Desde sempre o setor da educação é particularmente querido à Igreja, chamada a fazer sua a solicitude de Cristo que – narra o evangelista –, vendo as multidões, “comoveu-se…, porque eram como ovelhas sem pastor, e pôs-se a ensinar-lhes muitas coisas” (Mc 6, 34).

A palavra grega usada para exprimir esta atitude de “comoção” recorda as entranhas de misericórdia e remete para o amor profundo que o Pai celeste sente pelo homem.

A Tradição viu no ensinamento e, mais geralmente, na educação, uma manifestação concreta da misericórdia espiritual, que constitui uma das primeiras obras do amor que a Igreja tem por missão oferecer à humanidade. 

É oportuno como nunca que, neste nosso tempo, se reflita sobre como tornar atual e eficaz esta tarefa apostólica da Comunidade Eclesial, confiada às universidades católicas e, de modo especial, às faculdades eclesiásticas.

Portanto, alegro-me convosco por terdes escolhido para a vossa plenária um tema de tanto interesse.

Assim como penso também que seja útil analisar atentamente os projetos de reforma que atualmente estão a ser estudados pela vossa Congregação, relativos às mencionadas universidades católicas e às faculdades eclesiásticas. 

Reforma dos estudos eclesiásticos

Em primeiro lugar, refiro-me à reforma dos estudos eclesiásticos de Filosofia, projeto que já chegou à fase final de elaboração, na qual não deixará de ser ressaltada a dimensão metafísica e sapiencial da Filosofia, recordada por João Paulo II na Encíclica Fides et ratio.1

De igual modo, útil é avaliar a oportunidade de uma reforma da Constituição Apostólica Sapientia christiana.

Querida pelo meu venerado predecessor, em 1979, ela constitui a magna carta das faculdades eclesiásticas e serve de base para formular os critérios de avaliação da qualidade dessas instituições, avaliação exigida pelo Processo de Bolonha, do qual a Santa Sé se tornou membro desde 2003. 

As disciplinas eclesiásticas, sobretudo a Teologia, são submetidas hoje a novos interrogantes, num mundo tentado, por um lado, pelo racionalismo, que segue uma racionalidade falsamente livre e separada de qualquer referência religiosa.

E, por outro, pelos fundamentalismos, que absolutizam com violência as suas referências religiosas, afastando-se da razão. 

Propor a perspectiva cristã num mundo globalizado e plural

Também a escola deve interrogar-se sobre a missão que deve realizar no hodierno contexto social, marcado por uma evidente crise educativa.

A escola católica, que tem como missão primária formar o aluno segundo uma visão antropológica integral, mesmo estando aberta a todos e respeitando a identidade de cada um, não pode deixar de propor a sua perspectiva educativa, humana e cristã.

Eis então que se apresenta um desafio novo que a globalização e o pluralismo crescente tornam ainda mais agudo: isto é, o do encontro das religiões e das culturas na pesquisa comum da verdade. 

O acolhimento da pluralidade cultural dos alunos e dos pais encontra-se necessariamente em confronto com duas exigências: por um lado, não excluir alguém em nome da sua pertença cultural ou religiosa; por outro, quando esta diversidade cultural e religiosa for reconhecida e acolhida, não deter-se na mera constatação.

Isto equivaleria, de fato, a negar que as culturas se respeitam verdadeiramente quando se encontram, porque todas as culturas autênticas estão orientadas para a verdade do homem e para o seu bem.

Por isso, os homens provenientes de culturas diversas podem falar uns com os outros, compreender-se além das distâncias espaço-temporais, porque no coração de cada pessoa habitam as mesmas grandes aspirações ao bem, à justiça, à verdade, à vida e ao amor. 

Formação dos futuros sacerdotes

Outro tema a ser estudado pela vossa Assembleia Plenária é a questão da reforma da Ratio fundamentalis institutionis sacerdotalis para os seminários.

O documento-base, de 1970, foi atualizado em 1985, especialmente após a promulgação do Código de Direito Canônico de 1983. Nos sucessivos decênios, vários textos de especial relevo foram emanados, em particular a Exortação Apostólica pós-sinodal Pastores dabo vobis (1992).

A atmosfera atual da sociedade, com a máxima influência da mídia e a difusão do fenômeno da globalização, mudou profundamente.

Portanto, parece necessário interrogar-se sobre a oportunidade da reforma da Ratio fundamentalis, que deverá ressaltar a importância de um correto desenvolvimento das diversas dimensões da formação sacerdotal na perspectiva da Igreja-comunhão, seguindo as indicações do Concílio Vaticano II.

Isto exige uma sólida formação na fé da Igreja, uma verdadeira familiaridade com a Palavra revelada, doada por Deus à Sua Igreja. 

Além disso, a formação dos futuros sacerdotes deverá oferecer orientações e rumos úteis para dialogar com as culturas contemporâneas.

A formação humana e cultural, portanto, deve ser significativamente fortalecida e apoiada também com a ajuda das ciências modernas, dado que alguns fatores sociais desestabilizadores presentes hoje no mundo (por exemplo, a condição de tantas famílias separadas, a crise educativa, uma violência difundida, etc.) tornam frágeis as novas gerações.

Ao mesmo tempo, é necessária uma formação adequada à vida espiritual, que torne as comunidades cristãs, em particular as paróquias, cada vez mais conscientes da sua vocação e capazes de corresponder de modo adequado à exigência de espiritualidade manifestada especialmente pelos jovens.

Isto requer que não faltem na Igreja apóstolos e evangelizadores qualificados e responsáveis. 

O cuidado das vocações envolve toda a comunidade eclesial

Por conseguinte, apresenta-se o problema das vocações, sobretudo para o sacerdócio e para a vida consagrada. Enquanto em certas partes do mundo se observa um florescimento de vocações, noutras o número diminui, sobretudo no Ocidente.

O cuidado das vocações envolve toda a comunidade eclesial: bispos, sacerdotes, consagrados, mas também as famílias e paróquias.

Certamente será de grande ajuda para esta vossa ação pastoral também a publicação do documento sobre a vocação para o ministério presbiteral, que estais a preparar. 

Queridos irmãos e irmãs! Recordei há pouco que o ensino é expressão da caridade de Cristo e é a primeira das obras de misericórdia espiritual que a Igreja é chamada a realizar.

Quem entra na sede da Congregação para a Educação Católica é acolhido por um ícone que mostra Jesus no gesto do lava-pés aos seus discípulos durante a Última Ceia.

Aquele que “nos amou até ao fim” (Jo 13, 1) abençoe o vosso trabalho ao serviço da educação e, com a força do seu Espírito, o torne eficaz.

Por meu lado, agradeço-vos por quanto estais a fazer quotidianamente com competência e dedicação e, enquanto vos confio à proteção materna de Maria Santíssima, Virgem Sábia e Mãe do Amor, concedo a todos de coração a Bênção Apostólica. 

 

Discurso aos participantes da Assembleia Plenária da Congregação para a Educação Católica, 21/1/2008.

1 Cf. n. 81.