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Santa Joana d’Arc, a virgem heróica
 
AUTOR: MONS. JOÃO CLÁ DIAS, EP
 
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Surpreendentes e variadas são as vias da Providência!

Quis Deus libertar os hebreus do jugo dos egípcios, e suscitou um Moisés, que se apresenta diante do orgulhoso faraó, faz milagres para comprovar sua missão divina, lança pragas sobre o Egito, e ostenta o poder divino, abrindo diante de si as águas do Mar Vermelho, e nelas sepultando para sempre os exércitos inimigos. Quis Deus salvar a França do domínio inglês, na Idade Média, e em vez de fazer nascer entre os filhos dessa nação um grande general, chamou para realizar sua obra uma donzela, a inocente pastorinha da Lorena: Santa Joana d’Arc.

De repente, um país derrotado e decadente, retalhado pela ambição, governado por um príncipe fraco e hesitante, ressuscita ao ouvir a convocação de Joana. Sua voz virginal dá força aos fracos, coragem aos covardes e fé aos descrentes. Sua inocência infunde terror nos inimigos, restaura a pureza dos devassos. Seu nome é um brado de guerra. Sua figura, um estandarte imaculado.

Em sua curta vida, conheceu os esplendores da glória e as humilhações da mais vil perseguição: a da calúnia – último recurso dos invejosos, arma traiçoeira dos infames, que poupa o corpo e fere a honra.

Condenada à morte como bruxa, reduzida a cinzas pelo fogo, sua inocência triunfou nos altares para todo o sempre: Santa Joana d’Arc.

Santa Joana d’Arc, a inocente de Domremy

Desde muito cedo, tinha o costume de rezar enquanto se achava sozinha no campo, apascentando o rebanho de seus pais. Certo dia ouviu vozes misteriosas, que acabaram por identificar-se como sendo de São Miguel e de duas santas. Urgiram-na a apresentar-se ao rei de França e comunicar-lhe que Deus a enviava a fim de anunciar seu auxílio para expulsar os ingleses do território francês.

Aquela virgem encantadora resolveu então partir e apresentar-se ao soberano.

Logo que chegou à corte, passou-se com ela um belíssimo fato que veio provar a autenticidade de sua missão. Numa época como aquela, em que não havia imprensa nem televisão, só restava um modo de se conhecer o semblante do rei: olhá-lo diretamente. Quem nunca o houvesse visto, não saberia identificá-lo pela fisionomia no meio de muitas pessoas. No dia em que o rei Carlos VII condescendeu em ouvir Santa Joana d’Arc, vestiu-se ele como um simples nobre e, no salão de audiências, repleto de pessoas, retirou-se para um lugar secundário, mandando que outro se colocasse no lugar central, trajado como se fosse monarca.

Santa Joana d’Arc entrou, olhou para todos e, sem titubear, foi em direção àquele que se ocultava num dos cantos, dizendo-lhe:” Ó Rei, eu venho vos falar!”

Na conversa que se seguiu, Carlos VII pôs dificuldades à jovem pastora, contudo ela venceu-as todas. Convencido de sua missão, o monarca colocou-a, frágil e débil, à frente de um dos exércitos mais fortes da Europa. E ela, na sua debilidade virginal e encantadora, comandou-o e empurrou os ingleses quase completamente para fora da França.

“Ele esteve comigo na hora da luta, é natural que esteja também na glória!”

Certa feita, santa Joana d’Arc dirigiu-se a Carlos VII, dizendo querer dele um inapreciável presente, e perguntou se o monarca estava disposto a dá-lo. Disse ele que sim. Ela, então, afirmou que desejava o Reino da França! Surpreso e contrafeito, o rei entretanto condescendeu. Santa Joana d’Arc imediatamente mandou chamar quatro tabeliães e lavrou um ato pelo qual recebia de Carlos VII a França, despojando-se o soberano, em favor dela, de todos os seus direitos sobre o Reino. Após ter ele assinado o documento, santa Joana d’Arc mandou lavrar um outro, pelo qual ela, em nome de Deus, entregava novamente ao monarca o Reino da França!

Em Carlos VII, que ainda não havia sido coroado, a realeza se achava bastante viva para não ser morta, mas bastante morta para não reviver. Na verdade, encontrava-se a ponto de expirar, e quase estorvava o curso da História. Santa Joana d’Arc pediu a sua desistência, e reinstaurou nele – por mandato divino – aquilo que estava morrendo, dando ao reino da França uma nova vida.

Era uma pastora chamada a brilhar na corte de um rei. Era uma virgem chamada a viver num campo militar onde, infelizmente, tantas e tantas vezes a linguagem é impura, e a presença das mulheres perdidas se faz notar. Ela ali reluziu como um círio de puríssima cera em plena noite.

Sua virgindade tinha algo de imaculadamente prateado, tinha refulgências de uma arquiprata.

Foram tão grandes as vitórias de Santa Joana d’Arc que, antes mesmo de os ingleses estarem fora do território francês, surgiram condições propícias para a coroação de Carlos VII na catedral de Reims.

Conduziu ela até ali Carlos VII e este foi coroado em meio a uma glória indizível. Santa Joana d’Arc assistiu a cerimônia no lugar de honra, portando o seu estandarte azul e branco, no qual estavam bordados os nomes de Jesus e Maria. Como ela sempre tivera inimigos entre os franceses, um deles lhe perguntou:

– “O que faz o seu estandarte aqui? É um estandarte para a guerra e não para festas!” Ao que ela respondeu:

– “Ele esteve comigo na hora da luta e do esforço, é natural que esteja comigo na hora da glória!”

Condenação da Donzela Santa Joana

Após a coroação de Carlos VII, restava ainda uma parte da França a ser reconquistada.

Na batalha de Compiège, a traição, imunda como a serpente, enroscou-se na heroica pastora. Os borguinhões, vassalos revoltados contra o rei da França, prenderam-na e, mediante dinheiro, entregaram-na aos ingleses.

As vozes que ela ouvira parece lhe haverem prometido que só morreria quando o poderio inglês estivesse quebrado na França. E ela de tal maneira esperava salvar aquele nobre país, que chegou a pular de uma torre onde se achava prisioneira, para fugir e continuar a luta. Em seus insondáveis desígnios, Deus não fez o milagre de ajudá-la, as vozes também não a auxiliaram, e ela foi presa novamente!

Os ingleses entraram em entendimento com um Bispo francês expulso há pouco de sua Diocese por seu apoio ao invasor estrangeiro, e acusaram santa Joana d’Arc de ser bruxa. Diziam que suas vitórias eram fruto de pacto com o demônio.

Durante o julgamento, ela se defendeu como uma leoa. Suas respostas às perguntas dos juízes eram castas como uma couraça e pontiagudas como uma lâmina de espada. Porém, contra toda a expectativa, ela foi condenada pelo tribunal da Inquisição a ser queimada viva, como vil feiticeira!

Deus, que estivera tão presente em todos os combates dela, agora fazia-se ausente. Na manhã da morte, vestem-na com uma túnica infamante e a conduzem numa carreta, de pé, com mãos amarradas às costas, como se fosse malfeitora, em direção ao local do suplício. O povo enche as vias por onde ela passa, e no caminho era lido a sentença, toda feita de infames e falsas acusações.

Continuando seu trajeto, a carreta chega à praça onde está armada a fogueira. Santa Joana d’Arc desce e caminha em sua direção.

As vozes não mentiram!

Pode-se bem imaginar a perplexidade que invadia sua alma: “Mas, então, aquelas vozes não eram verdadeiras? Aquelas vozes teriam mentido? Meu Deus, será que minha vida não foi senão um engano? É a Inquisição que me condena! É um tribunal eclesiástico, dirigido por um Bispo, composto por teólogos e por homens de lei… Será que eu não me enganei, ó meu Deus?!”

Acende-se a fogueira. Não demora, e a supliciada vai sentindo crescerem as dores da morte. Em certo momento, ela parece haver tido uma visão e ouvem-na gritar de dentro das chamas: “As vozes não mentiram! As vozes não mentiram!”

O fogo tomou conta de seu corpo, ela morreu com todas as dores de quem é queimada viva, porém repetindo até o último momento: “As vozes não mentiram! As vozes não mentiram!” Como que a dizer: “Há um mistério, mas eu morro contente, porque estou fazendo a vontade de Deus!”

O mistério se explicou para ela: as vozes não tinham mentido.

O ímpeto dado por Santa Joana d’Arc na ofensiva contra os invasores ingleses havia sido tão grande que eles não ousaram resistir ao exército francês. Pouco após o sacrifício da heroína, foi derrubado o poderio inglês na França. Ela morreu sem poder ver o desmoronamento da muralha. Entretanto, as vozes não lhe haviam mentido. Cerca de 120 anos depois, Calais, a última cidade inglesa na França, tombou, terminando a reconquista do território francês.

joana d'arcA Inglaterra, durante este tempo, tornara-se protestante, e Calais se transformara numa cidade herética: era a unha da heresia encravada no solo bendito da França. Mas as vozes não mentiram, e a obra de Santa Joana d’Arc chegara ao fim.

Para Deus não há pressa. Ele é eterno. Passaram-se mais de trezentos anos… Somente em 1908 quis o Altíssimo que São Pio X, numa cerimônia magnífica, em meio a jubilosos repiques de sinos, canonizasse a virgem guerreira de Domremy. O triunfo da santa pastorinha coberta de armadura constituía mais uma cintilação que a Igreja emitia de dentro de si.

O nome de Santa Joana d’Arc permanecerá como uma saga, um mito, um poema, até o fim do mundo: a virgem heroica e débil, que expulsou os ingleses do doce Reino da França e realizou, assim, a vontade de Nossa Senhora, Rainha do Céu e da terra.

Mons. João Clá Dias, EP

Leia mais: Santa Joana d’Arc: uma saga, um mito, um poema

 

 
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