basílica.

Em setembro de 1929, vigésimo-quinto aniversário da coroação da imagem milagrosa, celebrou-se em Aparecida um congresso mariano, ao qual assistiram vinte e cinco Arcebispos e Bispos e avultado número de sacerdotes do clero secular e regular.

Nas sessões e manifestações públicas, foi sempre externado o desejo unânime de que Nossa Senhora Aparecida fosse declarada Padroeira de todo o Brasil.

Brevemente ia concretizar-se aquele desejo do povo brasileiro, e a alegria dos habitantes desta Terra de Santa Cruz ia ser imensa.

O Episcopado, ensina-nos o utilíssimo guia do Dr. Assis Moura, apresentou, pois, ao Santo Padre Pio XI esse pedido, sendo o mesmo acolhido com muito agrado.

No dia 16 de julho de 1930, o grande Pio XI assinou o decreto pontifício que declarou e proclamou Nossa Senhora da Conceição Aparecida como Padroeira da nação brasileira.