Havia num reino longínquo um rei e uma rainha que pediam insistentemente a Deus a graça de terem um filho.

Após muitas orações e espera, nasceu-lhes um encantador menino, o qual levaram sem demora à fonte batismal. O pequeno príncipe encerrava todas as esperanças para o futuro do reino, e os soberanos devotavam-lhe um imenso afeto. 

Contudo, o rei tinha alguns inimigos que viam com maus olhos aquela criança portadora de tantas esperanças. Confabularam, então, sobre o rapto do bebê. Numa noite de tranquila normalidade um bandido adentrou no palácio, golpeou os guardas e roubou o principezinho. 

Aflito, o rei mandou soldados atrás do criminoso, que havia fugido pela floresta com grande rapidez. Mas eles voltaram para o palácio sem nenhuma notícia do paradeiro do menino.

Não imaginava o soberano que seus homens estiveram a ponto de encontrar o perverso sequestrador e que este, vendo-se na iminência de ser preso, largou o príncipe na porta de uma choupana onde vivia um carvoeiro com a sua família. 

Desprotegida e faminta, a criança começou a chorar. A esposa do carvoeiro abriu a porta e contemplou com assombro aquele terno bebê envolto em panos. Levou-o para dentro, alimentou-o e o casal decidiu adotá-lo como filho. 

Desde muito cedo, ele aprendeu a cortar lenha, preparar o fogo, e encher sacos e mais sacos de carvão. Entretanto, revelava uma natural inaptidão para esse ofício.

Seus pais adotivos, julgando que sua falta de habilidade era fruto de má vontade, não lhe poupavam repreensões e castigos; isto, por sua vez, suscitava o desprezo de seus irmãos.

Embora ignorasse absolutamente sua real ascendência, o pequeno príncipe sentia-se um estranho naquela casa. Experimentava, no fundo de sua alma, uma terrível insatisfação, além de um irrefreável anelo por uma vida melhor.

Os anos foram-se passando, e a criança, de mãozinhas sempre negras, assumiu um aspecto tosco, marcado pelas intempéries e vicissitudes da vida que levava. Quase nunca se ausentava da floresta, e por isso desconhecia por completo os costumes da vida na cidade. 

Um dia, quando ele tinha dezoito anos, um crime foi cometido num pequeno vilarejo próximo à floresta. O criminoso escapou por entre o denso arvoredo.

Os guardas saíram ao seu encalço, mas tudo o que encontraram foi o jovem carvoeiro cortando lenha. Sem hesitar um instante, prenderam-no e levaram-no para o cárcere, onde ficou retido enquanto a autoridade policial apurava o caso. 

Desolado ao ver-se preso por um delito que não cometera, o jovem chorava atrás das frias grades. Aproximou-se, então, um homem velho e, num tom de voz muito baixo, lhe disse:

Jovem carvoeiro, não chores, eu sei que és inocente. Sou carcereiro nesta prisão há longo tempo, e sei algo sobre teu passado que vai mudar a tua vida. Por aqui passaram incontáveis malfeitores que narravam com orgulho seus feitos perversos. Um deles contou-me a tua história…

Minha história?! A minha história é a de um pobre carvoeiro que passou toda a vida entre as árvores e o fogo!  

— Estás enganado! Já te deste conta de como és diferente de teu pai e tua mãe? Não é verdade que não te pareces com eles?

Assustado, o carvoeiro teve de concordar.

Já ouviste contar a história de nossos reis, cujo filho foi raptado quando ainda era um bebê, e do qual nunca mais se teve notícia, apesar das constantes buscas?

Sim, já ouvi contar esta história. 

— Quando o príncipe foi roubado, o bandido entrou na floresta em que tu moras, e ao dar-se conta de que os soldados reais estavam na iminência de alcançá-lo, largou a criança na porta da choupana de um casal de carvoeiros. E sabes quem é essa criança, o herdeiro da coroa real? És tu!…  

A tristeza transformou-se em jubilosa alegria, o jovem não cabia em si de felicidade:

Então… Quer dizer que o rei e a rainha são meus pais? 

Seu coração encheu-se de consolação. Lágrimas brotaram-lhe dos olhos, e ele exclamou:

Por favor, deixa-me conhecer meus pais! Eu quero vê-los, abraçá-los! Vai ao palácio e conta tudo o que sabes!

O carcereiro partiu para a residência real e, lá chegando, comunicou que sabia do paradeiro do príncipe. Foi atendido imediatamente pelos soberanos que, após se certificarem da veracidade da alvissareira notícia, mandaram buscar sem demora o jovem carvoeiro. 

A cena que então se desenrolou marcou a fundo a história do reino. O rei e a rainha puderam finalmente contemplar o filho querido que julgavam para sempre perdido.

Por sua vez, o príncipe não se cansava de contemplar seus verdadeiros pais e de manifestar-lhes sua gratidão. Ao seu lado veio sentar-se no trono que lhe cabia e viveu longos anos de paz e prosperidade. 

Este conto do príncipe carvoeiro nos faz recordar a nossa própria história. Deus, ao criar-nos, destinou-nos para participar de seu Reino e gozar de sua glória.

O demônio, entretanto, invejoso da herança prometida ao homem, procura de todos os modos, pelo pecado, afastar a alma de Deus e, assim, roubar-lhe a felicidade. 

Felicidade que, se tivermos a desgraça de perder, só poderemos encontrar novamente retornando à casa paterna e recuperando nossa condição de príncipe herdeiro.

Não enquanto filhos de um mero monarca temporal, como o príncipe desta narração, mas d’Aquele que é o próprio Rei dos reis. 

A plenitude desta felicidade, porém, nos será conferida quando nossas almas entrarem na posse do Reino esperado, onde se alegrarão eternamente na companhia do Criador.